Aqui jaz um post


- Li outra vez, estava uma trampa, apaguei.
- Então porque é que não apagaste os outros?
sonho de uma manhã de outono:

ser musa intertextual (*)

(*) leia-se: em regime de copy&paste
"Passando-lhes pelo estrado"

3. Anatomo-fisiologia do ósculo
Mas voltemos à verdadeira dialéctica: lábios versus mãos. É aqui onde realmente se joga todo o destino dum homem que não queira viver apenas dando lustro ao soalho do divino estrado feminino.

3.1. Perspectiva bio-físico-química
O lábio é sem dúvida um instrumento que foi bafejado pela benesse da localização estratégica. Vizinho do nariz, vizinho dos dentes, porteiro da língua, condómino da bochecha, parece aquela ave que todas as reservas ecológicas gostariam que lhes viessem desovar em cima. Este bolbo sanguíneo apresenta dois prosaicos movimentos ao seu dispor. O mais clássico é o chamado 'beijo' e é talvez o exemplo mais acabado do sucesso sexual periclitante e instável. Já foram observados tanto a resultarem na mais valente e empolgante fornicação (designação derivada da culinária alentejana e que descreve o momento em que o cozinheiro mete o cação no forno) como a resultarem no mais desanimador 'agora não', mais desanimador ainda porque muitos estudos chegaram à conclusão de que 'agora' significaria 'dois meses'. Tudo parece indicar que o efeito desse dito 'beijo' estará muito dependente duma tal de 'disposição'. Ora esta maravilha da psicologia feminina está relacionada com um misterioso equilíbrio químico em que as enzimas variam com o rácio entre a raiz quadrada dos fungos vaginais e o logaritmo menstrual. Mas, diga-se em abono da verdade, seja enzima seja embaixo nenhum beijo poderá resolver uma falta de pachorra hormonal. Certas correntes chegaram a concluir que o beijo em si já poderia reflectir um estado de climax erótico, peri-orgásmico; essas teorias foram no entanto abandonadas porque a frigidez foi considerada um atraso civilizacional apesar de não haver nenhum barco itinerante de holandesas a tratar disso.
Génesis revisitado

Socraates depois da maioria absoluta avisou as tribos que Deus lhe tinha dito num sonho que com ele a descendência socialista seria numerosa como o pó da terra, e que bastaria lá haver pelo menos um justo (actualmente tinham dois: a mme Barroso e o Guterres) para serem poupados àquela dose da dissolução com que levaram os Sodoma Lopes e Gomorra Portas. Preparavam-se assim para viver todos contentes, e até tinham feito um pacto (isento de corte de prepúcio, contudo) de que se garantissem que circunlixavam o povo rapidinho nos dois primeiros anos talvez Deus os iluminasse com um candidato em condições para a presidência. Constatando o meio uterino do partido a envelhecer a olhos vistos, Socraates desesperou, adiantou-se ao Criador, e informou que iria gerar um candidato de nome Soaares, moço este que certamente garantiria uma prole socialista a crescer que nem estrelas no céu. A coisa parecia poder correr normalmente, o outro possível e incómodo candidato (pode fazer de filho da escrava Oportuunista), o Freitaas, até acabou por fazer o desmame sem muita berraria, mas eis senão quando o Altíssimo tinha uma partida preparada e informou Socraates: ‘tás fodido, podias perfeitamente ter escolhido o Lacaão e perdias sem muito estrilho, mas quiseste fazer a coisa às três pancadas, e agora levas-me o Soaares ali pràs urnas e ele vai acabar por levar com uma cavacada do caraças na carola. Sócrates resignou, cabisbaixou, desforrou-se para desenjoar na reforma dos combatentes e na comparticipação prás análises da próstata dos juízes, e entregou-se definitivamenete à vontade d’Aquele que lhe tinha colocado o poder numa bandeja (entre umas finas fatias de Sampaio, diga-se). Já Socraates escolhia o tipo de tracejado ou picotado no qual incidiria geometricamente a cavacada em Soaares, quando num último momento o Anjo da lírica lhe apareceu e disse: Acalma-te meu, arranjo-te aqui mais um artolas para levar com o cavaco-cutelo; e então ele ergueu os olhos e viu por detrás surgir um poeta de voz funda e olhar doce de carneirinho chamado Aleegre. Seriam então assim os dois entregues em holocausto, seria dividida a desgraça, Socraates manter-se-ia abençoado e a sua descendência continuaria a multiplicar-se como as areias da praia. ( concurso de construções opcional)
Ao povo, que não podendo ser eleito e se ficou por eleitor ( o que nem dá uma terminação, grande porra!) , aquele que ora é pó, ora é estrela, ora é areia, o melhor que lhe pode acontecer é fugir para o Egipto, enfiar-se numa cestinha de junco e rezar para que por aí lhe apareça a filha dum faraó banhando-se na margem do canavial. No fundo, todos sonhamos com um abençoado êxodo. Mas acaba por só fazer sentido uma terra prometida depois de se ver a primeira fodida e bem fodida.
"Passando-lhes pelo estrado"

2. Anatomo-fisiologia da cerviz
Comecemos por uma lateralidade procurando criar ambiente, pois até um texto técnico precisa dum ambiente descontraído para ser bem recebido; detenho-me por isso no pescoço da mulher, que é aparentemente uma atracção logo aos primeiros acordes das hormonas, que só se aguentam calmas quando os sustenidos estão embebidos em bemol. Mas desmistifiquemos sem demora: tirando o caso quase zoológico de Celine Dion, o pescoço duma mulher é um dos grandes equívocos do erotismo; e fica já arrumado o postulado: nem todo o arrepio é uma descarga hormonal. A mulher utiliza esta ilusão de que no pescoço se situa uma espécie de aleph do prazer para ir ganhando tempo, para dar a entender ao homem que tem pontos sensíveis afastados do centro de gravidade. Ora um ponto sensível que esteja longe do epicentro não passa duma figura a dar serventia à retórica poética, dum entreposto manhoso, dum posto de muda de montada, duma senha de racionamento que nos cria a ilusão de que estamos no caminho das especiarias lá porque tresanda a perfume fino. Os vários estudos de campo realizados ao longo da última década revelaram respostas bem elucidativas, do género "elas levam-nos à certa com aquela conversa do pescoço" ou então "muitas vezes depois nem se passa daquela merda". Por isso de pescoço estamos conversados: é um mero fait-divers que a mulher usa para tentar alimentar a imagem de animal sensual que foi parido à socapa por divindades gregas com excesso de esperma a cheirar a hortelã-pimenta.
"Passando-lhes pelo estrado"

- Toda a mulher é uma lição -

Parte I

1. Preâmbulo
A grande dúvida da vida de qualquer homem é se deve começar a abordar uma mulher - no esplendor do seu estrado - com os lábios ou com as mãos. Com o coração está fora de questão porque, como já se sabe, o risco deste vir a amolecer os movimentos dalguns músculos mais sensíveis e essenciais é muito grande. Fazê-lo à base de 'paleio' será sempre uma solução de 'recurso', ou seja, basta ver o resultado da fusão gráfica dos conceitos: é um mero 'recreio'. Este texto é praticamente científico, não cairá jamais na divagação lírica, nem mesmo se esta ajudasse a rimar, nem na divagação onírica, nem mesmo se ajudasse a sublimar recalcamentos, nem cairá na divagação humorística mesmo que esta ajudasse quimicamente ao sempre difícil orgasmo, intelectual entenda-se.
Ou o nó da gravata

Qualquer mulher que se preze é uma exigente executora de metas difíceis. Quando conhece um homem mune-se de uma tabela swat e começa por proceder a uma avaliação da tarefa em causa. Em seguida, elabora um plano de actuação que o transforme no super-homem com que sempre sonhou. No entanto, o resultado do trabalho, a que dedica por vezes anos de afinco, não consegue, alguma vez e ainda que por aproximação, deixá-la satisfeita. A cada dia que passa mais se apercebe terem-se as mudanças planeadas, quando executadas, transformado em defeitos. Não é que não goste do trabalho feito, não gosta é do efeito. Única conclusão lógica, inteligente e pragmática, possível: é do nó, e não do tecido, o defeito.

