O equilíbrio é uma das marcas da actividade política. Um consenso vem sempre seguido de um com-penso. O novo dicionário não ilustrado revela os segredos da conveniência, perdão convivência, democrática. ( 326 a 333 )



Pacto – Estado da natureza próximo do fungo micótico que permite a coçadela prazenteira da demagogia, mas que está sempre ansiando pela pomadita milagrosa do expediente.



Convenção – Maravilha das relações humanas que transforma uma sala de irrequietos abafadores de ajudas de custo, num corredor de comensais inebriados pelo encanto duma boa refeição.



Tratado – Situação decorrente duma crise de bulimia intelectual, que leva à elaboração de dietas ricas em hidratos de converseta com trivialidade insaturada.



Aliança – Emparelhamento de valor simbólico que, ao permitir a sublimação das individualidades, realça o recalcamento dos complexos infantis de nacionalidade. Felizmente todos os países são filhos ilegítimos, e com os testes de ADN aos imaginários nacionais só descobrem que o pai andava com todas.



Federação– Quando nos mandam federar, é porque já fede tanto, que pelo menos todos juntos já não se sabe de quem é a flatulência.



Liga – Mesmo sem faca não deixa de ser uma promiscuidade a evitar. No alcoice das autodeterminações mandam as mais finas e abrem as pernas as mais escanzeladas.



Coligação – Momento de êxtase no bordel da representatividade, no qual o conluio do leito se faz entre os clientes que caíram no goto dos corretores de apostas de turno. Desfaz-se quando se abusa dos beijos na boca.



Acordo – É o colchão de penas que acolhe a lei das compensações cardadora de toda a actividade política. A compensação mais reconfortante é a de que um político intrinsecamente tolo, traz associado o facto de ser intrinsecamente previsível. Assim o povo vive em concertação permanente. Fiado no fuso "concordato" das urnas.

Sobreviver sacudindo



Recebi este texto com um laço azul a abraçá-lo.

“O que eu procuro na transfiguração cómica ou irónica ou grotesca ou burlesca é a saída da tacanhez e da univicidade de toda a representação e de todas as opiniões. Uma coisa pode-se dizê-la pelo menos de dois modos: um modo pelo qual quem a diz quer dizer uma coisa e mais nenhuma senão essa; e um modo pelo qual se quer dizer de facto essa coisa, mas ao mesmo tempo recordar que o mundo é muito mais vasto e complicado e contraditório” de Italo Calvino



Eu por acaso até não gosto da expressão “ isto é muito complicado”. O seu uso tornou-a recurso gasto. Gosto mais de “enrolado” (como até a etimologia da palavra induz) porque mostra o mundo mais próximo da sua condição geométrica .

No entanto, essa coisa de deixar como ferida exposta a ambiguidade de um facto, de uma palavra, dum conceito, de uma pessoa, é algo que seduz. Para o alcançar o recurso às técnicas de humor mais correntes acaba por ser o método mais fácil e corriqueiro; infelizmente a maior parte das vezes, por manifesta incapacidade, também não consigo fugir a esse registo; não fabulo com facilidade, e sou incapaz de introduzir – com naturalidade - a tal “poesis” no discurso.

Tenho assim a impressão crescente de que o discurso humorístico está muito sobrevalorizado, e que aquela ideia (quase psicanalítica) de que muitas vezes é apenas o humor que permite a sadia relativização da nossa existência, acaba por ser a constatação da falta de alternativas de consumo fácil.

Aparece agora igualmente “endeusada” aquela categoria do humor inteligente, que eu francamente não sei o que significa. Todo o humor é estúpido, no seu sentido de assombrado, repentino, até fugaz. Não leva à contemplação.

E é ritualista de facto. Em tempos, o memória inventada suscitava tipologias como “humor institucionalizado”, “humor fechado”, “humor de timming televisivo”, “humor forjador de expressões”, “ humor eficaz”, “ humor de filão”, “humor de provocação gratuita”, procurando descodificar os casos de sucesso comercial do chamado humor profissional. Ou seja, o humor também pode banalizar a transfiguração da realidade ao fazê-lo de forma demasiado ortodoxa, maquilhada com uma grande variedade de trejeitos sacudidos.

É que o mundo também é muito mais vasto que a sua aparente ambiguidade.

Relativizar é apenas sobreviver. Às vezes rindo.

Agora vou ver se descubro uma piadola a gozar com valencianos e suíços....
Hoje, só por causa das coisas, o abrupto acabou por marcar a agenda deste sítio esconso (alguma vez tinha que ser...). Os grandes educadores mudaram. A classe operária também. Já não é de “ elite para elite” mas de “frivolite para frivolite”. O novo dicionário não ilustrado não se acanha perante a concorrência e apresenta alguns dos novos professores.( entradas 318 a 325 )



Canais generalistas. São canais porque ligam duas zonas húmidas: o pântano da realidade com a fluidez da notícia. São generalistas porque esta humidade seca com qualquer merda nova que apareça. (evitei as alusões sexuais óbvias, porque sou púdico-discursivo)



Jornalistas económicos – Rabejadores de trivialidades. A economia da nação deixa de ser um lugar lúgubre e inacessível, para se tornar num episódio do sítio do picapau amarelo apresentado por bandarilheiros a sacudirem pandeiretas, pensando que estão a dar a volta à praça em ombros.



Associações de estudantes (ou os manuais da reivindicação) – Vendedores de cintos de castidade para universidades. Esses sim preservam o mais estranho celibato, o da estupidez humana: não fornica com nada mas casa com todos. Quando se começa a traficar direitos apregoando-os como uma anedota de putas, acaba por se vender o corpo a troco duma curiosidade bem embrulhada.



MRebeloPinto e sus muchachas pop-light – Permitem o acesso às profundezas da alma sem termos a maçada de descer por escadas íngremes e perigosas, e elevam-nos flutuando à purificação do espírito sem termos de nos enjoar com palavras difíceis e ondulantes. Verdadeiras fadas madrinhas com varinhas mágicas que também servem para palitar os dentes e tirar a cera dos ouvidos.



