No fucking problems



O verdadeiro problema do nosso regime não é alimentar Santanas, mas sim criar e alimentar Barrosos.



O verdadeiro problema não é ele ter fugido, mas sim termos estado presos com ele.



O verdadeiro problema não está em escolher as melhores soluções, mas sim termos vivido dissolvidos em mero diluente



O verdadeiro problema não é a traição, mas sim já não haver traidores em condições



O verdadeiro problema não é saber o nome dos novos carcereiros, mas assegurarmo-nos de que não ficaram vestígios dos antigos



O verdadeiro problema não é a existência de filhos ilegítimos, mas sim os falsos casamentos.



O verdadeiro problema não é termos sido enganados, mas sim termos sido nós os fornicados e por quem afinal não alimentava senão uma provisória e estéril erecção.

Grafite

quem me dera ser Canson



Azul Cobalto, em “os não reflexos do óbvio”: Um texto absolutamente único. Em tudo: no estilo “interpelativo”, na mistura entre a espontaneidade e a profundidade, e noutras tantas coisas que eu nem alcanço. E até na inesperada ligação aos dias. Daqueles textos em que um espírito atento só se for mesmo desenrascado é que consegue sair de lá incólume.



O Pavese dizia que «Deixa-se de ser jovem quando se compreende que de nada serve contar uma dor». Esqueceu-se de dizer que a melhor maneira de juntar os anos passados com os anos futuros é no jogo entre a refracção e a reflexão. Azul Cobalto explica.( Não garanto é que não doa )
E que se lixe. Faz de conta que é sobre o amor à Pátria.

Quem é que dizia que não se devia abusar do efeito fácil das frases curtinhas?



Amor porque me maças. Porque não te limitas. A olhar para mim, e a acreditar que gosto de ti. Andas a rastejar provas. Com esse bisturi horrível. Não te dês ao trabalho. Eu não estou em demonstração: vivo em flagrante. Mira-me e caça-me. Não te queres maçar também? Fazes bem. Viveremos alheados. Mas pelo menos: bêbedos de olhar. Desfrutando apenas da estupidez da face. Ao léu. Coradinha ao sol. Moleirinha mole. A rogar abanico. A despejar para o penico. Mas quem verte águas não pode afagar mágoas. É badalhoquice. Até porque nem todo o mijo que brilha é ouro derretido. E podias-me fazer uma festa. Ao menos. Deixava-te ver o mundo deitada. Com a cabeça no meu colo. Ainda te penteava as madeixas. Para que não me beijasses só nas deixas. Como nos amores de sufrágio. Daqueles para despachar serviço. Tipo sinfonias sem adágio. Sempre reféns das contagens, como ribeiras esquecidas pelas margens. Ali só a correr, a correr, a correr.

O dicionário não ilustrado



Tenho tendência para “desefemerizador” (mas não maníaco) e para desfrutar mais das discretas continuidades. No entanto, não consigo ficar alheio ao facto de ser no dia de hoje, em que a vida política me está a fazer mais comichões que a conta, e do que eu alguma vez esperei, que faz um ano a 1ª entrada do dicionário não ilustrado. (Mas isto passa, claro)



É de facto um título um bocadinho presunçoso para o que muitas vezes não passou dum mero jogo de palavras que prestavam vassalagem aos efeitos do humor fácil, ou se arrastavam numa esterilidade pardacenta.



Felizmente, ou infelizmente, não sei, sou pouco dado a reflexões do género “nunca pensei chegar aqui, blá, blá”, blá”, ou “fui variando o estilo para sobreviver, blá, blá”, blá”, ou mesmo “não me deixar completamente condicionar pelos acontecimentos era essencial blá, blá, blá”, ou então “procurei que os assuntos não se deixassem comer pelo tempo blá, blá, blá”. Mas a verdade, verdadinha, é que fui apenas deixando correr o marfim. E assim continuará. Se Deus quiser. Goela acima, goela abaixo.



Hoje o dicionário não ilustrado auto-celebra-se saboreando, como sempre mas hoje sem grande vontade de se lamber, a podre fermentação dos dias. Nas entradas 778 a 788; por incompetência nem hoje cheguei a um número redondinho



Representatividade – Freud repesca o conceito da representação para designar a forma como os recalcamentos ocupam o espaço psíquico do inconsciente, a ciência política transforma-o, para designar como é ocupado o espaço do poder, deixando muitas vezes as consciências de boca aberta.



Poder – Estado da natureza em que o inconsciente parece um intestino em espasmo constante, e o consciente uma bexiga em permanente irritação. Colocado no divã freudiano temos de garantir sempre um autoclismo à mão, porque o aparelho digestivo gosta imenso de conviver com o urinário.



Honra – Químico que se passeia pelas provetas do poder, mas em contacto com o ar evapora-se de tal maneira rápido que, vai-se a ver, eram apenas gases emitidos pelos interesses de turno.



Cargos Públicos – Local de natureza paradisíaca, mas que muitas vezes cheira a curral quando os deuses nos lembram que somos apenas ruminantes do feno dos dias.



Respeito pelos outros – Valor obscuro de que só alguns esotéricos e bêbedos de puritanismo se lembram, porque vistas bem as coisas nenhum quadradinho dos boletins de voto tinha esse nome atrás



Estado soberano – Conceito de viscosidade variável, que necessita bastante do pó de talco da relatividade, para não fazer assar muito as partes baixas do poder, que abanam indecorosamente de ....instituição em instituição ( retive a obscenidade à conta da solenidade do dia, e fiquei-me apenas pela terminação)



Serviço público – O verdadeiro servicinho



Compromisso com os eleitores – Acto de grande magnanimidade, só comparado àquele que temos com as flores, quando arranjamos alguém para as regar sempre que vamos para uma passeata mais longa



Desencanto com a política – Destino dos parvos que, já adultos, ficaram à janela, gastando os cotovelos, pensando que as baladas dos novos mestres do engate não eram em playback, e que o versejar era genuíno. Felizmente há sempre a hipótese de voltar aos amores de adolescência.



Classe Política – Nos saraus da moda é a que anda melhor de pontas. Mas quando o ar começa a ficar abafado, os paizinhos na bancada reivindicam logo a entrada das majoretes de turno, que actuam como os novos sistemas ecológicos de arrefecimento industrial: «Purifica, arrefece, ventila e evacua»



Carreira Política – A que passa pelos apeadeiros dos "bem-encarrilados", dos "bem-encapotados", e dos "bem-encavalitados". Geralmente não pára na dos "encurralados", a não ser para abastecer, ou fazer a sua mijinha, claro.



Há é verdade....em relação às opções aqui de baixo, a minha preferida é sem margem para dúvidas: o golpe palaciano. Desde que não haja derramamento de sangue, claro. Já chega de porcarias.
As grandes opções para um grande país

Ou: do legado político de um estadista ímpar (ajudem-no, coitadinho, que ele está à rasca para conseguir fechar a mala)



Então temos:



a) O tal de golpe palaciano (mas quem manda em casa – mesmo quando estão os patrões - é a mulher-a-dias, isso já devia ser sabido por todos)



b) O tal de congresso (para o líder do país ser eleito pelos tesoureiros das distritais do PSD)



c) As tais de eleições (livres, eh eh eh, então estas seriam de uma liberdade sem limites)



d) A tal de pessoa-alheia-a-tendências-e-com-qualidades-inquestionáveis para o exercício da função governativa (só que a Misericórdia já não dá mais jackpots)



e) E que tal, ó D. Duarte, chegares-te finalmente à frente!...