[Bom, este é um tema tabu aqui na «casa» mas, dadas as circunstâncias, a tentação foi mais forte. E livre-se de emigrar, nem com aquela algaraviada sobre despedida se safa!]
cada um sabe onde lhe aperta o sapato

quando num fim de tarde em que o sol se punha ali à beira-rio (há sempre este cliché, não? mas foi mesmo assim) confessei a alguém (a quem na devida altura - e perante a sua ofuscante elegância em beges e azuis - expliquei dever ser a barriga masculina aos quarenta e tais mais calo sexual que pneu) que gostaria de viver, ainda que por um dia apenas, na pele de um homem (outro inevitável cliché com a atroz vulgaridade das conversas privadas em voz alta ao telemóvel ou no café), não estava realmente nadinha à espera de poder um dia experimentar viver na pele-blog deste...

ah, calço abaixo de 39, faxavor
Homens de flesh & bones

Talvez resultado da leitura do novo e badalado blog sociedade anónima e sobre o efeito duma febre que só espero não esteja relacionada com uma canjita que comi à atrasado (e gajo que não se refira a esse 'blog de meninas' no prazo duma semana pode ser considerado complexado)

(Este é um texto praticamente teórico, e revelador de que os homens também não têm pruridos nenhuns em falar dos seus problemazinhos, sejam eles a masturbação em grupo, sejam os terços às quintas feiras, sejam a paixão pela playstation, sejam o primeiro beijo lambuzado ou ressequido, sejam a incapacidade de dizer a um amigo que a mulher dele é como as botas da tropa… marcha sempre)

{1} É sabido que para o homem a sua barriga assume uma simbologia de carácter dinâmico, e tem para com ela uma relação de altos e baixos ou, para utilizar uma expressão que dá sempre muito boa serventia: de amor-ódio. Freud acabou por menosprezar esta fracturante problemática em favor da sensaborona ‘inveja do pénis’ mas deixem-me dizer-vos – queridas leitoras – os homens nos balneários, nos ginásios e pocilgas afins, não andam nada a ver a pilas uns dos outros mas antes sim a analisar as respectivas barrigas, a curva logarítmica da sua evolução, a sua tendência para uma quase marsupialidade, a sua maior ou menor michelinização, a sua cilindrificação versus conificação enfim, reconheçamos: o homem antes de se confrontar com as nuances da sua pendente sexualidade terá sempre de passar pela constatação do arredondamento ventral da sua adiposidade.
Certas correntes científicas, acautelando o potencial negativo que sobreviria da deficiente - se não mesmo neurótica - incorporação que o homem pode fazer da sua condição de 'enlargement waist criature' acabaram por desenvolver sofisticadas teorias que fizeram concentrar o orgulho masculino em suaves palmadinhas sincopadas em ambas as encostas laterais da dita barriguinha confluindo para a zona umbigal. Chegamos assim a este estádio de desenvolvimento da espécie – no seu género masculino – em que a gravidade se concentra numa zona mediana do ser, que nem é lombo, nem é peitoral, nem é coxa, e qualquer dia já nem sequer poderemos dizer que o homem tem as costas largas, mas que apenas transporta consigo o crescente e bojudo dom da umbiguidade.

{2} Mas isto não podia ficar assim e tal como a origem das espécies inaugurou a moda de ir escrevendo diversas versões de ‘contos sintéticos’, eu também não resisto e escrevo agora uma outra versão baseada num texto do soc-anónima (de titulo ‘O Teste’ e que já vi referenciado, concorrendo assim para o estatuto de canónico) sendo pois mais um humilde contributo para a sempre esclarecedora discussão em torno das diferenças entre homens e mulheres. Ei-lo :

Eu a uma dada altura andava com muitas dúvidas sobre o sabor. Um amigo mais experiente (que já tinha lambido uma assim de raspão num intervalo do Quarteto) achava que o paladar era mais o genuíno sabor a peixe que se encontra no sushi. Outro com o mesmo nível de experiência inclinava-se mais para o clássico sabor a bacalhau salgado mas apenas meio demolhado. Eu que já sabia da riqueza gustativa de ambos os paladares achei que era fácil esclarecer essa dúvida e, numa feira de gastronomia provei das representantes de ambas iguarias; verificada que foi a instabilidade do sabor do sushi e da sua maior dependência do grau de sensibilidade da língua, foi aprovado por unanimidade que o bacalhau salgado estaria mais correcto. Todos nós casámos…

Aqui se prova igualmente como o homem é de facto um ser mais previsível e com muito menos piada, mas se calhar isso será porque nunca uma barriga poderá ter o mesmo encanto dum belo par de mamas. Mesmo que em ambos os casos estejam um pouco descaídos.
«Where is the "I"?» (*)

ainda sobre a história universal, adão e eva in(ex)cluídos, em 25 linhas e mais um pouco:

1.
"I never painted my dreams, I painted my own reality" (**)

e sobre o recurso ao distanciamento, ainda que ao preço do coração, como forma de recusa à trivialidade:

2.
"These canvases I've painted
I did with my own hands;
they wait for you upon the walls
to please you as I planned." (***)

[(*) Frida Kahlo, in catálogo à exposição "Frida Kahlo", na Tate Modern (9 Junho - 9 Outubro 2005), Tate Publishing (p. 31) - (**) Frida K., idem, contracapa - (***) Frida K., idem, para o convite à exposição de 1953 (p.8)]
De shorts história

Julgaram-se amantes nesses últimos anos. Tinham feito tudo como mandava o catálogo: encontros furtivos e fins de semana prolongados, ora beijos meramente prometidos ora beijos sofregamente concretizados, ora simples escapadelas ora sofisticadas programações, sexo seguido ou não de boas refeições, confidências arrastadas, passeios à beira mar, despedidas desconsoladas, corações sempre a dançar. Até que um dia descobriram o fingimento que alimentavam. Afinal ambos eram solteiros, livres, descomprometidos, mas achavam isso tão insuportável que alimentaram assim um crime artificial que lhes desse sentido àquela culpa estúpida que sentiam por aparentemente tudo lhes ser permitido. Ela ao descobrir a fraude da fraude pegou na roupa dele e atirou-a pela janela fora, ele riu-se e fez o mesmo com as roupas dela. Ficaram ambos apenas com uns calções horríveis, daqueles que não enganam ninguém: nem tapam, nem insinuam, nem espevitam, nem castificam. Mas a força metonímica do cenário serviu para chegarem ao mesmo tempo à conclusão de que o maior engano é dos que julgam que se sabem despedir. Com a clarividência dum momento sexual mal consumado decidiram ser amantes para sempre, mas agora iria cada um enganar para seu lado. E seriam fiéis para sempre àqueles tempos em que as mentiras se anulavam umas às outras num ciclo quase remissivo e que os deixou praticamente de cuecas. Uma despedida só vale a pena quando se tem a certeza que se pode regressar.
Só me apetece escrever textos de despedida