“O cunhado do filho do patrão do vizinho” – Aquela tal pessoa que afinal sabe porque é que foi e quem é que estava por detrás e quanto é que o outro comeu por fora e como tem um amigo lá dentro também sabe que o outro já tem tudo preparado e o resto do pessoal é que não sabe e por isso é que ele aproveita mais que todos os outros que são parvos. O saber feito uma provinciana cegarrega de engates bem engatilhados e melhor contados.



Revista XIS e quejandos – Depois da idade do armário parece que todos nos transformámos em cabides de sentimentos. Estes fantásticos varejadores de psicologismos de vão de escada, são a naftalina que nos prepara para sacudir a apoquentadora traça do dia a dia. Uma nhanha onde nem o peixe desova, nem os gatos fodem em condições.



e finalmente....

Bush – Ocupa o lugar do ponto no teatro do Éden. Vê-Lhe praticamente a face, mas no pior ângulo (Deus não tem os mesmos cuidados de imagem que Júlio Iglesias). Como não tem a mesma preparação dalguns, interpreta as escrituras à letra e só está preocupado com o tempo das falas.



F.Louçã – Verdadeiro arquimedes do pensamento revolucionário de esquerda. Deram-lhe a alavanca do microfone e ele prepara-se para levantar o mundo. Pode é esquecer-se que nós ficamos debaixo, e o Newton também era cientista....



Repare-se como evitei as previsíveis alusões a JPPereira, MRebelo de Sousa, MMCarrilho, Expresso e a todos os colunistas que nos libertam do espartilho da ignorância. É que o respeitinho é muito bonito. ( bem... e é claro que eu não podia referir o malandro do Aviz senão ele dizia que eu era da patrulha ideológica...)
"Judiarias"



Garantir desde já que Santana Lopes será candidato a Belém é um favor que se faz ao país e à política portuguesa.



Em primeiro lugar talvez os socialistas se vejam novamente tesos para levantar a garupa da luta política, e assim talvez isto aguente o PS mais um bocadito até morrer de vez. Cavaco continuará a escrever artigos dizendo que já tinha previsto tudo há carradas de anos, e nós ficamos mais sossegados por saber que ele continua a zelar por nós.

MSoares saltará a correr da bicha da caixa de previdência e escreverá a sequela do bestseller “ Meu filho, meu tesouro”. Os flocos de esquerda continuarão as peregrinações na serra do Louçã, recalcando os seus “seminarismos libertário-socialistas” com teatros obscenos de rua.

Marcelo entalado entre o “ódio óbvio e as aparências que já não iludem”, cansado de fazer tanta opinião que já não sabe qual é a dele, irá escrever a meias com Freitas um drama sobre a pedofilia na 1ª dinastia, para o APVasconcelos levar ao altar do cinema numa superprodução que secará a pia da água benta dos subsídios por cem anos.

E a direita científica? À nora, mudam de agulha e aderem ao movimento de anti-globalização. O BoaventuraSS acolhe-os porque descobre que a esquerda já não derruba horizontes. Portugal será o mestre-de-cerimónias da grande fusão ideológica dos tempos modernos.

Depois isto até pode animar, porque Deus talvez volte a pensar em nós como segundo povo escolhido. O cordeiro a oferecer será eleito juntamente com o referendo à constituição europeia. As doze tribos serão os clubes de futebol (qu’é para não se estragarem mais famílias).

E se por mero acaso Santana perder (para Guterres ou para Narciso Miranda), irá emparelhar com a bailarina Odetesantos recitando trocadilhos políticos no túnel das amoreiras.

Deus, vendo Guterres, vai-se arrepiar e nem espera por Moisés levando-nos a todos pela mão para a Terra prometida. E lá nos vamos desenrascar outra vez (mais praga menos praga...)



Para mim é uma imperial se faz favor

Estar dentro e querer ver como se estivéssemos fora; estar fora e querer ver como se estivéssemos dentro. É isto que faz dalguns, peregrinos numa suave neurose de ubiquidade. Claro que os jornalistas e os políticos ao celebrarem o estilo” Um olho no burro e outro no cigano” pensam que iludem esta “fatalidade”. Só que o mundo responde-lhes como o personagem-narrador do “Túnel” de E. Sabato : “ existiu uma pessoa que poderia compreender-me. Mas foi precisamente a pessoa que matei”
Se calhar pensavam que só os outros é que podiam escolher títulos à toa
Os “comentadores literários” parecem aqueles que estão sempre a bater à porta da casa de banho a oferecer papel higiénico quando nós só queremos é satisfazer os caprichos do corpo em paz (isto era um título)



Já estava a ficar preocupado a ver que só os outros blogues é que recebem correio qualificado. Foi então que...Fátinha Felgueiras – num hospital brasileiro, curando-se duma unha encravada ao desatar um nó do seu ultimo saco azul - não quis ficar atrás do VPulidoValente e mandou-me uma carta sobre a sua leitura pessoal do novo livro de ALobo Antunes



“ O “boa tarde...qualquer coisa “ é um romance confuso. O senhor que o escreveu deve ter problemas de tabulação lá no computador dele. Ou então é uma “fobia da esquadria”... (Isto lá nas câmaras resolve-se com umas rotundas). Aquilo não é livro que se possa oferecer no Natal!!! Uma pessoa começa a lê-lo e só acaba lá prá Quaresma; o espírito da epifania mistura-se com o do sofrimento...bem.. afinal até tem tudo a ver...

As palavras nem são difíceis – aqui no Brasil é bem pior – mas eu acho que o sacana faz de propósito para nos ludibriar os neurónios com a obsessão de misturar os discursos e os tempos (Na câmara, se eu fizesse isso diziam logo que era corrupta porque não mostrava as coisas às claras).