O nojo dos dias. A saga continua

Das minhas coisinhas



Portugal vive hoje claramente um dos momentos de maior decadência como Estado político independente e soberano da sua história recente.



Uns quantos políticos com caderneta profissional devidamente carimbada e que passeiam os seus chocalhos amestrados por essa Europa fora, lembraram-se de destapar a tampa da conveniência e das devidas aparências que, pelos vistos caridosamente, nos preservavam da imagem pública de povo irrelevante, e disseram ao rapazito que lá aparecia de vez em quando aos almoços, apresentando-se como primeiro-ministro, que gostariam muito de o ver a fazer de mordomo no pavilhão de caça. O seu entusiamo juvenil era tanto, que seria impossível recusar face à miragem duma dispensa cheia de tulicreme, comparada com as tísicas prateleiras do seu humilde apartamento que pouco mais mostravam que umas escanzeladas ferreirinhas com leite.



O rapazola recém-casado e deslumbrado com uma amante supostamente mais experiente, deixa “mulher grávida” e “ala que se faz tarde”. (como já vi alguns, mas esses se fossem a sufrágio eu enfiava-lhes com o boletim de voto bem enroladinho pelo cu acima)



Raramente o poder político doméstico desceu tão baixo. Raramente o desprezo – olímpico ou não – pelo poder político foi uma opção tão válida. Quase apetece dizer: abençoados os corruptos, abençoados os que trocam votos por frigoríficos, abençoados os demagogos de feira.



E não me lixem: Eu quero lá ser ouvido! Eu quero é que não se macem comigo. Eu exijo é, isso sim, reforma antecipada já!



E para espanto meu ainda sou obrigado a ouvir na televisão que o tal de rapazola foi a Belém pôr condições para aceitar. Não! Eu devo mesmo ter ouvido mal. Mas sendo verdade, podes voltar Ramalho Eanes, podes voltar Guterres, sei lá, podes voltar Américo Tomás com a Gertrudes e tudo, estão todos perdoados.



Arrastava-me eu neste estado na hesitação entre desprezar liminarmente estes cabrões e nem escrever este texto, ou então começar a mover-lhes uma marcação tão cerrada que eles haveriam de me desejar a morte, mas foi quando olhei para os meus filhos e decidi ir arejar a mona.



Devia estar em tão bom estado, que para arejar a tola fui buscar a correspondência do Dostoievski (enquanto o mais novo andava de bicicleta, topem! E cada curva, cada malho, para ajudar). Pensei naqueles anos em que o russo andava a fugir das dívidas rodopiando “também” de lugar em lugar pela Europa. O tipo andava a acabar “O Idiota” e reparei que escrevia isto desde Florença numa carta a Apolon N. Maikov (poeta lírico) em 23 de Dezembro de 1868: «Se “O Idiota” tiver leitores, eles ficarão certamente estupefactos com o fim; mas depois de alguma reflexão eles compreenderão que era necessário terminar assim» (1) Ora pois, nós compreendemos, DBarroso, tu talvez também tivesses mesmo de “terminar” assim, mostrando o que eras desta forma, mostrando de forma inequivoca o que valem alguns políticos. É então que, qual reflexo condicionado, dirigido por um neurónio invisível, vou ler o que Robert Walser escreve n' "A Rosa" a propósito deste romance, e recolho: «Não tenho absolutamente nada de idiota, sou pelo contrário, sensível a tudo o que seja racional; lamento não ser herói de um romance.» É o meu lamento também. Só que sobre não ser idiota, tenho pena de não poder dizer o mesmo. E sobre uns gajos andarem a fazer de nós idiotas: estamos conversados.



Procurando fugir deste enredo a que me forçam, fui ler uns blogs. Escolhi só blogs de mulheres ( acho que não digo mais "gajas" até ao Natal), fazendo jus à análise do Bruno, e reparei na desassosegada (o seu a seu dono) que a exposição do Richter terminava hoje. Eu por acaso acho que ele é um homem que não lida bem com a cor, mas nos dias que correm, isso é uma questão de ridícula importância. (mas o que é que fazem aqueles lilases nos quadros abstractos, ó pázinho). Bem, para meu espanto consegui mesmo ir ver.



O meu estado de déficit bucólico deveria ser tão grande que passei minutos sem fim – caso raríssimo - a olhar para o quadro “ Casal de namorados na floresta” de 1966 (se bem me lembro). Mas o inconsciente amestrado funcionou e deu-me um beliscão mental. Ainda fui a tempo de ver um bocado do documentário que estava a passar (costumam ser uma seca insuportável, mas eu estava muito sensível, e nessas alturas papa-se de tudo), e apanhei a parte em que ele falava dos seus “problemas” com a nitidez. O sacanita usa aquela técnica de passar a trincha seca por cima do quadro enquanto está húmido e faz-lhe aquele efeito de desfocado.



Aí estava a solução. Vou aproveitar. Passo a trincha seca sobre esta merda toda enquanto está húmida, e pode ser que estes políticos para lá de manhosos ainda me pareçam príncipes da Renascença. E que se foda. A opção é mesmo o desprezo.



Agora há que ir ver mas é bola. Felizmente não perdi a noção da hierarquia das coisas da vida. Eu ando a escrever cada coisa, caraças.



(1) versão livre de “Correspondence de Dostoievski“ – Vol III, tradução para francês de Nina Gourfinkel para ed. Calmann-Lévy em 1960, pag. 280
Não posso estar sempre a tratar de assuntos sérios.

Vou ter de me passar. Mas só ligeiramente.



Esta curiosa, ou caricata, ou rocambolesca situação dum tal de DBarroso, que parece ter sido primeiro-ministro durante dois anos (pelo menos é o que diziam na televisão nos intervalos da Casa Pia) e agora (se calhar durante os penalties ficou com medo de não irmos às meias finais) apalavrou um lugarzito no éden Bruxeliano, está a alimentar o normal corrupio de paroquiais indignações e certezas.



Por acaso esta hipótese de mudança de ares do tal DBarroso, deu para me lembrar duma clássica paronímia do grego: entre tropos (modo de ser, carácter) e topos (lugar). Julgo, no entanto, ser Séneca que acaba por elaborar mais sobre esta “dicotomia” dizendo que os homens para se afastarem dos problemas devem é mudar de atitude, procurar transformar-se, em vez de mudar de lugar. Deviam, dizias bem, deviam. Mas isso eram os homens, não os insectos que apenas souberam varejar-nos a sopa durante uns tempos, e que agora só podem é mesmo ir-se sacudir para o cocktail de marisco do casamento do lado.



A atitude de DBarroso acaba por demonstrar que não tivemos um primeiro-ministro durante estes dois anos mas sim um mero funcionário público, que aparentemente sabe falar línguas, e que viu ser-lhe reconhecida a capacidade de ser absolutamente tão domesticável que até pode ir para a frente da comissão europeia. Aproveitará esta mudança de ares como qualquer ave tola e pavoneante que, desde que tenha um poleiro canta o que se lhe mandar, nunca chegando a produzir nem uma porra duma canja em condições.



Aqui e agora, quaisquer valores e argumentos de politica contextual, inevitáveis claro, mas muitos deles mais uma vez motivados pelos meros sentimentos anti-Santana, são irrelevantes face a este novo sinal de absoluta falta do tal “sentido de estado”. Encapotado num dos maiores parolismos políticos dos nossos tempos que é falar da honra para o país em ser assim representado no tal “lá fora”, o que vemos é apenas um tropos de merda a ser atraído para um topos de merda também. «Animum debes mutare, non caelum». Mas o gajo sabe lá o que isto quer dizer.