Se Deus por acaso quisesse fazer isto outra vez de novo e me pedisse a opinião, eu dizia-lhe. Ai dizia, dizia. Para já, àquela não a fazia sair duma costela, é logo algo que sai um pouco de esguelha, fica condicionada a simbologia, fica prejudicada a genealogia, acho que foi mal pensado, teria antes escolhido uma tíbia ou uma falangeta, e viu-se, deu logo azar com o Caím e com o Abel, e depois foi por aí fora; e pelo menos teria feito uma pausa com aquilo que aconteceu com o Abraão, era muito tribo, era muita confusão, demasiado deserto, demasiadas tendas, demasiado borrego assado, eu cá essa cegada teria saltado, e depois de ver os etruscos e os egípcios com tanto figurão, e tanta figurinha, e tanto enchumaço, nãnã, eu não teria avançado tão rápido, eu teria pensado melhor, teria mesmo repensado, e ter-me-ia certamente assustado com aqueles gregos todos a trabalhar em seco, borrifando-se para a saída e borrifando-se para o beco, aí teria feito umas substituições, reforçava outra vez defesa, e não deixava os romanos perderem a cabeça.
Ai eu dizia-lhe: abusaste daquela coisa do livre arbítrio, devias ter ponderado melhor, deixavas o pessoal mais controlado, a ter de ir prestando contas formalmente aos poucos, ter-se-ia evitado algum escrúpulo medieval, e ter-se-ia evitado alguma escolástica retorcida disfarçada de aristotelismo. E teria posto a mão no Agostinho. Era muita metáfora e já teriam bastado aquelas que tinhas permitido ao Platão. Teria dado mesmo uns saltos valentes na história, desvalorizava os renascimentos e acarinhava os maneirismos, punha a reforma e a contra-reforma a jogarem às palavras cruzadas, no limite tê-los-ia levado a passar uns dias com umas tribos da amazónia para que perdessem todos as peneiras, e esquecessem as boas maneiras, faziam as fogueiras mas dançavam; e aos filósofos que fossem aparecendo teria feito com que alimentassem bem, de barriga cheia talvez gerissem a azia de maneira diferente.
Mas não me ficaria por aqui, se Ele queria realmente a minha opinião, eu iria falar até ao fim. Ali por alturas da tal revolução industrial eu organizaria então um intervalo, com umas bandas animadas e uma petiscada, vá lá. Chamava o Marx, trazia à liça os tipos da tomada da Bastilha, juntava-lhe uns americanos entusiasmados com o federalismo e uns chinocas desconfiados– ainda não faziam tshirts - e dava-lhes meia hora para se entenderem, com decisões rápidas: havia classes exploradoras e exploráveis ou não havia, havia propriedade privada ou não havia, a paz era um valor a tender para absoluto ou não, a sociedade de informação quando aparecesse seria de dar esse pelouro apenas aos anjos ou não, a admissibilidade do sexo livre e por aí adiante, assim tipo um caderno de encargos para resolver mas sem dinheiros por fora. Alguma táctica haveria de sair, a espécie está destinada a desenrascar-se, só precisa que lhe dêem um oportunidade e que lhe saibam reconhecer os méritos e sejam compreensivos com os fracassos senão, como já tinha dito o Shakespeare em plena pose inspirada em Hamlet: nunca haverá chicotes que cheguem. Teríamos sido poupados ao existencialismo, a psicanálise ter-se-ia conformado apenas com o seu estatuto de método, Kafka teria sido sócio de Tintin, Gorbachov montaria uma loja de perucas na praça vermelha e Mandela venderia camisas às riscas Ralph Lauren. Os judeus dedicar-se-iam apenas à música clássica e Hitler organizaria acções de formação em condutas de gás natural para a Galp.
Eu cá, no fundo, não teria era dado tanta rédea solta à rapaziada logo que se viu que começavam a pintar as paredes nas grutas, e assim eu até escusaria de estar sempre a ser chamado à escola do meu filho mais novo porque o sacana já lixou mais de metade das paredes da sala dele e o Soares escusava de acabar os seus dias políticos a fazer de Manuel João Vieira mas ainda mais gordo e com menos cabelo. Que Deus o perdoe e a nós no alivie do ar rupestre que isto pode tomar.
a gebak dos lagartos

uma ordem sua, já se sabe...

quando, na minha inocência, esperava por uma indicação salvífica da demissão (*) daquele rapaz loiro e encorpado que em pequenino deve ter-se empanturrado de koggertjes e de poffertjes (**) e até já tinha preparada uma faixa de homenagem a dizer

tot ziens!

em letras azuis desenhadas a rigor, eis que sobre mim se abate a notícia de ter sido, afinal e mal feitas as contas, aquele rapaz moreno, musculado e de aspecto pacífico criado a migas de couve e bifinho da lezíria (***) a ser demitido, carago!

(*) leia-se pontapé naquele sítio que deixa de ser costas, para me deixar de eufemismos inúteis
(**) ultimamente tem-me apetecido muito mandá-lo comer, sei lá!, bolbuisjes? mas não sou mãe dele nem digo palavrões por causa da manutenção do bom nome da família
(***) e que, esse sim de forma generosa e determinada, tanto tem contribuído para o bom lugar do clube que me afaga o coração

[nota de rodapé: aqui para nós, a carolina deve ter qualquer coisa de endorfina pra pintos, essa é que é essa]
Basicamente, um post de futebol para gajas (*)

O actual momento futebolístico está marcado por diversas circunstâncias que apenas estão ao total alcance do universo feminino.

Tomemos o caso de Nuno Gomes. A menina. Esse maravilhoso jogador conhecido na Europa pelo movimento arredondado que faz com a mãozinha no cabelo em torno da orelha, de repente torna-se de igual modo notado porque começou a marcar golos. A última vez que o conseguiu foi precisamente no sábado passado, onde acabou por ser acolitado pelos defesas-tipo-araras de uma equipa treinada por aquele moço holandês que já fez mais pelo ensino do inglês que duas reformas educativas juntas, dado hoje não haver puto que antes de sair para a bola não se chegue à mãe e lhe peça um ‘white handkerchief’. Poderia dissertar um pouco mais sobre estes inesperados sudários da futebolidade, simbologias para novas vias sacras, mas preferia antes deixar definitivamente claro que todos os problemas do futebol moderno se situam no equilíbrio entre as variáveis, que passo desde já a elencar:
- a função preponderante dos trincos
- a subida constante dos laterais
- A construção da equipa de trás para a frente
- A pressão global
- O controlo do jogo
Ora aqui é imediatamente notório estarmos perante opções que parece ter sido o universo feminino a influenciar determinantemente . Comecemos pelos ‘trincos’. Julgo que a alternativa óbvia seriam os ‘chupões’, género de jogadores que fariam uma espécie de ventosa no jogo do adversário o que me pareceria bastante mais perturbador e eficaz, no entanto colocou-se antes o ênfase nesta operação de ‘trincar’ sob flagrante capricho do desejar e pensar feminino. Não contentes com isto, os novos estrategos do jogo em vez de valorizar a zona dianteira central, que acaba por ser onde se situa a baliza, sucumbem novamente e resignam-se à utilização de técnicas da ordem do preliminar como sejam o papel excessivo dos ‘laterais’ e o construir dos movimentos de consolidação do jogo vindo ‘de trás para a frente’. O que não deveria passar de mera manobra de diversão alcança agora o posto de condição sine qua non. Como se isto não fosse suficiente, ainda aparece um tipo sempre agarradinho à mulher e aos filhos, conhecido por Mourinho, e inventa essa coisa da ‘pressão total’ quando o pessoal já estava serenamente habituado apenas à ‘pressão alta’. Isto baralha, pois baralha. Um homem sabe bem que não tem mãos para tudo, e só um espírito feminino poderia conceber uma tal de ‘pressão total’; o jogo, até reconheço, ganhará eventualmente em potencial orgásmico mas ao intervalo garanto que o pessoal já não sabe o que anda ali a fazer bem ao certo e o jogo seguirá por conta e risco da dona do carrocel . Chegamos assim lógica e finalmente ao ‘controlo do jogo’, onde no fundo se concretiza toda a influência feminina no futebol moderno. Ter a bola sempre em seu poder e determinar os momentos de penetração é o que está por detrás deste conceito estratégico que nos dias de hoje é a chave mestra do domínio duma partida e do aumento da probabilidade de criação de situações de concretização, isto para já nem falarmos na obsessão de treino das bolas paradas – nós, os homens prestamo-nos a tudo, é o que é; valha-nos Deus. Estamos, em consequência, perante uma absoluta femininização do futebol, esse novo gineceu, antevendo-se assim os tempos de glória para Nuno Gomes. Haja quem desfrute.


(*) ‘gajas’ - conceito de índole arcaico pois se já nem têm escrita específica é porque não existem senão como figura de retórica gasta.
nota técnica: neste momento o Sporting é assunto do foro religioso e por isso não me posso pronunciar
ÿ


[Perdão?! Como diz que disse? Ah, estruturalismos!]
Manual de estereotipagem rápida
( blogue sem disfunção eréctil, mas que não rime, será sempre meio apanascado)

Pegue-se selectivamente num tique
E apetrechemo-lo dum belo par de pernas;
Exageremos-lhe depois o andar remoçado,
Façamos um suspiro parecer um chilique
Tudo recheadinho com umas piadas modernas
E teremos uma figurinha em ponto rebuçado


Com o tique já em forma de trejeito
E todo ele a apoderar-se do sujeito
O povo estará então pronto a babar-se de gozo;
É o momento certo de apelar ao belo efeito
Tirando-lhe a casca, mostrando-lhe bem o caroço

Resumindo, temos assim nesta fase:
O ventre já está à mostra,
E o rabo já está quase;
Só falta tirar a última crosta
Antes que a rima se atrase
e comece a fazer fernicoques,
ou outros tormentos,
no maravilhoso reino dos berloques
e dos afrontamentos.