Ouvi-lhe dizer que este é o “território da ficção”. Eu vi logo que não era única a driblar o PDM. O magarefe do Antunes também não tem regras nenhumas, é um urbanizado a meter-se numa reserva ecológica, e o pessoal depois de ler tem é que ir enfiar os miolos na enceradora (eu também queria mandar fazer uma lá em Felgueiras...ou era incineradora??)

E é muito feio escrever sobre terras inventadas, porque as terras já não se podem defender e nós ficamos sem as nossas referências (lá no PS também diziam que perder na nossas referências era muito mau), não sabemos quais são as carreiras que se apanham e se quisermos fugir do romance, vamos para onde, se já não sabíamos onde estávamos???

E é muito triste aquele ar distante de quem parece que não controla o enredo (e ainda nos criticavam com o resvalar das empreitadas). Um escritor tem que ter a sua personalidade. Não se pode levar pelas falinhas mansas das personagens. Senão elas mandam nagente e fica como nas telenovelas e na política; ora o senhor Antunes, que me dizem não ser desses, como é que se mete nestas alhadas!? “



O Lobo Antunes que não consegue escrever nada sem vir ler este blog, de certeza que não se vai ficar ...
O novo dicionário não ilustrado encanta-se com os “suaves engajamentos” ( na lista de links ). Tentando ajudar o resto do batalhão a marchar em condições, propõe a seguinte arregimentação para que não se troque o passo da marcha:( entradas 297 a 317)



Romantismos

Esquerda I– Tem os sentimentos à flor da pele. Saem geralmente flagelados pelo contacto com a realidade.

Direita I– Tem os sentimentos no sangue. Em regra só acabam por encontrá-los quando vão retirar a seiva para as análises (políticas).



Preocupações

Esquerda II– O desemprego deixou de ser uma preocupação social para ser uma preocupação pessoal.

Direita -II Na impossibilidade técnica de terem preocupações sociais, o desemprego passou a ser um mecanismo de regulação que deve ser acarinhado



Orfandades

Esquerda III– Tem apenas o "bush" e falta-lhe o "estica". As paródias começam a sair-lhes mais sensaboronas e com ligeiro sabor a resignação

Direita III– Só com um Lula a sério para fazer a caldeirada, não conseguem nem demonstrar, nem ameaçar, nem prometer que estaremos próximos do “fim do mundo em fio-dental”



Tecnocracias

Esquerda IV– Prepara cuidadosamente as soluções, para depois escolher os problemas que mais se lhes ajustam

Direita IV– Adapta criteriosamente os problemas para receberem as soluções do costume.



Obsessões

Direita V– Pega nos paradigmas revolucionários, que pede emprestados à esquerda quando esta os pode dispensar, e metaboliza-os em medidas cirúrgicas.

Esquerda V– Sublima os paradigmas conservadores, depois do seu devido recalcamento face à neurose de inveja, e evapora-se no pragamatismo em fervura.



Subversões & Conspirações

Direita VI– Os explorados são agentes secretos da mediocridade e os exploradores são fogo amigo. Mata-hari é o mercado em versão drag-queen.

Esquerda VI– A luta de classes é amamentada e acarinhada por compromissos históricos. A ética revolucionária propõe que se use o poder como barriga de aluguer.



Estéticas

Esquerda VII– Como se considera guardiã da expressão artística, nunca troca um bom drama por uma boa perspectiva.

Direita VII– Como se considera guardiã do património, nunca troca uma coluna coríntia por um teatro ao ar livre.



Penitências

Direita VIII– O corpo acompanha bem as amarguras da alma. Limpa os seus pecados utilizando os transportes públicos para se passear entre as estações dos preconceitos e os apeadeiros da caridade.

Esquerda VIII– Não distinguindo a alma do corpo, acaba por não sofrer. Limpa os poucos pecados que reconhece, no molho da saponária do discurso



Turbulências geracionais

Esquerda IX- Os filhos moderados amancebaram-se definitivamente, e os avós radicais estão numa crise de nervos a mudar o testamento à pressa. A corja de herdeiros acotovela-se - em “bloco” - à espreita duma assinatura moribunda.

Direita IX– As novas castas mais castas ainda agora saíram da poda e, coitados, já lhes estão a espremer o bago sem piedade. Os novos “cavernáticos-sabichons” estão às “Portas” da adega, mas não os deixam misturar-se com as velhas “periquitas”. Entretêm-se a ver a “Bela e o Mosto” na 2ª fila.



Trabalho sujo

Esquerda X– Encomenda-o à direita.

Direita X– Fá-lo com gosto, mas exige à esquerda pré pagamento.

Eu, um itinerário

Eu gosto da palavra transcendência. É um dos tais conceitos que permitem ao discurso não se deixar contaminar pelos acontecimentos. O Rubem Fonseca dizia que ela devia ser proibida porque já a tinha visto ser usada para descrever um bóbó de camarão. Só que ela está-se a borrifar para isso.

Aquela ideia protestante de que as palavras nos livram do “folclore” simbólico-imagético acabou – infelizmente – por vingar nalguns subconscientes e diluiu-nos por vezes num território exegético-real.
Com as suas obsessões etimológico-oníricas ( e viciantes... ) JLBorges também se esticou um bocado e não está isento de culpas: Deixou-nos ainda mais atados ao labirinto facto-discurso-facto-discurso.

Ou seja : “Para lá de” é onde eu quero estar, longe das palavras, longe dos factos, longe dos significados, na mera circunstância, na mera “superstição topográfica”. Onde a facilidade simbólica é a “narrativa dominante”.
Em blogspot.com. A minha sala de chuto assistido.
Prémio de consolação



Por mim pode ficar perfeitamente decretado que: Quem por pudor, ou vergonha, ou consciência da realidade, não se puder dar ao luxo de auto intitular “extremamente inteligente”, poderá em recurso utilizar o epíteto de “irónico”.

É fino e não fere tanto os espíritos mais frágeis como eu. (estive para escrever frígidos, mas agora um gajo tem que se conter...).