Eu para já o que sei, é que esse tal de DBarroso deve é mesmo mudar de ares e rápido. Seja para a comissão europeia, seja para porteiro dum qualquer aquário de peixes destinados a caldeiradas. Só que, como Presidente da Republica também não sei se temos, olha...safam-se as bandeiras e a bola. Ao menos tu ficaste Scolari. Estás perdoado. Afinal não é a tal de democracia que se faz com os que estão, isso é o futebol.
Ah! e claro...

Se eu fosse de esquerda o meu ídolo seria o JMF e o seu Terras do Nunca. Mas olha que o teu template agora ficou com um ar distinto, sim senhor. Parabéns ao blog com os “ovários” mais interessantes da blogosfera portuguesa.

Anatomias em pele de laranja. Chilli season



Eu já sabia que a política era gira. Não sabia é que era tanto. Deve ser por ela ter finalmente aderido ao fio dental. O verdadeiro fio da meada da política encontra-se definitivamente no sítio onde as costas mudam de nome. E como nós já sabemos que os políticos viraram as costas ao povo, haverá o dia em que este não parará de rir de tanto festival de celulite. A democracia é aquela écharpe que de vez em quando se usa para tapar as mazelas. O nózinho para prender deve-se dar ali na zona da anca, para não ferir as famosas instituições democráticas. Sim, de lado, para não arranhar muito, mas já não evita a fricção das coxas a roçarem umas nas outras. O povo é que já se avia com antecedência de vaselina. Deslizemos pois.

Eu cá sou pró miscuidades. E estou com os nervos em franja.

Bola e política. Claro. (logo se vê depois se ainda aparecem moças jeitosas e outras religiosidades afins).



Eu já não sei se o Scolari é bom treinador ou não; eu já não sei se o DBarroso tem mesmo é de desamparar-nos a loja, agora que o brasileiro reza melhor que aquela andorinha que ainda esvoaça em SBento, lá isso reza. E remodela melhor, isso a olhos vistos! Sabe agarrar-se ao que tem, sem miserabilizar, sem enfarilhar muito o discurso, e até pode fazer de nós alienados, pode, mas não faz de nós parvos. DBarroso e o seu governo reduziram-nos a meros dependentes de bola, porque, de facto, nós não queremos nem pensar que quem ganha daquela maneira épica à Inglaterra, depois pode ser governado por quem é desprezado pelos deuses ou pelos druidas.



(Também gosto muito daqueles que se dedicam a esclarecer-nos que a selecção nacional não é o país, e que é somente uma selecção de futebol. Ficar-lhes-ei eternamente grato pelo esclarecimento; foi um aparte)



Bem, mas há que saber então equilibrar e dar a volta a esta coisa. Penso que precisamos é duma mulher gira, modernaça, mas piedosa, à frente dos destinos da nação. Alguém que faça o pleno, que também goste de bola, claro, mas que enfeitice as multinacionais, que desfaça de charme a comissão europeia e os ponha a babar desculpas por nos estarem a exigir contas limpinhas, que faça o Papa vir-nos visitar mês sim mês não, que sejamos convidados para as missões espaciais a Marte, que convença os chinocas a subirem os preços, eu sei lá.

Precisamos duma mulher-de-estado de arrasar. Com um olhar abrasador, com um coração de nos deixar a todos abananados, com um regaço fofinho e benzido pela divindade, e pronto, arrisco, que nos saiba beijar quando a ternura for o que realmente faça a diferença.



Mas depois há uma coisa que é muito importante dizer agora. A mulher possui um poder que é determinante para o sucesso: o poder de gestão da sua franja. Só uma mulher sabe retirar todos os proveitos duma franja. Ora tudo esconde, ora apenas dissimula, ora nos acanha, ora nos estimula; ora a puxa para trás, deixando-nos o seu olhar virginal à mercê dum desejo fresco de rapaz, ora a corta repentinamente, deixando-nos estupefactos e hesitantes, ora a sopra com violência parecendo uma gaiata irrequieta e provocadora, ora a transforma numas ripas disformes e assimétricas que nos descontrolam as contas e as éticas, ora a traça cruelmente direitinha distribuindo frieza por todos os quarteirões, ora a encaracola em jeito de boneca caprichosa (já não gosto tanto, mas quem sou eu, claro). Chiça, o poder que uma franja tem.



E um homem para conseguir fazer tudo isso tem de se socorrer de recursos infindáveis. Alguns roçando mesmo o ridículo. E Deus não apara esses golpes, claro. Deus acolhe os parvos no seu reino, mas isso não implica que tenha de os iluminar cá em baixo. Infelizmente para nós, se calhar.

Quem Ricardo ri melhor



O pobre do Pavese logo depois de ter dito aquilo sobre as mulheres adoradas, estica-se e diz que a «recompensa por termos sofrido tanto é, depois, morrermos como cães». A pior sina que nos pode trazer uma situação é não podermos ficar a dizer dela nem muito mal nem muito bem. Hoje driblámos uns quantos traços da nossa sina. Com bandeiras e tudo. Não morremos como cães. Pavese, podes continuar a dormir.
Eu blogador me confesso: o meu sonho era passar a vida apenas metendo-me com os outros. Mas não posso. Parece mal.



Muito obrigado pelos parabéns do aniversário deste blog à Alexandra ( se eu fosse o Guilherme Tell andava com a cabeça à nora) , à Charlotte ( a minha benzedora oficial) , ao JoãoMF ( de ti já falo), à m. ( estou sem conseguir dizer nada de jeito, e ela é muito exigente), à Margarida ( já lhe mandei a boquita por mail), que são os que eu vi..., aos que por timidez não se chegaram à frente agradeço também, e é verdade, agora reparo, ó JMF estás no meio de 4 lindas mulheres, não me digas que as conheceste na tal ida ao ginecologista; isto está a pedir, ó Bruno – e parabéns para ti – uma análise profunda das que só tu sabes fazer ( como ele ficou amuado comigo não sei se terei mesmo de implorar)



Agora não sei porquê mas sinto-me menos à vontade para usar a palavra “gajas” ( deve ser porque sou muito sensível). Vou ter de perguntar à Dra Girassol que alternativas terapêuticas tenho. “Miúdas” era uma hipótese, mas é uma palavra que só uso com pessoas que me são muito chegadas. Estou num impasse (mas estejam descansados não dá para escrever um livro)



Não se deve pôr link nas meninas/senhoras, porque acho que isso não combina de todo com a moda deste verão.
paAgora é que são mesmo só parvoíces.

- Agora ?