E é nestes preparos que chegamos à parte final,
Temos o sujeito já meio em pelota
À mercê da infalível técnica do ‘tal e qual’:
enquanto a divina excepção arrota
A regra torna-se uma flatulência fatal.

Daí que o verdadeiro segredo
seja dizer o que os outros gostam de ouvir
Para assim todos podermos sacudir
O que nos transporta o medo
A alta marroquinaria

Por falar em 'coiros & escritos', uma expressão ouvida hoje a um jovem:

"A língua tapa-lhe os olhos".
Conto duma mulher a dois tempos

Helena não era de Tróia mas sabia-se encurralada num coração palpitante e julgava-se com direito a ser resgatada por uma paixão ardente e descompensada. Podia ser das ditas platónicas, poderia ser daquelas de rotativo quarto de hotel, podia ser com alguém de apelido conhecido, podia ser com um Zé-ninguém. Pensava mesmo que uma mulher que não tivesse ainda deixado um homem a bater com a cabeça nas paredes, a andar com um olhar distante e a dizer parvoíces sem sentido era sinal de que tinha passado ao lado da sua condição hormonico-cromossómica. Tinha mails para responder, mensagens para dar vazão, chamadas para retribuir, tinha pendentes daquelas promessas de combinações feitas para despachar expediente, mas era tudo com homens que apenas lhe poderiam dar segurança, apenas lhe poderiam dar uma vida boa, apenas lhe poderiam dar filhos, apenas lhe poderiam dar um carinho contratado, e isso parecia-lhe ser mais ou menos como ela tinha aprendido na sua vida: um mau negócio faz-se quando quisermos. Ela sabia que só seria mulher quando um dia visse alguém a perder o emprego por ela, a esquecer-se de pagar a água por causa dela, a perder estupidamente amigos por causa dela, a mentir a sério por causa dela, a mudar o penteado por causa dela, a vestir-se ridiculamente por causa dela, a estoirar dinheiro em floristas por causa dela, a escapar-se para uma matiné por causa dela, a falar baixinho com ela para que ninguém se apercebesse do uso descabido de tanto diminutivo. Ela sabia que só descansaria depois de ter visto alguém passar por isso à conta dela. E ela calculava que depois de dar uma golpada dessas então já poderia viver sem complexos um amor estúpido, serenamente, com alguém contratável, em que as coisas mais ridiculamente empolgantes que fariam seria dormirem na mesma cama, terem o mesmo gerente de conta, negociarem sobremesas, e, nos melhores dias, escolherem uma boa combinação de batôn e verniz enquanto conversavam sobre a mesada dos filhos. Chegaram a falar-lhe dum tal de meio termo, do desafio da normalidade, do encanto duma tal de vida a dois, mas ela não ficou convencida, pareceu-lhe demasiado logístico, demasiado fácil. Continuava mais disponível para o tal esquema a dois tempos, e ninguém lhe tirava da cabeça: mulher que se prezasse haveria de já ter posto um homem a dar em maluco, mas maluco mesmo, daqueles de sacar olhos arregalados e risos de esguelha à assistência.
Manual de canonizagem rápida
(não tenho pedalada para esta convidada e qualquer dia ela rifa-me e vai a remar para algum blog político)

Primeiro: Nunca se fazer perceber à primeira.

Segundo: Nunca rimar por afeição mas apenas por defecção.

Terceiro: O espaço e tempo nunca tomarem conta do enredo e ao não haver enredo falar apenas do espaço e do tempo.

Quarto: Fazer notar-se a existência duma memória rica e dum inconsciente remediado, mas é essencial valorizar o recalcamento dado-lhe o aspecto de livre associação.

Quinto: Mostrar-se desinteressado, ausente, sempre entre o ‘para cá’ e o ‘para lá’ da realidade, mas jamais incorrer no discurso diurético pois o leitor ao ter de ir fazer uma mijinha - mesmo rápida - pode perder o fio à meada.

Sexto : Fazer de Deus um instrumento de escrita e de estilo, tal como o ponto e vírgula, a frase curtinha, a frase que nunca mais acaba e a exaustividade gongórico dependente.

Sétimo : Jamais tratar o eu por ‘você’ e muito menos tratar o tu por ‘ele’, mas abolir totalmente o 'nós'. Geralmente nem atam nem desatam.

Oitavo : Mostrar-se ligeiramente ressentido com o mundo dos homens e muito ressequido pela aragem dos deuses.

Nono: Manter o equilíbrio certo entre o exemplo e a generalidade: oscilar, oscilar sempre, saber dar uma no paradigma e outra na aleatoriedade.

Décimo: Estereotipar sempre qualquer coisinha que se veja e depois desagravar o estereótipo com uma contrição de registo auto comiserativo.

Décimo primeiro: Assexuar ou dessexuar ou bissexuar ou homosexuar ou heterosexuar, mas jamais hermafroditar o discurso.

Décimo segundo: Evitar listas do que quer que seja, isso afasta a escrita do cânone e torna-a demasiado previsível; se bem que é bom ter a consciência que surpreender será sempre a maior falácia e o melhor engodo da espécie.
no frost guruism

(ou colectânea expresso de insubstantivos advérbios de moda. ou pastéis de massa tenra com manteiga e banha)

"Que dias há que n’alma me tem posto
Um não sei quê, que nasce não sei onde,
Vem não sei como, e doi não sei porquê."

Que a blogosfera é um imenso 'intertexto' (antigamente chamava-se plágio à praga mas 'mudam-se os tempos, mudam-se as vontades' como lá dizia o rapaz d'outras eras) todos quantos por aqui andam o sabem e o refraseamento, acuradamente contextualizado de acordo com as regras do pós-modernismo, dá lugar a um moderno cânone: mudam-se os nomes, mudam-se os autores (se bem que não seja próprio dar nas vistas).

O canonizador moderno e autorizado, naturalmente apoiado numa das abundantes e multiparadigmáticas cátedras disponíveis no mercado selectivamente aberto da glorificação inter-pares, é a versão no frost da arca congeladora que era a censura à antiga: por redução lapidar decide quem, como, o quê e porquê dar a conhecer a um povo faminto de letras e inculto de clássicos.

Que os critérios apresentados sejam meros anacronismos travestidos de parâmetros científicos (é sempre uma inefável emoção ver a sanha com que o recurso à proto-cientifização que é a quantificação se constitui fundamento inútil e muleta despropositada) não é coisa que espante senão burgueses: uma boa parte do que hoje se tem como referência clássica não teve, ao tempo, senão a mesma ou menor estima que a literatura 'light' (soit disant - recupero propositadamente a classificação da 'inteligentzia' nacional) tem nos nossos dias.

O canonizador moderno leu Calvino (*) e esforça-se por demonstrar generosamente a sua abertura: crê que vale a pena ler o 'inominável' "porque é melhor conhecê-lo do que não o conhecer". E, generosamente, procura a luminosidade onde sabe de antemão não a haver. E tem consciência, nauseante e histaminizada embora, de haver quem seja tocado pelas palavras de modo diverso do seu. E constata, com indisfarçável amargura mas inegável respeito, serem diferentes os conceitos de 'amado' e 'amável'.

Não que o canonizador moderno ignore estarem os leitores menos avisados na posse de um quadro conceptual dotado dos instrumentos intelectuais (e/ou afectivos) susceptíveis de consubstanciar uma heurística competente. Pelo contrário, não duvida em momento algum do conhecimento e da capacidade hermenêutica do leitor comum cuja empatia (o primeiro e mais básico dos níveis de aproximação à leitura) ameaçadora com palavras, expressões e ideias vulgares o horroriza.