A ironia está a tornar-se o palhaço pobre do discurso.

O drama da infinidade semântica : Inocência explícita

Fui tomado por uma certa pulsão de thanatos.
Não sei se conseguirei resistir. É mais forte que eu, que sou reles andróide endrominador... É que isto de dizer mal também me parece que está a precisar duma recauchutagem!... O quarto do pulha – em flagrante crise de identidade – até já se tem de encostar à bengala do pipi, o Mephis começa a rodopiar demasiado em torno de vítimas que o ignoram, e o anarca constipado já apenas atordoa recenseando anarquicamente notícias.
Isto de viver apenas parasitando na tolice alheia está a ficar difícil. É como estar sempre a dizer que não se gosta de bacalhau com natas. A certa altura o bacalhau caga nisso, e a vaca é para esse lado que muge melhores natas.
Organizem-se pá!
Até o VPulido Valente já teve de vir dar uma mãozinha!!!!
Bem eu não m’aguento mesmo...
Julgo que todos já nos distraímos com a gabarolice marialva, já mandámos as nossas chalaças ao orgulho gay, já elaborámos os nossos imaginativos trocadilhos sexuais, já mandámos umas piaditas a padrecos mulherengos, agora o que eu ainda não tinha apreciado era a “castidade apregoada”. Foi então hoje que descobri o “orgulho acenante de um miosótis grisalho que não é uma ameaça sexual”.
Trata-se de uma castidade não contida. Uma pureza de espírito que eleva a mente às muralhas da bem-aventurança e o corpo ao recato duma catacumba.
É uma revolução na moral. Vinde que eu sou cristal. Através de mim vereis o vosso coração e não vos conspurcareis.
Um altar de virgindade com ponte rolante é o sonho de qualquer pecador. Felizes dos que lhes basta carregarem num botão, para bascularem a sua alma até ao suave leito do amor desinteressado e desinfectado. Sortes dos que olham para si próprios e vêem um são bento envolvido em silvas.

DdD...Falar de nós próprios, de facto, não está ao alcance de todos. E bem dizia G.Steiner que “ Não há nada de mais exasperante na condição humana do que o facto de nós podermos significar e/ou dizer seja o que for”

E pronto agora vou ter que dizer aquela lengalenga do costume: não o conheço. Se calhar é bom rapaz. Isto não tem a ver com o cidadão em concreto. Muitas vezes até gosto do que escreve. Tenho invejolite do seu público babejante. Ele até foi ao fundo da alma poética de Pessoa como nem a mãe dele. Uma coisa é verdade: não sei quem ele é. Se soubesse nunca escreveria isto.
E até me dá para lembrar o AJabor de há uns meses: “Essa é a utopia masculina: satisfação plena sem sofrimento ou realidade”.
A castidade também pode ser hardcore.

(agora para limpar, durante o resto da semana só vou escrever a dizer bem da ana gomes, do manel monteiro, do narciso miranda e da mrebelopinto)
Os intitulados “estados de direito democrático” têm as suas cruzes, e em regra são muito eficientes a distinguir o bom ladrão do mau ladrão. Geralmente quem carrega a cruz democrática nunca é o carpinteiro nem o seu filho. A eficiência é o nome do carrinho de mão que a transporta. Aos solavancos. O novo dicionário não ilustrado é o guia turístico desta via-sacra. ( entradas 286 a 296 )



Falta de legitimidade – Vício que peregrina no instável equilíbrio entre a eficiência e a formalismo da lei. Promove romarias para afagar indignações dos que vêem na lei uma canja de virtudes.



Favorecimento – Crueldade que mina o lírico equilíbrio entre a eficiência e a igualdade. Alimenta os enojamentos dos querubins do paraíso da hipocrisia, e os desabafos irritados das almas que purgam cobiça.



Erro Judiciário – Ovelha negra do pastoreio jurídico que atrapalha o bucólico equilíbrio entre a eficiência e a liberdade. Como a inocência é uma presunção, quem se julga inocente não é mais que um presumido.



Conflito de Interesses – Estremecimento de energia variável que polariza o aparente equilíbrio de embalar todos os amores não risíveis. Atrapalha muitas almas que julgam que o motor é dos valores e que depois verificam que o volante só gira no sentido dos ditos interesses. Felizmente o motorista no final do dia acaba por ir dormir a casa.



Danos colaterais – Vírus recalcitrante que se insinua constantemente no mal imunizado equilíbrio entre a eficiência e a tranquilidade. Se quem anda à chuva se molha é porque as gabardinas passaram de moda e o que está a dar é mostrar o umbigo.



Selva das instituições – Teia pegajosa que atrapalha os movimentos do imperturbável equilíbrio entre a eficiência e a regulação dos “mercados”. Quando a “intuição da concorrência” parece não ser facilmente domesticável, é necessário carimbá-la com os diversos selos brancos das “instituições da decência”.



Minorias (respeito pelas) – Inesperada perturbação no mais que perfeito equilíbrio entre a eficiência da centralização e o supérfluo luxo da representatividade. Ele há gajos para tudo e um gajo não pode pensar em tudo.



Demagogia – Frágil aconchego que empalha o mal acamado equilíbrio entre a eficiência duma mensagem e vertigem de agradar. Só o oco palavreado se pode preencher de boas intenções.



Frustração social – Irritante comichão para o arrogante equilíbrio entre a eficiência na gestão dos recursos e os caprichos desses recursos. O luto dos explorados faz-se no nojo da classe média.



Privacidade (devassa de) – Epidemia que assola a ilusório equilíbrio entre a eficiência da informação e o direito a “mijar em paz” . Com a floresta do “espaço púbico” tão desbastada só resta o “sonho” da versão algaliada ou a sobranceria da incontinência.



Político-anedota – Bobo da corte que desanuvia o maçador equilíbrio entre a eficiência de governar na paz do senhor e a necessidade de prestar contas. Quando mais vale nem saber, é sinal de que o ladrão era amigo da casa.