O C. Pavese era um daqueles "artistas" que gostava que me passassem ao lado. Não me interessam os homens que não sabem gerir as incompreensões do amor ( sempre a fazer fretes à decadência da alma), nem os que se matam com comprimidos ( sempre a fazer fretes às farmacêuticas) , nem os que alimentam ou aspiram por um repetitivo renascimento ( sempre a fazer fretes ao fazedores de calendários). Mas houve sempre uma coisa que me seduziu ( às vezes dolorosamente - «coitadinho»): ler aqueles de que não gosto “às primeiras”. Fui fazendo isso com este italiano angustiosamente chanfrado. E não é que até com alguma- comedida, pronto – delícia interior! O gajo escreve-me isto assim nos “diários”, e sem pedir licença : “ É incrível que a mulher adorada chegue ao ponto de dizer que os seus dias são de um vazio torturante, mas que não quer ouvir falar de nós”. Não, não é o que estão a pensar ( mas porque é que eu acho que estariam a pensar alguma coisa?), o que se passa é que o equilíbrio entre a alma cheia e a alma vazia é um must dos nossos tempos ( para não estar sempre a dizer “da nossa condição”). Só que eu também julgo que este é um desequilíbrio típico do Feminino. O cheio e o vazio estão muito próximos. Nunca estão sossegadas com o ralo ( é pá, se calhar não devia ter dito isto) e vivem num constante tormento de preenchimento. C. Pavese olhando para a sua dor acabou por pressentir a dor delas. E acabou por me mostrar que afinal não há almas complicadas, existem é almas que são formulários chatos de preencher, e nós andamos sempre atrás dos prazos. A salvação está na Burocracia.
Por causas das tosses, isto hoje é dedicado aos espanhóis que estão, qual niños, a lamber as feridinhas junto das suas Macarenas



Além disso, está a ficar provado com este europeu que o futebol é coisa de gajas. Só elas falam de bola com propriedade, com erudição e com ligações tão sofisticadas que fazem o Deleuze parecer um vendedor de aspiradores. Por isso eu hoje decidi dedicar-me às crianças – sim, alguém tem de ficar a tratar delas – porque sinceramente não tenho pedalada para vocês, ilustres divas da bola, Gabrielas Alves do meu coração.



A análise do valor (espiritual ou não) da chamada “vida de infância” acaba por poder estar rodeada de algum “lirismo” exagerado. Eu pensava até que se tratava antes duma questão de eficácia para a alma, mas agora vejo que é uma clara adaptação da política pura. E hoje, sem me poder referir ao Montaigne porque ele não percebia nada de putos, o dicionário não ilustrado vai ao jardim-escola nas entradas 769 a 777; (aish!, e é logo hoje que chego a este número que cheira demasiado a cabala e a malabarismos afins)



Ingenuidade – As crianças usam esta sofisticada camuflagem que transforma a previsibilidade num – por vezes encantador – pesadelo. Em política chama-se a isso “fazer dos outros parvos”.



Simplicidade – As crianças são alheias ao fenómeno da matricialidade do mundo, e como no jogo das dimensões só contam até três, sabem que uma boa perspectiva não vale nada ao lado dum gelado de chocolate. Em política chama-se a isto “carreirismo” e “sobrevivência a qualquer custo”



Choro de criança – Estranha eloquência que põe a cabeça em água aos pais, ao ponto de estes se sentirem um mero aquário mal filtrado. Em política chama-se a isso “chantagem eleitoral”, mas se quiserem uma palavra nova: “quem-não-chora-não-mama-ismo”



Memória interesseira – É o mais alto grau de perfeição da memória selectiva, que utiliza apenas o botão on/off como nos amplificadores de som mais minimalistas. Em política isso chama-se “política”.



Abandono – Saber entregarmo-nos nas mãos dos outros é uma bênção só ao alcance duma alma que vive um complexo de superioridade estrutural (agora não tenho tempo para explicar) também próprio das crianças. Mas em política isso transforma-se em “clientelismo”, ou se quiserem uma palavra nova: “empandilhamento”



Escândalo – As crianças são imunes a esse empecilho, vivem o “cagar e andar” duma forma quase metafísica. Em política isso chama-se “não ter de prestar contas” ou, se quiserem uma palavra nova: “quessefodismo”



Incapacidade para subentender – As migalhas caírem em duche para debaixo da mesa, é algo que não traz qualquer confusão epistemológica a uma criança: o que está “sub” é apenas o que não atrapalha ao que realmente interessa, que é o que está “sobre”. Em política isto chama-se “pragmatismo”, ou se quiserem uma palavra nova: “coça-só-até-não-fazer-sangue-ismo”



Inconsciente em formação – Sim, porque o consciente, está mais que visto, é que ainda está por provar que existe. Filha da alma em fusão, a criança concorre com fortes hipóteses de ganhar para o concurso do arquétipo puro. Em política isso chama-se: “um gajo ajeita-se a tudo”



Amuo – Desintegração, chamada de atenção, mimo em excesso, falta de educação. Mas muitas vezes é um dos abençoados momentos em que os vemos quietos. Em política isso chama-se “período de reflexão”, ou se quiserem uma nova: “estão-se-a-borrifar-para-mim-ismo”

Como ninguém lê este alçapão, a Dra Girassol mandou-me mesmo fazer um check up, e os sacanas, face ao quadro, internaram-me e puseram-me logo a soro. Agora o tratamento é todo misturado, às pinguinhas e pela veia abaixo



Complexo místico-vitamínico: unhaca, gajas e blogs



Acabou há uns dias o mês de Maio. Mês de Nossa Senhora. O que eu queria mesmo era que no dia em que me encontrasse com Ela, tivéssemos uma converseta mais ou menos assim.



Eu – Posso entrar?



N.S. – Filho! Olha quem é ele ! Anda cá meu malandro.



Eu – (Isto começa bem...Ela reconheceu-me...deve ser pelas piores razões...Vou ter que dar a volta a isto por cima, caraças) Aqui estou, nas suas mãos...



N.S. – Olha lá, aquelas piadinhas que tu andaste a endrominar, nem todas caíam muito bem cá em cima, sabias?



Eu – Mas sabe...eu às vezes descontrolava-me, sabe como é, torna-se uma coisa vertiginosa e...



N.S. - Sim. Sim. Não precisas de te justificar. Eu sei do que a casa gasta. E também já tive de safar imensos “artistas“ com a mesma mania que tinham muita piadinha...e muitos nem tinham piadinha nenhuma...e a outros até tive de lhes repintar o cabelo antes que o meu Filho os visse naqueles preparos...



Eu – Mas não me diga que não se riam com coisa nenhuma...



N.S. – O nosso problema é que como no Céu não há “tempo”, e como nós já sabíamos o que tu ias dizer, o efeito surpresa desaparecia. Desculpa lá a desilusão.



Eu - Ó Mãe do Céu, não tem nada que me pedir desculpa. Eu até só tenho é que agradecer que tenha vindo falar comigo, e preocupar-se e...



N.S. – Então tu achas que uma mãe deixava assim um filho apeado, neste labirinto da prestação final de contas! Eu andei sempre de olho em ti, e até expliquei muitas das tuas piadas aqui à rapaziada, porque aqui há gente que passa o tempo obcecada a brincar às charadas filosóficas com o S. Tomas de Aquino, e que ainda continua tão viciada na discussão sobre o ser e a essência que eu fico parva.



Eu – Se calhar dão-se mal com as evidências, e gostam de alimentar a dúvida para mostrar que se esforçam muito por acreditar.



N.S. – Também não sejas assim. Eu topo-te a dar aquele ar de que és muito duro e irónico com os outros, mas depois já te vi muitas vezes a amanteigares-te na conveniência.



Eu – Ó Santa Mãe não te escapava nada, mas sabes como é no mundo dos negócios...É pá agora é que estou ver, então as alusões às bodas de Caná devem ter sido aqui muito bem acolhidas não?...



N.S. – Se eu levasse a peito tudo o que tu dizias, mais valia teres trazido um ar condicionado portátil, se é que te deixavam entrar com ele ali para aquele empreendimento que tem o senhor encarnado e de chifres à porta...



Eu – Foda-se, aquilo ali é mesmo o inferno? Ai desculpe saiu-me...