O canonizador moderno sabe tudo, leu tudo, sobre o efeito da paixão, da dôr, dos sargos escalados, dos daiquiris, dos motores do Cheyenne, das anémonas da vaza ou dos rododendros envasados. E sabe como deveriam, com propriedade e probidade, ser descritas essas realidades. Sabe mas não escreve. Não o faz para não incorrer na vergonha do cliché (vem-lhe à memória, como espuma, resíduos incompletos e inexactos da lírica de Camões, por exemplo), no estafado da teia emocional de Pessanha, no paralelepípedo húmido da não-urbanidade de Cesário ou no desassossego polimórfico de Pessoa, que o traíriam como o caminhar de uma tairoca no polimento do chão da Culturgest ou o estertor do ressonar entre os ouropéis aveludados do S. Carlos.

Mas o canonizador moderno revela-se na sua qualidade didáctica (pedagógica será, possivelmente, um termo mais adequado) ao organizar antologias ao abrigo de um genuíno interesse pelos interesses (e não pelo conhecimento) do público a quem fornece uma adequada, e regra geral veementemente enquadrada, aproximação à 'sua' literatura. Muitas vezes a menos da distância de um dedo ao erro e ao obtuso e longe da distância exigível a uma atitude crítica. Perdoado, talvez, nas suas estratégias de leitura, pela complacência com que se revê em palavras como estas: "mas porque deverei preocupar-me quando há setas no ar, formadas pela antiga arte dos amantes, que vão direitas ao meu coração' (**)?

Nota de rodapé: este é um texto ficcional e, como mandam os cânones, repleto de intertextualidades. Da violação me acuso em (*) Calvino, I. (1994). Porquê Ler os Clássicos? Lisboa: Teorema e em (**) Sting (1987). «Straight to My Heart», in Nothing Like the Sun. Los Angeles: A&M Records.
Três contributos claros para o processo de reajustamento do cânone ocidental

“ Pode o candidato «usar» a sua mulher as vezes que quiser”
de Clara Ferreira Alves in expresso, 8 Outubro

“ Os maridos, Babalu, são a espécie mais incompreendida pela nossa sociedade, e a que merece menos compaixão”
de Clara Pinto Correia, in ‘No meio do caminho’, pag 238 ( não consegui ir mais longe)

“Os homens são como os bebés”
de um mail acabadinho de receber de uma leitora praticamente anónima.
o exercício do imprevisto, "o erro de Narciso" (*) e o tempo

"Há uma emoção que é inseparável do encontro com qualquer homem que nos surge no caminho".

Esta citação de Lavelle, uma das quatro escolhidas por Cesare Pavese para assinalar o dia 9 de Outubro de 1939 no seu "Ofício de Viver", evoca o erro que constitui o desejo de apropriação, de captura, daquilo (ou daqueles) a quem se dedica o que designarei por amor-paixão: o erro de Narciso.

No contexto relacional o erro de Narciso pode ser entendido como o desejo (necessidade?) de alguma coisa que seja um complemento de nós mesmos, numa espécie de ilusão em que se acredita que o que se capturar alimentará, de alguma forma obscura, a nossa sede de absoluto. E no entanto será, isso sim e apenas, a raiz de todos os fracassos porque o aborrecimento e a insatisfação estão associados a todas as acções de captura como muito bem o sabem os caçadores na sua obsessão com a 'ausência do novo'.

Contra esta insatisfação, à semelhança do caçador, o homem comum recorre a duas formas comuns de luta: o viver de esperança em esperança, condenado à partida por ser uma genuína e imparável fuga para a frente ao presente, e a aceitação da mediocridade, a coabitação com o inefável 'é-a-vidismo' dissimulado atrás de pequenas alegrias quotidianas que acabam por dissuadir da possibilidade da felicidade.

O que resta então à procura de sentido que é o combate à insatisfação e ao aborrecimento atrás referidos? Muito, seguramente. O amor, por exemplo. Entendido como o movimento da dádiva em que um ser humano se oferece sendo simultaneamente objecto e causa da oferta, no qual, ao ser capaz da humildade de se despir da fachada opaca e impermeável de uma personagem, dá o coração que, mais ou menos "musculado" e compreendido ou incompreendido por quanto consegue dizer, será sempre a verdade vulnerável do que se é. E esta é uma luta - e um jogo - de cuja decisão de ganhar ou perder dependerá o essencial: tranformar a captura em dádiva, o 'estar com' em 'estar para'. Todos os dias, com teimosia se fôr necessário. Para além da usura do tempo.

(*) Louis Lavelle - L'Erreur de Narcisse, Table Ronde, 2003
É tudo uma questão de método. E duma insónia das boas, claro.

Depois de ver meio mundo rendido ao método George (que estará certamente para a crítica literária como o método Milton está para a esterilização de biberons) vejo-me compulsivamente levado a testá-lo face a um dos monumentos mais significantes do nosso património literário que é a lírica camoniana na sua versão sonetada, tanto mais que também o vejo arredado - tal como a até há pouco tempo injustiçada MRPinto – da corrente crítica literária ( senão vejamos há quanto tempo o mil folhas não faz a recensão dum soneto de Camões; meu Deus, nem o Abrupto)
Quero antes de tudo dizer que abracei este projecto com o coração limpo de quaisquer preconceitos e, diria mesmo, prenhe do afã de me encontrar com a verdadeira literatura, com a verdadeira força do génio. E foi assim que ataquei a caderneta dos sonetos tomado duma força quasi obsessiva que me fez ferozmente sublinhar, riscar, dobrar cantinhos, desenhar simbolos fálicos, marcar com pastilha elástica, flagelar, sentar-me em cima do livro com determinadas páginas abertas, deitar borras de café, enfim, tudo fiz para que nada me escapasse, e para que este texto não caísse na venalidade da displicência ou na capitalidade da preguiça, e pudesse mesmo, face ao líquido literaturino que o envolvia, tornar-se uma nova achega na senda do cânone do post literário perfeito.
Entre as várias hipóteses possíveis acabei por me decidir pelo texto camoniano fixado numa edição baratucha dos Sonetos da Europa-América (que por sinal apresentava uma dedicatória do ano de 1988, e que se não me chegasse a envergonhar de a transcrever aqui, pelo menos passaria a ter de tingir a carinha de preto sempre que saísse à rua) aliás, descobri mesmo que devo ter sonetos do camões para a troca suficientes para fazer alimentar aí umas duzentas campanhas eleitorais, ou casamentos de sto António, ou para patrocinar trezentos dias dos namorados ( swatch incluído)

Adiante.

Não será cá mão que me trema, nem Camões que me inibam, nem cá dedos que me fraquejem nesta tarefa.

(esta duas frases anteriores ao serem apresentadas de forma isolada enquadram-se numa lógica de aproximação ao paradigma minimalista)

Mas quero avisar também que "o texto que se segue é embaraçoso para o escritor e penoso para os leitores em geral"; Camões nos seus sonetos repete-se que nem um pivot da continuidade, apropria-se descaradamente de terminologia e mitologia clássica, tem óbvios deslizes de ortografia, despreza o livro de estilo do Público, e abusa daquela coisa de terminar as frases com o mesmo fonema, (alguns chamam rima a isto) retirando a credibilidade aos temas e vendendo-se assim por duas patacas ao efeito comercial fácil. A estereotipação da experiência amorosa é flagrante e o estilo é absolutamente repetitivo e monótono. O fenómeno Camões até me era simpático, pensava até que já me tinha ajudado a engatar uma miúda assim ali para os lados da Rua Santana à Lapa defronte a uma papelaria, mas agora confirmo que deve ter sido mesmo a força do meu beijar ardente que conduziu a tamanho arrebatamento já ali no cruzamento da Buenos Aires.

O «tema nuclear» de Camões é : ele há uma gaja, e ele há ele. E depois é choro, tormento, pouco pau de louro e ainda menos de fermento. Sexo nada, divórcios nada, partilhas de bens nada, sogras nada, putos aos berros nada, Mercedes com louras lá dentro, nada: este gajo não existiu, ou então viveu com a vista vendada.

Os vícios da escrita de Camões são mais que às mães e eu infelizmente não consegui os patrocínios para me poder aqui esplanar ao comprido devidamente ( a multiópticas roeu a corda à última hora e resolveu dar o patrocínio das armações o ‘tico e o teco’ a alguns blogs de actualidade política que fazem pandan uns com os outros) e por isso tive de ser bastante mais selectivo.