Às vezes não são rosas senhor



Se o que nós assistimos nos últimos dias pelos chamados “ meios de comunicação “ é o que parece, a situação iraquiana não se adequa à visita não turística dos 150 coitados-GNR-portugueses.

Governar com “sentido de estado” e “noção do papel de Portugal no mundo” não pode ser: “agora só há é que os apoiar”, “não podemos fugir às nossas responsabilidades”, “ há que assumir os riscos das nossas alianças”.

Podemos “andar à nora” mesmo sem ser burros.

Quando elegemos o nosso prosaico-primeiro-ministro não elegemos um grande estadista internacional, mas apenas um tipo para nos diminuir a listas de espera e acautelar das vacas loucas.

A guerra é um fenómeno com o qual podemos ter que viver, mas tem as suas leis. E não julgo que sejam as mesmas das finanças públicas.

Para não ter vistas curtas não basta pôr a mão a fingir de pala de sol. Não estar encandeados não é suficiente para ver bem; há que saber viver na sombra. Se passarmos o tempo a piscar os olhos, ainda vão pensar que andamos a querer engatar alguém.

Para actos simbólicos chegam-me as eleições.

Pintores de escrita à pistola



Uma das coisas que dá mais pena é ler as banalidades que grandes pintores escrevem sobre a pintura. O génio está-lhes quanto muito no pincel, bem longe do verbo. Acabam geralmente por apenas distribuir trocadilhos suavemente metafísicos sobre os conceitos que suspeitam dominar.

É a velha obsessão de conseguir ver o todo, e de não nos contentarmos por andar distraídos e entretidos apenas com as partes.

«Só o aspecto puro dos elementos numa relação equilibrada pode aplacar a tragédia da vida.»

“Por detrás das formas naturais mutáveis jaz a realidade pura que é inalterável.”


Lia-se de Mondrian no murmúrios do silêncio (que na sua boa fé nem tem culpa...). Esse rapaz foi de facto um dos que perdeu tempo com um ideotário estéril e quase pueril, não se contentando em apenas pintar brilhantemente e ir ouvindo um bocado de jazz. Na linha doutro rapaz - o Kandinsky – que também se desfez em palavreado de trivialidade conceptual, e tanto esgotou a sua verborreia ( de triângulos a agredir curvas) que muitas vezes nem sobejou nada para dar uns títulos de jeito a muitos dos seus sobrestimados quadros.



Pintem, nós gozaremos e agradeceremos, mas não chateiem. Já nos basta o também sobrestimado Manuel António Pina ter dito que “ O azul não é deste mundo, / nem os olhos são deste mundo “

Se calhar aqui já fui longe demais....

O Cunhal afinal



Porque gostamos de inventar pessoas especiais!? Cunhais de altar. Ladrilhadores de testa alta com diploma de arquitectos. Mistificações de ridícula-incontornável-importância-histórica.

Cunhal..... Prefiro ser visto como um extenso bordel bragantino do que como um lar de comunas

.

Afinal chamou-se heróica coerência a um mero instinto de sobrevivência

Afinal eram meramente tácticos os processos articulados de segredo-revelação

Afinal nem toda a gente que desenha bem tem direito a ser herói nacional

Afinal ser clandestino é a sina de qualquer bloguista anónimo

Afinal ser escritor anónimo é a sina de qualquer pipi



Afinal certa esquerda tem-lhe secreta raiva porque ele tem mais pedestal que ela

Afinal certa direita põe-lhe o “manto da glória” porque arrelia a esquerda



Afinal ele condicionou um período histórico em Portugal porque apenas estávamos confusos, mas continuamos e ele já não tem nada a ver com isso

Afinal ele acreditou no destino da história, mas vai precisar da mão misericordiosa de Deus como todos os desgraçados que instrumentalizou

Afinal as gajas gostam dele como gostam de qualquer velho de cabelos brancos

Afinal os jornalistas gostam dele apenas porque ele se mostra inacessível e até fugiu da prisão.



Cunhal.... Mais um dos fornecedores do multifacetado mito de que “estivemos quase quase”.

Acontece porque somos um país com a vertigem da tangente.

Uma mão amiga para os dependentes da história. Um mero manipulador fantasiado de idealista revolucionário.

O método histórico tem o que merece. Afinal.

Primus inter parvus



Enrebanhando pelo tricot de links desta paroquiana blogaria,dei com um dos “escrevedores encolunados” da moda a dissertar sobre ter fundado “o primeiro” blog português.

Eis outra das “vertigens obsessivas” da nossa condição: aparecer antes do outros, ser o primogene, ter dito primeiro, ter feito primeiro, ter pensado primeiro. Olhar para trás e ver sempre uma cauda a abanar.

O novo dicionário não ilustrado apresenta-nos outras “camisolas amarelas” do pelotão. (entradas 276 a 285 )



Adão – Cortou a fita à entrada da espécie. Por causa da merda duma maçã passou o tempo todo com uma parra à frente e uma mão atrás. A costela mais atrevida deu azo a uma gaja, vá lá..., mas no afinal das contas foi um tipo que só serviu para nos infernizar e mediocrizar a existência. Abraão depois também não ajudou.



Ovelha Dolly – Não era ranhosa mas finou-se rápido. Ser copiada afinal era uma originalidade de judas. Nem a porra duma camisolita de lã se conseguiu fazer com ela.



D. Afonso Henriques – Um power ranger que nos separou da Galiza ainda sem o TGV adjudicado, condenando-nos à sina de sermos apeadeiro. Lá porque não queria ser menino da mamã não precisava de se ter esquecido dos percebes e só ter trazido para cá os tremoços.



Fernando Santos – O primeiro “engenheiro do penta” fiou-se no nome e acabou a carpir nos finados matraquilhos da lagartada.



Kandinsky – Apresenta-se como o primeiro pintor abstracto, mas acaba por se resumir a umas t-shirts e uns calendários pouco apreciados pelos camionistas. Nos postais de Natal não rende porque nem se percebe onde está o menino Jesus. Nos previsíveis museus faz figura de corpo presente a ver passar o cortejo de vénias.