N.S. – Sem prejuízo de anotar o uso dessa palavrinha indecente aqui no caderninho, porque faz parte do regulamento, faço-te notar que já vi aqui uns anjos a usarem umas palavras dessas no meio dum jogo da bisca (é o que fazem quando o movimento está mais fraquito), e já ouvi cada coisa ao Sto Agostinho no jogo de Scrabble que até corava a coitadinha da Sta Teresa, que ainda hoje está de olhos extasiados a olhar para o meu Jesus. (aqui até gozam com ela dizendo que é a Solnada do pós idade média)



Eu – Bem, não se de pode dizer que também não sejam dados à brincadeira...nem sabe o peso que me tira de cima. Eu andava com isso atravessado, principalmente porque desde que comecei a escrever numa parvoíce dum “Desfazedor”, eram umas atrás das outras.



N.S. – Nós reparámos nisso e ...



Eu – É pá, vocês liam mesmo aquilo????!!!



N.S. – Temos de ler tudo! Até o Prado Coelho e o Abrupto!



Eu – Então mas o inferno não é ali ao lado?



N.S. – Não te estiques com as piadinhas, porque já estás na corda bamba e um soprozito meu leva-te desta para melhor



Eu – Vê...é que eu não me controlo mesmo, isto deve ter a ver com a natureza humana, sei lá, com essa coisa da inevitabilidade, com o corpo ser fraco, com o pecado original, ou se calhar a água benta do meu baptismo era de contrabando, e...



N.S. - Também já demos para esse peditório. Olha lá filho, agora cala-te um bocadinho porque acho que vai haver retoma em Portugal e eu tenho de ir ouvir as notícias



Eu – Não me digas que já andam a fazer milagres nas tuas costas?



N.S. - É que aqui agora concessionámos à iniciativa privada os milagres mais difíceis



Eu – Então o Juízo final agora também deve estar entregue a algum grupo multinacional? Vejam lá se aquilo cai também na mãos dalgum chinoca, dos que agora estão por todo lado...



N.S. - A conversa está a desviar-se, já sei que és muito bom nisso, mas nós estamos aqui é para tratar do teu caso.



Eu – (Isto aqui, está visto, não vai com duas balelas...) ó Santa Mãe mas eu já sou considerado um “caso”? (Isso não é muito bom sinal) Repara que eu nunca pus sequer uma mulher em trajes menores lá no blog, e sempre que me referi a elas foi no maior respeito. Até já me chamaram «bendito menino»!



N.S. - Olha lá, essa coisa de pensares que os pecados têm todos a ver com o sexo demonstra uma grande estreiteza de alma, não?



Eu – (Aish...granda boca. Agora até aqui levo baile também) Ó minha Mãe do Céu, eu não queria dizer isso, era apenas um exemplo, uma forma de expressão, é apenas a demonstração de que somos reféns da palavra e dos conceitos, somos...



N.S. - Chega filho. Não gastes o teu ranhoso latim. São estas as opções que eu consegui arranjar para ti : Passas uma temporada no Purgatório e podes escolher: Ou ficas num beco de lampiões que recitam todo o dia a Florbela Espanca, ou então ficas numa praceta com uns espíritas que se converteram à pressa e declamam a Rosália de Castro...



Eu – Ó Mãe de misericórdia, dá-me uma segunda oportunidade, eu se calhar deixei-me envolver demais por um ambiente pagão, hedonista e superficial, peço-te, até ao Durão Barroso dão mais oportunidades, até ao Ferro Rodrigues lhe permitem a ilusão dos justos.



N.S. - Bem... o mais que eu te consigo, e é porque nunca maltrataste os animais e o S. Francisco é muito sensível a isso, é voltares lá para o teu computador, e passas a escrever todos os dias como aqueles blogs que falam de Deus com serenidade e responsabilidade, apelam à conversão e à compreensão nas almas inquietas, e fomentam a alegria que deve inundar os corações peregrinos...



Eu – Ó minha Rosa Mística, ó Rainha dos Anjos, eu faço tudo mas não me peças isso, eu se for preciso até digo bem do blogs protestantes para demonstrar ecumenismo, ou cito os salmos,ou...



N.S. - Também não são necessárias lamechices, olha, em alternativa, estão-me a sugerir aqui atrás, podes abrir um "fotoblog", pões umas fotografias do nascer do sol, ou dum mar calmo e prateado, e vais inserindo pensamentos do Pascal.



Eu – Oh Estrela da Manhã, eu se for preciso até mando uma carta para o Abrupto a comentar os quadros dele, mas por amor de Deus, fotografias com textos de adorno é que não me peças!



N.S. – Pronto meu doce...eu estava só a pôr-te à prova, podes-te manter fiel ao disparate sem eira nem beira, mas tens de prometer uma coisa: não fales do que não sabes.



Eu – Então mas isso agora é uma censura radical. Assim não posso escrever sobre nada!



N.S. – Olha desenrasca-te, fala de política, porque assim nunca te enganas, tens sempre com que te entreter, e escusas de perder o tempo com gajas inacessíveis, ou a citar o Baudelaire ou o H. Michaux. E livra-te de citar o marquês de Sade, que eu bem sei estiveste quase noutro dia...



Eu – Ó valha-me Deus. É pá, o que é que o meu Anjo da Guarda tem andado aqui a fazer. O sacanita deve passar os dias na porra da bisca lambida, estou mesmo a ver.







Puro barroco tardio e decadente. Sem excitações, e sem remissões para revistas literárias

Bola e mais bola



Eu cá a mim entristece-me ver falar de bola utilizando a expressividade leviana dos palavrões. Isso não fica bem para a dignidade dum jogo que vive do cavalheirismo entre duas pernas e uma bola (se bem que possa ocorrer igualmente a troca de intimidades entre uma perna junto de duas bolas). Para já, o efeito do palavrão desfocaliza-nos da beleza do jogo, e não raras vezes nos introduz numa temática sociológica que já conduziu muitos ao inferno, onde, como se sabe, o jogo da bola é proibido e a TV por cabo também.



Temos, por exemplo, o abuso do efeito artificial duma obscenidade que à primeira vista poderia descrever luminosamente a situação futebolística em que uma bola transpõe o intervalo anguloso que se produz quando duas pernas se abrem numa posição indecorosamente defensiva, chamando-lhe “grande rata”, o que me deixa desapontado, não só porque estes bichos não têm nada que ver com as inestéticas posições de equilíbrio defensivo que os primatas utilizam, como também não foram eles os responsáveis pela gretalidade que encerra toda a feminilidade. Quando deixaram Adão perante a opção "ou vai ou racha", ele também não hesitou. Toda a bola tem direito ao seu arco do triunfo.



Dizer igualmente que um jogador em concreto “não joga um caralho” reorienta-nos para a problemática da impotência sexual que como sabemos não se resolve com terapias violentas, mas sim com o carinho que deve moldar qualquer relação. Assim, deveremos antes informar o jogador de que o afluxo sanguíneo que proporciona geralmente o crescimento e enrijecimento do seu órgão sexual deverá ser canalizado durante o jogo para o cérebro, principalmente no momento em que se está, por exemplo, de frente para o guarda-redes e marcar um golo possa ser uma opção interessante a considerar. Poderemos pois chamar-lhe antes à atenção – em abstracto - de que ele deve jogar, isso sim, com a pontaria em constante erecção. Será um conselho praticamente científico e duma humanidade que ele não esquecerá, na condição da mulher nunca vir a saber. E poderá inclusivamente acontecer que o Viagra seja um bom mascarante para a Nandrolona, matando-se assim dois coelhos.