A prisão da rima é a primeira imagem que me salta imediatamente à vista. Por exemplo a terminação ‘mento’ é utilizada de forma quase exclusivamente enfadonha com o vocábulo ‘pensamento’ o que, apesar de ter um significado mais amplo na época, é duma pirronice sem limites. E das poucas vezes que falha, ou entra ao serviço o vocábulo ‘tormento’ ou, em casos mais desesperados o próprio ‘vento’ mais ou menos metaforicamente trabalhado. Escandalosamente pastosa é mesmo a repetição na utilização simultânea de ‘pensamento’ e ‘tormento’ , senão vejamos : «e gosto de um suave pensamento/ (…) escureceu-me o engenho co tormento» (soneto nº1) , «que mor glória na vida se oferece/ que ocupar-se em vós o pensamento?/toda a pena cruel, todo o tormento,/ em ver-vos, se não sente, mas esquece« (soneto nº6), «Onde mereci eu tal pensamento / (…) em glória se converte o meu tormento» (soneto nº10) , «ditosa aquela flama, que se atreve / apagar seus ardores e tormentos/(…) que queima corações e pensamentos» ( soneto nº50) , «chamam-lhe amor; mas eu lhe chamaria / discórdia e sem razão, guerra e tormento./ Enganou-se coo nome o pensamento» ( soneto nº56), «que pena pode ser tão certa e dura/que possa ser maior que meu tormento?/ ou como receará meu pensamento/ os males, se com eles mais se apura?» (soneto nº 58) e isto agora nunca mais acabava pois repete-se no nº66, nº 86, nº 96, nº 98, nº 138 e por aí afora que isto nem a escadaria do Bom Jesus. Mas alguma coisa poderia Camões ter em mente, algo de essencial relacionado com a alma humana poderia ele ter descoberto nalguma salada de orégãos enquanto lia o Petrarca. Há gajos assim. E alguns até com as quotas do Sporting em dia.

Seguimos imbuídos do método george-milton, “dir-me-ão que todos os escritores têm as suas obsessões. É verdade. Mas que dizer a isto” : «Eu cantarei de amor tão docemente» ( soneto nº2) , «Eu cantei já, e agora vou chorando» (soneto nº130) , «Cantava, mas já era ao som de ferros » ( no mesmo soneto nº 130), « Com grandes esperanças já cantei /(…) depois vim a chorar porque cantara» (soneto nº 167) e como se não bastasse « Suspiros inflamados, que cantais a tristeza com que eu vivi tão ledo;» ( soneto nº 55 ) onde a coisa já fica de tal forma, que sinceramente mais vale um gajo meter mesmo os papéis para a baixa e passar os dias a discutir as análises da próstata. A lírica camoniana desconhecia claramente o fenómeno da drenagem ( linfática ou outras) e os problemas de infecções que se podem dar no saco lacrimal.

Quando Camões “pensa nas relações homem/mulher” ( eu teria usado mais pudicamente o travessão, mas o método george-milton utilizou o traço oblíquo – querendo induzir talvez que o homem está por cima - e eu quero manter-me fiel a esta ortodoxia) utiliza uma fraseologia quase típica dos amores cromagnoneanos, género «pintada em mim se vê vossa figura» (soneto nº27) , «mas é tão doce vossa formosura/que fico hidrópico doente» (soneto nº27) ( foi mesmo este o grande momento de glória na história da literatura para a palavra ‘hidrópico’ ) , «nem por malícia de ar seja extinta/ a cor, que está teu fruto debuxando» (soneto nº 60) ( onde aparenta que o poeta não gostava de ver mãe e filha a rirem-se uma da outra, numa clara manifestação de pré-marialvismo encapotado) , e para não carregar demasiado este capítulo deixo-vos só esta nota: « Mas este puro afeito em mim se dana;/ que, como a grave pedra tem por arte / o centro desejar da Natureza, / assim o pensamento (pela parte / que vai tomar de mim, terrestre, humana ) /foi, Senhora, pedir esta baixeza» (soneto nº63) que traz a nu a tal ‘nuvem de testosterona’ que tão bem descortina o método george nos personagens de MRP e que aqui Camões é também incapaz de disfarçar face à sua vertigem erótico-abísmico-gravitacional.

E depois, claro, há esta “acumulação infindável” que o método george-milton-esplanar nunca deixa passar fora do seu barómetro particular: «por mostrar quem busca defensão/ contra esses belos olhos, que se engana» (soneto nº7) , «Quem vê, Senhora, claro e manifesto / o lindo ser de vossos olhos belos» ( soneto nº9) , « podem pôr medo a quem nenhum encerra,/ depois que viu os olhos tão formosos» ( soneto nº 12) , «vossos olhos, Senhora, que competem/ coo Sol em formosura e claridade» (soneto nº15) , «Olhos formosos, em quem quis Natura/ mostrar do seu poder altos sinais« (soneto nº 27), e então aqui é que a lírica oftalmológica nunca mais termina, mas eu não queria deixar de realçar um fenómeno caricato que consiste na dificuldade de Camões em pôr 'olhos' a rimar com qualquer coisa que seja de jeito que não este desengonçado do soneto nº29 «perderão toda a graça vossos olhos/ porque pouco aproveita, linda Dama, /que semeasse Amor em vós amores,/ se vossa condição abrolhos»; ora ‘abrolhos’, Santo Deus, Santo Cristo Cruxificado acrescentaria mesmo! Eu evitaria talvez a ambiguidade da palavra ‘folhos’, mas bolas, até a música popular arranja uns ‘alecrins aos molhos’, até a Simone d´Oliveira havia de arranjar maneira de cantar outra rima com dignidade ( por acaso no soneto nº 66 Camões põe aquilo em rimar com tudo: ele é olhos, abrolhos, molhos, antolhos, faltou piolhos mas no fundo também é preciso deixar espaço para os poetas mais recentes poderem brilhar)

Em relação ao chamado, na técnica george, “efeito de realidade” Camões usa o já estafado registo de ‘nada se passa em sítio conhecido’, aproveitando o efeito estético fácil do nenhures! Não há um restaurante, não há uma retrosaria, não há uma festa da Caras, não há um bar de alterne, não há um esquema num parque de estacionamento, apenas disto: «quando bela vista e doce riso/tomando estão meus olhos mantimento» (soneto nº2) , ou « Vivo, Senhora, só de contemplar-vos; e, pois esta alma tenho tão rendida» (soneto nº10) , ou «Se me pergunta alguém porque assim ando, /respondo que não sei; porém suspeito/ que só porque vos vi, minha senhora» (soneto nº25), e então esta: « Lindo e sutil trançado, que ficaste /em penhor do remédio que mereço, se só contigo, vendo-te, endoudeço, /que fora cos cabelos que apertaste» (soneto nº44) … mas isto passa-se aonde, caralho!!! Nem a indicação dum centro comercial, nem uma pista com o nome dum cabeleireiro, nada, isto é da maior futilidade atopográfica que se pode conceber. E, claro, “isto são apenas alguns exemplos, escolhidos criteriosamente para não cansar o leitor”, seguindo fielmente a ortodoxia do método george-milton.

“Por qualquer lado que se pegue nestes sonetos, o mais certo é tropeçarmos em expressões como”: «o fogo que na branda cera ardia/ vendo o rosto gentil que eu n’alma vejo» (soneto 50), no entanto, como as caixas de kompensan devem ter ficado encharcadas lá prós lados do rio Mecon, o rapaz toca de fertilizar o faduncho e atira-nos sucessivos « bem sei que neste estado nada vale,/ que, quem nasceu chorando, justo é/ que pague com chorar o que perdeu» (soneto 136) ou « na vida desamor somente vi, na morte a grande dor me ficou: parece que para isto só nasci» (soneto 153) e caminhando para Bingo: «Assim que nada perde quem perdida/ a esperança traz de sua glória, se esta vida há-de ser sempre em tormento» no soneto 156, o que demonstrou um saudável estado de espírito e um grande testemunho para deixar às sucessivas gerações de portugueses ( Jorge Coelho excluído)

“Podia falar disto e de muito mais, os exemplos queimam-me as mãos” (esta nota anatómica de carácter místico-estigmático é marca d’água do método georgiano) no entanto “desisto, desisto de Camões, mas ainda assim dou-lhe um conselho, dê-se muito feliz pela indiferença com que o método george até hoje o tem tratado”. E eu até teria publicado isto em fascículos, mas a insónia foi das grandes, e os gajos do Planeta Agostini, é o costume, à última hora decidiram-se por uma colecção de bonecas de cristal da Boémia vestidas pela Fátima Lopes.
Yoga para ‘românticos de coração mole’: primeiro shake e depois espeare

«Rainha – Hamlet, tu quebraste em dois o meu coração.
Hamlet – Oh, atira fora a pior parte
E vive mais pura com a outra metade»

Estive indeciso entre isto e uma passagem do novo livro da Clara Pinto Correia que comecei a ler e que na pag 15 escreve isto: «Ai, foda-se. Estou lixada com este gajo»

Mas eu prometo que voltarei ao Camões.
Porque há dias

em que a voz se dá a quem (*) de infernos entendia:

S'io credesse che mia risposta fosse
A persona che mai tornasse al mondo,
Questa fiamma staria sanza piu scosse.