Neil Amstrong – Foi o primeiro na lua, mas esta musa da noite continuou a ser um mero asteróide poético. Fez com homérico aparato o que um robot bem oleado e telecomandado num sofá também faria.



Branca de Neve e os sete anões – Primeira super produção do desenho animado, onde a utilização de um obsceno montante de recursos, não garantiu sequer a desmontagem definitiva do mistério monogâmico a que se propunha: O príncipe ficará para sempre hipotecado à boa vontade de sete anões.



Vasco da Gama – Deu com a pimenta antes de se ter inventado o saleiro, e criou expectativas de que iríamos viver num eterno banquete. Como os “chinocas” andavam entretidos na altura, deixaram-nos brincar aos restaurantes e aos serviços de porcelana durante uns tempos. Restam uns cacos a alimentar os leilões da moda.



Einstein – Na busca do absurdo absoluto descobre o incómodo relativo e a charada mantém-se. O tempo e o espaço continuam a ser a reserva poética da espécie. Fica como mais uma máquina de aforismos com os cabelos ao vento, à espera que Deus nos resolva definitivamente o assunto.



Emídio Rangel – Depois de ter inaugurado os saudosos “ Perdoa-me” e “Cenas de um Casamento”, leva agora a nobre tarefa de Marante-manager. Quando for consultor da Carris a sua “mais-que-tudo” será.... pica-bilhetes.

Annus possibilis



Procurando dar uma machadada definitiva no tacanho vício de não sabermos olhar para o futuro, de apenas navegarmos à vista e de agirmos só para o imediato, o nosso venturoso governo decidiu estabelecer um calendário para a realização do “pouca-terra-pouca-terra” do futuro até ao ano 2018. Isto sim é estratégia e planeamento da mais fina água. Agora não devemos ficar por aqui, pois temos finalmente o futuro nas nossas mãos. Sou forçado a debitar um programa construtivo para Portugal:



2019 – Ano da limpeza. Bandeira Azul para o rio Trancão. Gigi revela ao mundo o “safio au bechamel”. As festas sociais rendem-se ao encanto do suburbano. Represas fará duetos com Emanuel. Portugal será um país asséptico, pleno de equilíbrios e irmandades. Uma serena Etar à beira mar.

2020 – Ano da castidade. Bragança inaugura sem complexos a ponte aérea com a Tailândia. O pecado será erradicado definitivamente através do “kit fidelidade”. Esta maravilha da tecnologia inclui um "excitómetro" que acompanha devidamente todo o homem casado. Modernos sensores darão nota de quando as massagens começam a amachucar o laço conjugal.

2021 – Ano do lodo da sorte. Santana Lopes inaugura o 1º casino submerso no metro do Terreiro do Paço. Sob estacas, os mortais verão que a sorte e a felicidade terrena são efémeras.

2022 – Ano da honestidade. É feita a primeira urbanização em Portugal ao abrigo do “Corrupt-free”. Trata-se de um programa de reinserção moral para autarcas, que entregam as “luvas” numa roulotte à entrada do empreendimento, e recebem em troca um saco azul com um terço e uma pagela da comissão de ética.

2023 – Ano da caridade. Mourinho finalmente sente que o Porto já não é perseguido e afasta-se para levar o Benfica ao título. Pinto da Costa volta duma Romaria a Fátima, e depois de uma visão apocalíptica convida Rui Rio a ir ao estádio. Este vai e vê em Pinto da Costa as chagas de Cristo. O estádio muda de nome para “ Estádio do Estigmatizado”

2024 – Ano da saúde. Longas listas de blocos operatórios em espera de doentes. As enfermeiras do hospital Sta Maria lançam a primeira colecção de tapetes de Arraiolos.



Agora uns anitos a relaxar com uns governos PS...



2025 – A filha de Martins da Cruz acaba o curso.

2026 – Terminam as obras para o euro 2004.

2027 – É inaugurado o aqueduto Alqueva-Casablanca. AntónioP.Vasconcelos diz que não tem verba para fazer o filme da vida de Bibi, que ele reputa essencial para a compreensão do Portugal moderno.

2028 – O Sri Lanka entra para a Comunidade europeia. A regra da rotatividade promove a presidente deste ano a Papua Nova Guiné. As nações unidas inauguram a sua nova sede num armazém em cabo ruivo. È o primeiro ano na clandestinidade.

2029 – Ferro Rodrigues apela ao apoio do partido depois de João Soares o ter chamado de velho ferrugento. O PS é novamente entregue aos credores.

Volta o sufoco da crise....




2030 – Ano do poder. Mega fusão entre a ordem dos advogados, a procuradoria, e o tribunal da relação. O tempo médio de conclusão dos processos passa agora para 15 minutos. A Polícia judiciária opta pela fusão com a SIC. A fase de inquérito dá-se no jornal da noite. O governo e o parlamento chegam a acordo para juntarem os trapinhos com a liga de clubes. O “diário da república” é distribuído com os bilhetes cativos de época. Finalmente três poderes estão bem definidos e separados. O quarto poder – Narciso Miranda – está à espreita.



2031 – Ano da poupança. Paulo Portas, em nova contenção de despesas, inaugura a 1º carreira regular dos submarinos entre Trafaria-Bobadela. De periscópio em riste procura ansiosamente o cadáver de Nélinho Monteiro a boiar junto de uma alforreca.

2032 – Ano das desculpas. Pedir desculpas pelas asneiras ditas passa a ser tributado e a principal fonte de receita para o estado. O tremendo sucesso desta medida leva ao entusiasmo de prometer outra vez a linha do TGV entre Lisboa e o Porto para o ano de 2058 (deste vez é que é).
Palavras ao vento



A palavra é um bluff. Sobrevalorização em excesso.

Próprio dum mecanismo que se pensa essencial, os seus efeitos são limitados, tendencialmente repetitivos, e raramente satisfaz os clientes que a requisitam.