Admito ainda que o treinador possa ser um “cabrão”, eu próprio, à atrasado, utilizei esta desbocada e despudorada expressão, facto pelo qual de imediato me penalizo contorcida e contritamente, e só não fecho o blog porque não sou dado a êxtases escrupulosos, no entanto reparo que a localização de hastes marfínicas no topo da moleirinha poderá fazer apelo à estratégica colocação das bandeirinhas nacionais, o que nalguns brazucas de bigode ficaria bem a matar. Chamar ao “nosso” treinador apenas um porta estandartes será certamente mais mobilizador da sua estima e arrepiaremos caminho na utilização correcta na nobre língua portuguesa, e no respeito pelas espécies que podem dar o leitinho com que se produzem queijos saborosos, até porque de Sabrosas estamos conversados (choninhas da porra)



O desencanto provocado pelos resultados muitas vezes desemboca na utilização da expressão “vão para a puta que vos pariu”” dirigida a toda a comitiva. É desolador chegar a esse ponto de desrespeito; a insinuação de um parto menos desejado deveria ficar escondida nos recônditos da nossa obscura perversidade, e jamais ser revelada àqueles que um dia puderam ter feito a felicidade dum alma destinada ao sofrimento e à mais baixa degradação. Recolher ao regaço materno é um direito que a todos nos assiste, e que não deve dar azo a ser confundido com recriminações que são fruto certamente de recalcamentos que ficaram com a cabecinha de fora.



De facto também não deverá ser agradável ver a nossa equipa levar um penalty no último minuto, incluindo a expulsão do guarda-redes que já de si era o suplente. Mas a expressão «estão fodidos», que pareceria apropriada, poderá ser evitada se constatarmos na lição de civismo e elevação democrática com que uma coligação que leva uma enrabadela, perdão, uma penetrante lição eleitoral consegue continuar alegre e confiante agradecendo ao povo o tempo que ainda lhe deu de descontos. A esperança é a virtude que deve ser recuperada nestas circunstâncias, e jamais nos devemos deixar levar pelo desespero que conduz ao uso de expressões sexualmente agressivas e que nem sempre revelam consentimento mútuo.



Verifico no entanto, num misto de desencanto e ao mesmo tempo de admiração pelo grau de civismo que subentende, que a expressão «são uns enconados» caiu um pouco em desuso. A ambiguidade sexual que carregava esta frase, fazendo crer que a apatia e falta de iniciativa se situariam ali entre o lavatório e o bidé, junto à caixa dos evax-ultra-com-alas ( ai como fazem falta os alas meu Deus, se bem que centrar para o segundo poste na selecção portuguesa dá o mesmo efeito que fazer uma mijinha na bandeirola de canto), foi relegando-a para alguns nichos etnográficos, sendo substituída muitas vezes pela de “paneleiros de merda” . Trata-se duma alternativa a evitar porque concentra dois vocábulos ordinários levando a inebriar-nos num leverage de abandalhamento. Este simbolismo sexual poderá ser transferido - e com ganho – para a recuperação do fenómeno do hermafroditismo, que no fundo apela à versatilidade, factor tão importante nas tácticas de hoje que privilegiam os jogadores polivalentes.



Nota editorial: A utilização de expressões de índole levemente obscena neste texto, deve-se unicamente a critérios instrumentais e didácticos, e jamais motivados por uma alma conspurcada, doente ou vingativa.
Apenas desarejando



Visto que está, que o que safou esta coisa foi o aniversário do Aviz ter sido hoje, e o bronco do Scolari lá lhe ter feito o jeitinho e posto a jogar o pessoal do FCPorto - se fosse amanhã estávamos lixados - acho que de bola estamos conversados, e agora para desopilar vou arremessar com o Baudelaire que escrevia assim no “L’ Irréparable”



Dis-le, belle sorcière, oh! dis, si tu le sais,

À cet esprit comblé d’angoisse

Et pareil au mourant qu’écrasent les blessés,

Que le sabot du cheval froisse,

Dis-le, belle sorcière, oh ! dis, si tu le sais




Ora o que é que me fez saltar para aqui, tirando o facto de não me apetecer falar de bola, a não ser para dizer que o Scolari devia devolver já todos os ordenados que andou a receber estes dois anos, e dar para um fundo de apoio a bloguistas-treinadores-incompreendidos-e–mal-pagos, bem, o que me trouxe até aqui foi a constatação da necessidade que todos temos de uma bela feiticeira, que nos mantenha o espírito sempre atento e confiante, que nos abra os olhos – muito também não, senão arregalamos - e nos tire do caminho da patada desgovernada do cavalo. Esta conversa está a levar-me para zonas onde eu não me movo bem...

Mais mon coeur, que jamais ne visite l’extase,

Est un théâtre où l’on attend


E isto,

está mesmo visto

cada um é pró que nasce.
Preguiça

Versão sem body milk



E pergunta o Terras do Nunca - «o que faz esse rebanho de abstencionistas para mudar a política?» Ora uma pergunta do JMF ( em iniciais fica mais fino) merece sempre resposta ( até porque gostei do texto dele, principalmente do «mas gramo-os»), aqui vai:



Apetece-me é dormir; mas só daquele sono que vem sem ninguém pedir. Ficar deitado, pondo o corpo de lado, segurando um livro qualquer, sei lá se é de homem ou de mulher; mas seguro-o só com uma mão, sem fazer muito esforço, e sem saber do que trata, o que importa é que as folhas passem, e não me macem, nem me torrem a energia que andei a poupar de dia, para depois poder dormir, indo atrás do corpo que quer fugir . Que raio de posição, só dá para ler as ímpares, azar, ao menos não está de pernas para o ar, leio as pares quando estiver virado para a janela, e de bónus ainda vejo o Tejo, mesmo sem caravela. Vai-se é perdendo algo da história, pode ser bem verdade, e nem se estimula a memória, mas vai-se amolecendo a vaidade; e desforro-me: vou fazendo do tempo mera escória, e alimento só a saudade. Que merda de livro, que merda de colchão, e já me dói a mão; «porra, nem as ímpares, meu cabrão!?» Olha, agora passaram três folhas de enfiada, vou perder o fio à meada, mas que se lixe o enredo, nem me estava a meter medo; preciso é que a outra mão fique sempre livre, para esgrimir, para traçar o meu porvir, para agarrar o meu destino, lindo menino, ou para me coçar, que o calor está a apertar; não se consegue dormir com a comichão, nem com a bexiga cheia feita um balão, que merda de corpo pagão, sempre a pedir amaciador, e terapias de fornicar sem dor. Mas afinal é tão bom ter o corpinho de lado, não ter de enfrentar a realidade, viver apenas encaixado, e com a espinha à vontade. Ou será esta indolência uma doce mas pecadora insolência, ou antes um desleixo escondendo incompetência. Mas então um livro arma-se em dama ofendida só porque vê uma página esquecida? Esquecida por quem o segura só com uma mão, e deixa as folhas irem caindo, adormecendo ao ritmo do paleio que o escritor foi parindo, fazendo votos de adormecer antes que a história o atormente, ou fique com o braço dormente, e não possa votar, em consciência, claro, haja decência, até porque pode já não haver paciência.



Toca o telefone. Dizem-me que é a Democracia. Gaja chata. Ah! vou mandar dizer que não estou. Ela que se amanhe sozinha.
Eu cá sou pró miscuidade



1.O momento eleitoral acabou por mostrar igualmente o “estilo” que separa a Espanha de Portugal. Enquanto que “lá” parece que são precisos atentados sanguinários e terroristas para condicionar as eleições, para “cá” basta levar dois secos dos gregos e haver um bocadinho de sol. O governo andar à nora é apenas um pormenor.