Ma perciocche giammai di questo fondo
Non torno vivo alcun, s'i'odo il vero,
Sanza tema d'infamia ti rispondo.

Io fui uom d'arme, e poi fui cordigliero,
credendomi, sì cinto, fare ammenda;
e certo il creder mio venìa intero,

se non fosse il gran prete, a cui mal prenda!,
che mi rimise ne le prime colpe;
e come e *quare*, voglio che m'intenda.

Mentre ch'io forma fui d'ossa e di polpe
che la madre mi diè, l'opere mie
non furon leonine
, ma di volpe.


(*) Dante Alighieri - La Divina Commedia, "Inferno" (Canto XXVII, 61-75)
Subsídios para uma demissão

(peseiro pode estar genuinamente aflito, a sua alma gentil pode estar a aparvalhar e a não o deixar partir serenamente, e eu gostava de lhe dar uma mãozinha que a todos beneficiaria; assim aqui vai uma hipótese desinteressada para uma carta de demissão)

Queridos sportinguistas,
Esta é hora de alguma tristeza, mas temos de enfrentar os factos, e as oportunidades da vida têm de ser agarradas com determinação. Fui efectivamente convidado para mandatário da campanha do dr. Soares para os ‘falhados, incompreendidos, perdedores e deprimidos’. É um convite que muito me orgulha e estou confiante de que posso fazer um bom trabalho junto destes cidadãos que também merecem ter uma voz, que também merecem ter um saldo credor na sociedade.
Sei que deixo um ataque criativo como um pintor medieval, uma defesa de betão apenas com despiciendas brechas dalgumas polgadas, e um meio-campo em perfeito carrossel qual circo chinês, reconheço que fiquei impedido de impor a minha inovadora técnica do soneto, o 4 x 4 x 3 x 3 , mas note-se contudo que fiquei aquém porque não me deram os jogadores suficientes, e como se sabe o recurso ao 4 x 4 x 2 é de rima muito mais difícil.
Não sucumbi a esta contrariedade mas os últimos momentos foram de alguma tensão, a bola parecia rendida aos encantos dos adversários, quer fossem altos e loiros, quer morenos e atarracados e não havia maneira de lhes dar a volta, no entanto consegui que a equipa resistisse e não se viram trancinhas nem desfrisados no plantel, que assim manteve a sua dignidade capilar, um valor que todos devemos valorizar e preservar.
Apesar de ter sempre feito prevalecer o efeito do conjunto queria realçar que o meu testemunho inclui alguns clímax de individualismo, dos quais destacaria o Paíto ter conseguido fazer um centro para dentro do campo, o Sá Pinto ter corrido dois sprints seguidos no sentido da baliza adversária, o Tello – há registos vídeo a confirmá-lo – ter acertado três passes no mesmo jogo, e houve quem me jurasse a pés juntos que o Beto se chegou a posicionar bem para segurar um contra-ataque.
Tenho a lamentar a descida de negócio das croissanteries do Alvaláxia com a saída do P. Barbosa, mas compensam certamente as papelarias com as palavras cruzadas que venderão ao Hugo, esse homem que eu ajudei a consolidar como mito, juntamente com o nosso Ricardo.
Deixo-vos pois um pântano com muito boas possibilidades de drenagem, muitos dos sapos já foram entretanto engolidos e voareis certamente como libelinhas neste futuro nenufariado que merecidamente vos ajudei a construir.
Não tenho genuinamente o intuito de disfarçar a minha tristeza, mas compreendam o país tem um grande desafio pela frente, fortes e fracos podem e devem unir doravante as mãos e eu sinto-me realmente vocacionado para ser essa charneira. Consolidei convosco esta minha enorme capacidade de fazer arrastar a merda fazendo-a parecer um lugar com esperança e a essa esperança dei-lhe a força duma utopia. E isto sempre com a serenidade daqueles que sabem ter uma missão a cumprir: demonstrar com obra feita que vencer é coisa para quem não saiba fazer mais nada. E é este realmente o meu legado: vós nem acreditáveis no que vos estava a acontecer, mas era, e foi, mesmo verdade. Deixo-vos pois homens de fé reforçada.

Do vosso
peseiro
Ou das sortes da lírica?

Que também se podem escrever assim, com ou sem mudança de género:

«Todo o animal da calma repousava,
Só Liso o ardor dela não sentia,
Que o repouso do fogo em que ardia
Consistia na Ninfa que buscava.»
Misoginias alternativas ?

«Nunca ponha ninguém sua esperança
em peito feminil que, de natura,
somente em ser mudável tem firmeza»

mas ainda voltarei a este gajo, quando tiver tempo.
A propósito de misoginia:

Talvez orelhas de frade? Ou pudim do abade de Priscos? Ou barriga de freira no tacho?
Psicologia à la redoute
Este último post da minha rica convidada («hóspede»! credo!?, eu já acabei o ‘desmaker residence’, pois como sabe não aguento uma série com mais de 4 ou 5 episódios) , é um autêntico manancial ( se bem que devidamente maquilhado e condensado) da genuína psicologia doméstica feminina e criou-me um apelo de registo vertiginoso à sua descodificação. O dicionário não ilustrado escolheu do texto apenas meia dúzia de elementos estruturantes ( eina, que bela expressão) que por lá navegavam fazendo crer que não tinham nada a ver com isso:
(Mas como a minha guest star não é pessoa especialmente competitiva nem devo ter direito a qualquer tipo de resposta - coisa que de resto já estou habituado)


‘repetitivas cogitações’ – A mulher tem de repetir para acreditar. Não é um problema de desconfiança, mas sim de gestão da consistência. Não é um problema propriamente de inseguranças mas sim de amor à estatística. A sua reconhecida maior dificuldade de abstractizar leva-a a ter de ‘concomitar’ para confirmar. A mulher vive em constante conflito entre a aleatoriedade da experiência e a rigidez da norma.

‘poder securizante’ – A mulher vive com mais dificuldade o livre arbítrio. Joga pior com os dados da liberdade. A sua maior necessidade de ‘aparência-de-segurança’ não tem apenas razões histórico-culturais ou anatómicas, reside essencialmente na pior gestão que faz das equações demasiado abertas, como a vida em comum, por exemplo.

‘meter nas caixinhas’ – A fortíssima propensão feminina de se perder e sobrevalorizar os pormenores, leva a que tenham de carregar sempre com mais informação do que os homens. Arranjar cantinhos, arquivos, dispensas para isso tudo é pois uma necessidade que muitas vezes vem disfarçada de organização. Para a mulher, o verbo ‘filtrar’ significa guardar em compartimentos pequeninos; escondidos, pensam.

‘encher a alma’ – Mulher que se preze fica aflita quando sente a tal de alma vazia. É do género de ir às compras e não trazer nada porque lhe estava tudo apertado. Mas como a vida nem sempre proporciona insufles automáticos para essa clássico-mitológica parte do ser, a mulher desenvolveu um método químico à base de elucubrações enzimáticas – mais ou menos explícitas - que acaba por funcionar como bomba de encher , fazendo o homem de mero interface valvular ( pipo, para ser mais explícito)

‘beijinhos de amor’ – A mulher tem imensa necessidade de catalogar os actos de carinho. Um beijo nunca será só um beijo, tem de ter um sentimento especificamente associado. O problema surge-lhe obviamente quando toca a definir esses sentimentos; nessas alturas socorrem-se dos actos de ternura que lhes são adjacentes, criando-se assim o já conhecido fenómeno da pescadinha de rabo na boca; por isso a mulher é sempre refém da circularidade na sua experiência romântica.