O elogio bacoco aos poderes especiais da palavra, à sua causa expressionista, à sua amplitude, ambiguidade e divina subjectividade, é uma ideia feita e alimentada pela puerilidade dos seus escravos.

Não faz a porra dum luto, não faz um amor, não faz um agradecimento de jeito, não alimenta uma pena, não consola um coitadinho. Fraco fracasso: não faz a diferença. É puro massajar sem tocar.

Alimenta-se a si própria, como simples “reflexividade” “armando-se” à transcendência; como é que nos deixamos enganar?

Usamo-la como mera fatalidade ou ao ritmo da poética ingenuidade. Ilusão e desilusão.

Tudo bem, ...que seja um parque de diversões, um carrossel para miúdos. Nunca será a “capela sistina”, nem um “franzir do sobrolho”, nem uma “lágrima”, nem um “encolher de ombros”, nem uma mãe.



Antes escravo do corpo e de Deus do que escravo da palavra e dos seus mitos.

Hoje apenas para acompanhar a cervejita e o tremoço, o novo dicionário não ilustrado tenta decifrar os nomes que os “gajos” nos chamam. Um pires com as entradas 263 a 275.



Na televisão...

“Povo” – Palavra que exprime a resignação pelo facto de não conseguirem fazer omeletas sem nos limparem primeiro as salmonelas, e verificarem que temos casca boa para partir.



“Cidadãos” – Palavra de registo cacofónico que acaba por dar muito boa serventia nas correntes de solidariedade.



“Eleitorado” – Designação que revela o encanto quasi-fetichista que provocamos, quando temos um papelito dobrado na mão, uma cruz para distribuir, e umas ilusões para hipotecar.



“Gentes do nosso país” – Expressão de cariz lírico-bucólico que, à falta de música a acompanhar, só Júlio Isidro poderá usar em condições higiénicas.



“Amostra representativa” – Expressão elogiosa do foro estatístico, que faz de alguns privilegiados um misto de fita métrica calibrada com rato de laboratório.



“Portuguesas e portugueses” – Expressão respeitadora das “quotas” e caída em desuso depois de ter sido drenado o pântano.



“Munícipes” – Palavra que infelizmente rima mal com acepipes, por causa da porra da acentuação. Mas na realidade não passamos de salgadinhos de carne no grande cocktail do “orden(h)amento”



“População” – Termo que designa a gentalha que se tem de pôr aos pulos para que reparem nela.



“As Pessoas” – Palavra refúgio, utilizada somente em desespero de causa e já com um pouco de baba retórica a escorrer.



Apenas nas chamadas telefónicas...



“Os filhos da puta” – Designação corrente que exprime o nobre sentimento de que apenas servimos para extorquir a parte do orçamento que podia ser utilizada em viagens de estado e obras de fachada.



“Os cabrões” – Designação corrente para exprimir o desconforto que os políticos sentem quando a populaça levanta a cabeça, e os chifres que nos colocaram os começam a arranhar.



“Os gajos” – Expressão carinhosa que revela a bíblica sabedoria de que “ pó somos e em pó nos tornaremos”. Vão aproveitando assim a poeira que “já cá canta” e apontam-na inevitavelmente às vistas dos crentes arregalados.



“O pessoal” – Expressão erudita que revela o secreto desejo dos políticos de que todos fossemos ucranianos rastejando por uma autorização de residência.

Definitive collection da malta



Deus prova a sua absoluta existência quando, de forma magnânime, distribui subjectividade por todos os lados. A malta é mal agradecida

O mal ao ser mastigado produz aquele sabor empapelado, que depois só dá vontade de beber muita água. Muitas vezes nem temos a fonte certa à mão. A malta enerva-se

A condição humana nem é tão ranhosa assim, mas revela-nos que sem Deus podemos aparentar meros seres condicionáveis. A malta fica intrigada

A morte é sempre súbita e transcendente porque parece que não fomos feitos para morrer. Também não percebemos para que fomos feitos. Temo que não tenhamos sido feitos para perceber tudo. A malta mal se conforma

A ciência vai conseguir provar tudo se tiver um manequim de jeito. A malta entusiasma-se

A vida eterna tem uma característica: é para sempre. Este conceito também não é inteligível. Felizmente. Mas há malta que fica ansiosa.

A Salvação é uma poda. A imagem de Deus que mais gosto é a do Jardineiro, que trata das flores e só as colhe quando estão no culminar da sua beleza. Aqui a malta fica sem saber o que dizer. (excluindo as ordinarices...I)

Volta tudo ao princípio sff.

Para esquecer a romaria à senhora da cunha e aliviar da via-sacra na casa pia, estaremos agora dedicados à ladainha do orçamento. Demonstramos assim a grande dificuldade que temos em nos assumirmos como um estado laico; o novo dicionário não ilustrado o mais que pode ir fazendo, é lavar os dogmas com água de malvas em vez de usar água benta.( entradas 253 a 262 )



Ciclo económico – Designação comum para um momento em que tudo se passa sem que ninguém dê conta, e que depois, quando todos dão conta, já passou. Felizmente asseguram-nos que os “ciclos são cíclicos”, e que três ciclos seguidos não fazem um triciclo mas antes um período. Ocasionalmente estes não menstruam, e é sinal de que passado alguns meses vão aparecer problemas novos.



Crescimento – Fenómeno curioso em que os números nunca encolhem com as lavagens estatísticas, e se debotarem existe um maravilhoso elixir chamado “critério”.



Competitividade – Mitificação dum complexo mal resolvido de Adam Smith segundo o qual, para sustentar as bebedeiras duns “ricos”, os “pobres” terão de tricotar, rapidamente e em conta, as camisolinhas de lã para os outros usarem depois da ressaca.