2. Os primeiros comentários pós eleitorais da coligação DBarroso & Portas poderão ficar nos anais como os comentários mais...anais mesmo. E cheira-me que a vitória eleitoral está ao alcance de qualquer um desde que Scolari não esteja na lista, e do outro lado existam Figueiredos e Arnaults. E vendo bem, estes dois podiam perfeitamente ir para adjuntos do primeiro, pois pelo mesmo não se estragavam duas “famílias”. A promiscuidade, fica assim demonstrado, é um valor seguro e a preservar.



3. Pronto meu Deus já chega, já sabemos que somos merda, já sabemos que o FRodrigues passou um ano difícil, já sabemos que se calhar somos todos evasores fiscais, já sabemos que o português mais ilustre (Mourinho) até teve de emigrar, já sabemos que o Mário Soares ainda vai dar muitas entrevistas, mas agora vê lá o que fazes na quarta-feira quando jogarmos com os russos, pois isso é o que realmente importa.



4. Só meia dúzia de entradas do novo dicionário não ilustrado para não se ficar com a ideia de que isto é um local de brincadeira.( 763 a 768)



Eleições – Momento absolutamente necessário e determinante para quem é eleito.



Abstenção – Um dos poucos comportamentos que garante taxa zero de parvolémia, mesmo que nos tenhamos enfrascado de direitos cívicos antes de soprar para o balão.



Voto nulo – No fundo o que é cada um dos votos se atentarmos na esmagadora evidência algébrico-estatística



Elevação democrática – Espécie de guindaste que transforma um povo anódino numa linha de montagem que produz incompetentes com carimbo de produto certificado, e com garantia de 4 anos desde que não se agite muito a embalagem, e se guardem num lugar seco e fresquinho



Lições eleitorais – Momentos em que todos os políticos parecem “Tonecas”



Resultados eleitorais – Milagre com o qual uma reles soma de cruzes consegue pôr ignorantes a tirar logaritmos de cabeça
Hoje faço parte dum rebanho que precisa duma sessão de psicanálise Junguiana patrocinada pela revista xis, afagada por uns carinhos da Madre Teresa (na impossibilidade serve a Mª de Lurdes Pintassilgo), e dum enquadramento histórico feito pelo Hermano Saraiva.



Nós que poderíamos ter um alter-ego assim jeitosinho, feito à base de N. Álvares Pereiras e afins, acabamos mas é por construir com aquela merda da selecção uma espécie de ego-de-alterne. Uns apaneleiradozinhos à volta dum brazuca que tirou um curso de psicologia de favela, e que galvanizam a musculatura a ouvir o Roberto Leal na camioneta, e que pedem para andarmos a abanar bandeiras e cachecóis, estão mesmo é a pedir que se lhes enfie o pauzinho das ditas pelo alter-rabo acima. Aquele velho de bigode a quem convencionaram chamar treinador porque foi campeão do mundo com o Ronaldo, o Rivaldo, o Ronaldinho & Cia, sabe tanto organizar uma equipa de futebol como eu sei fazer cerveja num lagar de azeite. Andámos feitos parvos a pensar que até agora tinha sido só a brincar, e que eles não podiam ser assim tão maus quando fosse a sério, mas grande porra: quando é a sério os gajos ainda são piores do que a brincar.

Na próxima operação do “pirilampo mágico”, aqueles “bichinhos peludos” deviam ser produzidos com os pêlos do bigodinho do cabrão do Scolari: arrancadinhos um a um. Por cada berro que ele desse o povo gritava hossana, e jurava – de joelhos - nunca mais apoiar uma selecção, nem que ela jogasse contra uma equipa vestida com a bandeira de Castela e que todos se chamassem Conde Andeiro.

Só me lembro do H. Michaux quando dizia «é raro encontrar alguém sem que eu lhes bata. Há quem prefira o monólogo interior. Eu não. Gosto mais de bater». Pois a mim de facto, as palavras já me estão a atrapalhar, e só me apetece dar-lhes um arraial de porrada. Se o inconsciente colectivo do Jung existe mesmo, o melhor é irmos todos para a Zara desanuviar, e gastar dinheiro a comprar fancaria, para quando o borboto começar a aparecer ninguém se poder ficar a rir de ninguém. E não desanimemos, tanto trapo verde e encarnado há de fazer umas boas esfregonas para limpar a merda que esta equipa de futebol, que dizem ser - promiscuamente, note-se - de “todos nós”, anda a fazer. E se me dizem mais alguma vez que acusaram a pressão em demasia, eu enfio-lhes com a panela do cosido pelas trombas abaixo.
Praticamente só bola

1.

Não me lembro da primeira vez que vi o mar, não lembro da primeira vez que vi uma mulher como mulher, não me lembro da primeira vez que pisquei o olho, não me lembro da primeira vez que menti, não me lembro da primeira vez que comi ovo estrelado, não me lembro da primeira vez que pensei, não me lembro da primeira vez que marquei um golo, não me lembro das primeiras vezes, gaita para isto. Para que serve a memória se não nos lembramos das primeiras vezes.



2.

Só que eu também não me lembro quando vi tulipas pela primeira vez, mas lembro-me quando as vi a última vez: foi como se tivesse sido a primeira. Será isto a vitória do coração sobre a memória. Não estava à espera, confesso.



3.

(E corrijo-te: Se é assim que atiras «o gelo da tua racionalidade» em «confronto contra o papel», se é assim que «matas emoções», se é por isso que “dizem” que és «cobarde na tua coragem», deixa-me que te diga: abençoada «docilidade insolente»)



4.

Nem todos os quadros de Fontana representam golpes rasgados na alma, nem todos os de Klein são bocados de lágrimas derramadas em Canson; Nem só as bandeiras revelam uma pátria, ela também se revela na ansiedade por causa dum jogo da bola, no simples desejo de ganhar aos “outros”. Hoje apetecia-me ser zarolho, e nadar só com um braço, segurando no outro um cachecol verde e encarnado, mesmo que tudo se esfume daqui a umas horas, ou dias, ou semanas. É essa a nossa condição, e condição é diferente de fatalidade, como pensar é diferente de ir atrás das ideias.

Entrada atrasada para a última dose do novo dicionário não ilustrado (nº 762)



Simpático – O que se limita a fazer a ponte entre a sinceridade e a pantomina.

O mundo da estética mostra-nos a existência de conceitos banhados duma ambiguidade quase indecente. Vendo bem, acabo por preferir que o dicionário não ilustrado seja meramente decorativo, apenas prestando vassalagem às donzelas da ornamentação. Entradas 752 a 761.



Interessante – É o que fica a meio caminho, ali especado, confiando na sedução que provoca a mera possibilidade ou a indecisão. É um simples conceito de passagem, feito para vendedores ambulantes que nunca voltarão para responder e dar a cara pelo material defeituoso. ( « gostou?»)



Expressivo – No fundo, só o seremos em condições se tivermos sorvido antes do copo da ingenuidade. Mas depois poderemos ser facilmente substituídos por uns recortes de papel de lustro.



Decente – Sermos aprumados e limpinhos é uma boa característica em qualquer desfile paroquial. Não garante um entusiasmante odor natural, mas não é nada que não se consiga resolver com um pindérico spray de madrinhas empenhadas.



Autêntico – Quem tem o secreto sonho de ser o dono do selo branco. Mas que pode ficar limitado a fazedor de carimbos de empreitada.



Capaz – Uma espécie de jeitoso, mas com as unhas limpas, e eventualmente sabendo fazer o nó da gravata. Não trazer as ideias com a “fralda de fora” é condição sine qua non.