‘vítima adequada’ – Mas na experiência erótica, ou sexual, ou o que quiserem, já fia mais fino, e aí a mulher olha para essa experiência como uma mera etapa dum processo de serial killerização de quem a rodeia. Não é uma experiência de registo predador, ou dominador, não, como poderia indiciar às primeiras impressões, é antes a delicada construção de finos Legos onde o homem vai meramente encaixando de forma expiatória e submissa, mas julgando-se um Power Ranger.

Será que eu escrevi mesmo isto?
oh lord, make me pure... (*)

é sobejamente conhecido da psicologia doméstica (e também dos textos do FJViegas como aquele em que diz que 'tudo se vê quando é escrito') serem as nossas mais fundas, repetitivas e prementes cogitações filhas do que nos vai enchendo a alma; por aqui, e em abono da verdade que é só uma embora às vezes ande camuflada como nos aperitivos, há um homem que ocupa o pódio das preocupações (neste momento por acaso até está de novo a perder mas manda a boa fé que o atribuamos ao facto de ser alguém a quem o poder securizante da repetição apaixona) do meu hospedeiro; as minhas, prosaicas e gastronómicas como nem poderiam deixar de ser, preenchem-se neste momento com o efeito do valor calórico de cada um dos 'beijinhos de amor' (**) que estou a acabar de meter nas caixinhas e com que brindarei vítima adequada, ciente que estou do tão velhinho quanto subtil ditado da minha bisavó aqui adaptado: "trinta segundos na boca, toda a vida n... a alma"

... but not yet! (*)

(*) robin williams
(**) recipe on demand by email
Este é um blog praticamente minimalista. Mas sempre com a porra do ralenti ligado. Não vá de arrefecer de repente.

Aquele princípio credulitário que se poderia enunciar como: devemos acreditar que as coisas são como parecem a não ser que, e até ao momento em que, tivermos indícios de que estamos enganados, leva-me a olhar para o cardápio dos dias e cada vez encontrar mais indícios de que Deus existe.

S. Tomás e outros carolas movidos de boa vontade, de tempo livre e da falta de sistemas de aquecimento central em casa, teimaram em organizar provas da existência de Deus envoltas num cruzamento de metafísica com botânica ascética, e deixaram-nas para a posteridade sem a preocupação de ir actualizando a grelha. Temendo que lhes aconteça o mesmo que à SIC, o dicionário não ilustrado faz-lhes hoje um ligeiro refreshing à luz do psicadelismo dos factos que a actualidade nos presenteia, qual milagres em formato de reality show. ( entradas 1105 a 1109 )

'Prova do movimento' – Como nada pode, para felicidade da especulação imobiliária, ser acto e potência ao mesmo tempo, é preciso alguém a dar uma ajudinha para a coisa ir mexendo nem que seja só a ponta dos pezinhos; o facto da fuga à Justiça de Fátinha ter sido apenas aparente poderia ser um indício de que algo se estaria a passar nesta histórica evidência filosófica, e tornaria alguns capítulos da Suma Teológica tão credíveis como os editoriais do Expresso, no entanto, se verificarmos com cuidado e outro alcance, nos escombros desta aventura jurídica o que sobressai verdadeiramente é isto: Alguém que seja puro acto teve e tem de ir segurando no saco azul para que o pessoal possa continuar a lá ir pondo e tirando sem aquilo se desmanchar tudo. Esta já está.

'Prova da Causalidade eficiente' – Baseados na evidência de que toda a causa é anterior ao efeito, vemo-nos agora confrontados com este sentimento de insegurança e incredulidade: o que é que Bárbara viu em Carrilho!? Ou seja, doutra forma: o que é que apareceu primeiro, a sedutora popa no cabelo, ou os subsídios do ministério da cultura, ou a explicação prática do panteísmo Espinoziano. No fundo, a verdade é que não se encontra causalidade plausível senão a de que um Ser supremo que penetre no interior dos recantos mais debilmente erotizados do nosso ser, sussurra a Bárbara e lhe diz: tu filha, larga tudo – mas podes manter o batôn encarnado - junta-te àquele tipo que monta casas de banho e darás à luz um puto que criará a maior discussão entre os comentadores. Não estou a ver outra Força capaz desta eficiência. Actualizado em conformidade.

'Prova da contingência' – No meio de tanta coisa que vai e vem, (fora os amigos disfuncionais do Nicolau Breyner que não se conseguem vir erectilmente) de facto nunca fez tanta falta um ser necessário. A queirosiana campanha alegre de Soares, aparece como uma demonstração cabal que é na necessidade que se forjam as grandes decisões, e quando estiver tudo realmente à brocha, quando o snooker dos dias apresentar mais buracos que aqueles que a razão consegue acompanhar, e andarmos com as bolas já sem sítio para tabelar, teremos sempre de nos socorrer, à semelhança do laico PS, d'Aquele que sempre soube diplomaticamente impor a omnipresença da sua sibilina ausência. Já marchou outra.

'Prova dos graus de perfeição dos entes' – Hierarquizar está-nos no sangue, e precisamos de conceber um crescendo de perfeição de seres que nos consola, e alimenta a esperança. O santo-desgraçadismo da nação-regime-civilização-estado representado, por exemplo, pelo tridente mágico dos ‘filosofo Gil – colunista Pulido Valente – economista Ernani Lopes’ já anuncia há que tempos que esta merda toda se desfazerá sem recuo num dia destes, e nem haverá cegonha sequer para apagar a luz no fim; no fundo apresentando o rumo da história como se tratasse duma mera hierarquia cronológica invertida desta perfeição. Ora aparentemente esta paulatina e sincopada caminhada para o abismo só é possível se a raça humana estiver de facto a melhorar de dia para dia, e assim a conseguir aguentar tamanha adversidade de registo quase peri-apocalíptico, conseguindo colocar as Sodomas e as Gomorras já só a enfeitar as inconsciências mais escrupulosas. Parece-me agora demasiado óbvio que esta perfeição crescente só é possível com a existência dum Ser infinitamente superior que, para além das prerrogativas da praxe, nos vá igualmente garantido a sanidade apesar destes e doutros tridentes de iluminárias esclarecidas; iluminados estes que se situarão certamente na parte intermédia da cadeia de valor da história: a idade ruminária. Despachada e actualizada a 4ª prova.

'Prova da existência baseada no governo do mundo’ - A evidência duma finalidade na realidade era o que servia de pano de fundo a esta prova. O sentido, a tendência, a noção de orientação impregnavam a lógica deste raciocínio. O facto do preço do petróleo andar a subir que até parece que enfiam viagra pelos poços adentro, para além de mostrar que as guerras se têm de pagar da mesma forma que me levaram à atrasado uma fortuna pelos candeeiros que me estão agora aqui a alumiar enquanto canta o Lionel Ritchie ali na VH1, mostra em paralelo que se tal coisa me lixa o juízo durante a semana, acaba por não interferir no preço dos pistachios que fui à tarde comprar no pingo doce e que já enfardei quase todos enquanto escrevo esta trampa. Ora isto só é possível porque de facto Algo está lá no fim do caminho, esse mesmo Ser que ainda pode, entre outras maravilhas, permitir que o Schroeder ( mesmo sem pintar já as patilhas) se amancebe com aquela outra moça e que o Hitler esteja lá num canto escuro e escaldante sem se poder rir de nada, nem do preço do pitroil, nem do Lionel Ritchie, nem do Chirac, nem do Barroso, nem do Antony and Johnsons, nem de nada. Finish.

E se ainda não acreditam é porque a cerveja que estava a beber pró fim já começou a amornar. E eu também já devo estar de tal maneira que agora acabei a ficar a ouvir quase hipnotizado o nhanhanha do ‘Getting away with it’ dos ‘Electronic’; tem mesmo de existir um Deus omnipresente e misericordioso e com muita coisa para se distrair senão a ‘energia cósmica da grande mãe natureza’ já se teria encarregue de destruir esta prosa irrelevante e enviar-me para a caminha há que tempos.