Equilíbrio – Na corda bamba da economia, a melhor vertigem é a dos que fecham os olhos e sonham que a frigidez da conta bancária pode ser curada pela lambidela dum Nobel na púbis a descoberto



Modelo de desenvolvimento – Espécie de figurino teórico caído em desuso nas últimas estações, mas que teve de ser recuperado por falta de verba para assistir aos desfiles. Os manequins vão-se então oferecendo para mostrar nas revistas a suas insinuantes e esquálidas peidolas, de forma a arregalar os olhos dos que as têm desgraçadamente peladas.



Mecanismos de auto-regulação – Descoberta apresentada como a quinta-essência do liberalismo económico. A sintonização automática faz maravilhas, e até se vê televisão por cabo na sopa dos pobres, sem ser preciso lá estar um ministro com o comando nas unhas e à toa com as instruções.



Afectação de recursos escassos – Fatalidade de um património a quem se atribuiu um nome infeliz. O facto de ser escasso não ajuda, pois todos os mirones estão de olho nele. É inevitável que fique afectado.



Políticas monetárias restritivas – Irritados com o princípio de que “nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”, os economistas inventaram o estado da natureza denominado “massa monetária”. Comporta-se como o intestino grosso e tem tendência para estar em constante espasmo. A diferença é que à merda chamaram inflação e a prisão de ventre passou assim a ser um objectivo estratégico.



Convergência – Mecanismo próprio da nossa condição de primatas mictantes. Um fluxo urinário que não seja convergente coloca-nos inevitavelmente a chapinhar num pântano de icterícia crise. A faiança sanitária foi pois o melhor instrumento que se descobriu para atenuar a luta de classes.



Consolidação orçamental – Efeito de uma argamassa que, “vai-se a ver”, quanto mais porosa mais formosa. Tal como na consciência, demasiada densidade só atrapalha, e os buracos não são mais que preciosas válvulas de escape.

Requiem a um deus de vão de escada



Uma das tormentas que assola a minha existência é poder passar ao lado dum poema que mudasse a minha vida e que, por pequenez do meu espírito, não o reconhecesse.

Consta-me que se discute agora que a poesia está em perigo e que pode morrer. Teme-se que um novo degelo das águas turvas da realidade acabe com os dinossauros da palavra: os que ainda a tratam como os primitivos. (ideia que o JLBorges me emprestou à borla)



Se isso acontecer....



1. Ficarão apenas os bichos de menor porte, ou seja, aqueles trapalhões como eu, que só brincam com as palavras, incapazes de serem verdadeiros predadores de garras afiadas e dentes de sabre.



2. Como dizem alguns estudiosos afamados, ficará Pessoa “por resolver” e não mais atormentará a plateia dos babados que tinham pago para sessões contínuas



3. Alguns críticos poderão ir para as obras concorrer com os ucranianos directores de orquestra.



4. Os milhões de poetas portugueses libertar-se-ão desse jugo de não poderem rimar, senão chamam-lhes “aleixados”.



5. MRebeloPinto converter-se-à finalmente ao abjeccionismo, e o seu novo título será: “ Eu enrabei um editor-pop”.



6. Rir será sempre uma opção, mas apenas depois de pedir a devida autorização ao JPPereira (podem perguntar por sms)



7. O corpo passará a ser o único guardião dos sentimentos, e a alma, desprovida da "deusa-da-palavra-luz", será um mero polícia sinaleiro



8. A natureza ficará apeada do grande descodificador poético, e teremos de nos contentar com a empolgante dialéctica entre a JAE e a QUERCUS.



Pensando bem....

Engajamentos



Há que acarinhar os peditórios da “esquerda” versus “direita”, porque esta dicotomia é acolhedora, dá segurança, e é um bom refúgio em momentos de esterilidade e intranquilidade criativa. Os esgares da “liberdade” e da “igualdade” fornecem-lhes ainda os adereços necessários para estar sempre na moda.



Se um infeliz destes, mais desprevenido, disser uma asneira, certamente alguém já a terá justificado, ou com uma referência histórica bem desmontada, ou com uma frase enigmática, mesmo irónica, mas sempre brilhantemente fundamentada por um deus de serviço.



Eu pessoalmente até gosto de ler textos de gente engajada. Lêem-se com serenidade, com aquele descanso de alma de quem já sabe o que vai acontecer, não vai haver muitas surpresas, os bons raramente se misturam com os maus e nós não nos baralhamos. E o Popeye nunca aparecerá a estragar a história da Bela adormecida.



Este espartilho ideológico – espantosamente – ainda liberta o engajado do desagradável que é ter o desconforto da dúvida, e impede-o de ficar indecentemente despido de preconceitos e assim escandalizar a audiência.

Desenhar num quadriculado já conhecido é a garantia de que nenhuma parte ficará desproporcionada. A estética nunca extravasará a ética do discurso.



O recorrente – mas intermitente e bacoco – elogio de um lado ao outro da barricada, mesmo se pueril, faz mostra de que talvez tudo se pudesse resumir a um concurso de dardos palavrosos que acabasse com umas cervejolas. Mas o jogo floral dos conceitos e das argumentações tem clientela mais fina que os bares de alterne.



Não desprezo, por isso, o pensamento previsível, porque dele é o reino dos bem-aventurados. Dos que não vão em aventuras mas tiram sempre as melhores fotografias.

Até porque a esquerda e a direita existem mesmo. Mostram o poder no seu esplendor e no seu estertor. A demasiado valorizada “independência” corre o risco de o mostrar apenas no seu rancor.



Pleuresias incompletas

Anátemas anatómicos



Um poético seio

Não faz um bom par de mamas



Um cândido olhar

Não faz um bom piscar de olhos



Uma anca ululante

Não faz um bom jogo de cintura



Uma nádega arredondada

Não faz uma boa base de partida



Um umbigo rafaeliano

Não garante uma ligação à terra



Umas coxas roliças e firmes

Não alicerçam um bom lar de família



Uns lábios carnudos

Não garantem um bom refogado



Uma mão amiga

Não aperta um car......



Mas é preciso um bom pulmão

Para respirar um amor decente