Sensibilidade (com) – Quem apenas quer fazer sentir, não é merecedor do seu parir. O sentido é uma convenção para obcecados com as regras do trânsito. Correremos o risco de ser uns meros ofertantes de Impulse numa passadeira para peões.



Honesto – É o que importa verdadeiramente, pois no final descobrimos que somos meros comissionistas de mercadoria alheia. Só que muitas vezes esta característica quando se revela é porque já há alguém a viver à conta e à grande com a nossa comissão.



Imaginativo – Aquilo que nos deixa na dúvida entre sermos o buraco da fechadura espreitando para o que é novo, ou sermos o desconsolo do que é meramente evocação, recuperando de forma atrasada algo que já existe. A verdadeira âncora está na imitação, quem não repara nisso anda a remar à toa.



Razoável – Forte candidato a asco mor dos epítetos. Geralmente vem acompanhado com salada lúcida, mas já temperadinha com coerência exprimida.



Raridade – O que não pode ter o emoção de ser açambarcado. Limita-se a ser guardado para ir gerindo o bafio.

“... e jamais vos tornarei a ofender”



Uma das coisas mais giras que se nos é dado a apreciar são jornalistas a fazerem actos de contrição. Geralmente usam genuflexórios muito almofadados, e saem a correr ainda com a água benta a pingar.

Wordofilia



Esta coisa da hipervalorização do “silêncio” como técnica depuradora da nossa “condição de consternados”, continua a deixar-me próximo do incómodo – hoje – estado de pura risibilidade. Os minimalismos “possidónicos” das imagens despojadas de textos, revelam geralmente incompetência. Esta secreção que convencionámos chamar palavras, serve é para ser espremida, e se não o conseguimos é por mera debilidade: não o disfarcemos confundindo-a com um sofisticado estado de alma. Eu até acho que já disse isto aqui, mas reforço: o silêncio como estado de pureza mística não será uma total fraude, mas roça-a. É comovedor fazer das fraquezas forças, mas topa-se à légua. Um homem a fugir e a desencantar-se do seu palavrejar é como um cavalo a ter medo de dar coices, parece um Bambi ou uma Lassie. Não abusemos da nobre e falsa erudição feita parcimónia verbal, pois corremos o risco de viver apenas nadando bruços.

De facto, a palavra feita circunstância, produz mais felicidade que a palavra feita conceito. Banalizemos as palavras antes que elas o façam connosco. Abençoados os prolixos. Ámen.

Se eu não falasse hoje desta gaja nem era homem nem era nada



O melhor quadro do mundo e arredores, a milhas de todos os outros e dando baile aos que se querem comparar é a “Alegoria com Vénus e Cupido” do Bronzino. Apetecia-me mas não me vou pôr com interpretações sobre as simbologias e as obscenas perversões que o quadro carrega; dou isso de barato (coisa que o quadro não deve ter sido porque aquele azul ultramarino era o pigmento mais caro da época) e retenho-me antes na sua óbvia artificialidade e "porcelanidade". Quando se vê o joelho de Cupido a encaixar-se na “dobra da coxa” de Vénus, eu quero lá saber quem é mãe de quem, e só me sobra lascívia, disfarçada de ternura para não ofender os olhares paralelos. Não aprecio os naturalismos e gosto das óbvias encenações. Das fabricações sem fábrica. Da política como mero teatro declamado (ia dizer do amor como fotonovela, mas também já achei excessivo). Este quadro hipnotiza-me um bocadinho mais que a conta, tenho de reconhecer, e a Vénus até nem é especialmente gira – as mulheres nunca ganham muito em perfeito perfil, também é certo. A explicação, pensava eu, estava no brilho porcelanado da brancura das suas principais figuras. Mas hoje, por outras razões, acabei por confirmar que não poderá ser isso.

Descobri que me seduz muito mais uma serena cumplicidade do que a excitação dum deslumbramento. Prefiro um doce “prender” a um súbito “surpreender”. Linda frase, sim senhor, nem um creme amaciador ajudava a vender. E não foi Vénus, nem Cupido, quem mo revelou. Bronzino, filho, estás a perder qualidades, e qualquer dia ainda estou a dizer bem do Claude Lorrain. Se começarem a notar algum bucolismo neste tasco, pedia encarecidamente que me avisassem. Se vier acompanhado do lirismo decadente (ou mesmo exuberante), em verso livre ou não, então dou-vos procuração irrevogável para o encerrarem. E esta conversa interessa a quem, ó estúpido. Felizmente a arte também está em crise, e eu agora até trocava bem um dia na National Gallery por uma boa massagem tailandesa. A vida podia ser levada como uma mera drenagem linfática, vendo bem. Vénus, querida será que já me posso virar? Não tenhas problemas que eu tenho as duas orelhas inteirinhas, nunca gamei um cobertor num avião, e sei o que é uma sarapitola. (É pá, qual é o defeito da Ilda Figueiredo?)
O jogo da glória



Serei sempre muito tentado a negligenciar o conhecimento e a reflexão quando são essencialmente de “base histórica”, principalmente porque a ignorância a isso me urge, mas também porque eles têm tendência a suportar a pior das arrogâncias: a que favorece a idolatria dos factos, ainda para mais retirados do seu altar preferido que são os biombos do tempo, mesmo que bem aparelhados pelos relicários de turno. (estas analogias clericais já me estão a cansar um pouco)

Nos dias de hoje, em que parecia podermos já nos ter libertado do recalcamento que provocam as “rotas das especiarias” não exploradas, e assim deixar de viver desorientados, afeiçoámo-nos à instabilidade topográfica e escolhemos passar a viver agora melancolicamente desocidentados; algo que me chama à semelhança de “desossados”, por isso é que somos bons de comer, bons de mastigar, bons de fazer aquelas bolas de carne que embucham os miúdos e enojam os pais. Tendemos para meros ruminados. Mas até gosto da ideia, desde que não me cuspam dum sítio muito alto.



A história deserda-nos constantemente, e se confiamos demasiado, ali sentadinhos em comiseração ao redor do seu leito com festinhas interesseiras, acabamos por descobrir que ela tinha amantes espalhados por todo o lado, e que já tinham tratado das burocracias todas em seu proveito. Apeados, e recriminando-nos por não ter tratado da nossa vidinha a tempo, vamos logo procurar outra moribunda histórica que esteja a ponto de bater a bota e de nos deixar uns títulos ao portador que sejam de fácil endosso e decente liquidez. Somos irremediavelmente uns permanentes herdeiros à procura de consolo em forma de destino testamentado. Eu também adoraria ser homem-objecto duma Dona Cronológica, velha, rica e apaixonada por mim, que fosse previsível, e então eu lhe saberia facilmente amansar os caprichos e daí partir para satisfazer os meus. Punha-a dependente dos comprimidos, dados por mim às horas certas, rogados por ela em choro desesperado, face às dores dum tal de futuro que não havia maneira de aparecer em forma de príncipe encantado aos beijinhos e empinado num cavalinho de cortesia.



O novo dicionário não ilustrado hoje limitou-se a lançar um só dado, e esperar que a sacana da velha apareça com o outro. (Cheira-me que ela atabalhoadamente o misturou com a placa, dentro daquele líquido esverdeado que é a análise histórica, meramente desinfectante, pois nem sequer dá para a velha comer um prego em condições). As entradas 746 a 751 mostram-nos o que faz mover a história. E mainada (como agora fica giro dizer-se).



A vontade férrea dum povo – Quando formamos uma corrente que tudo leva à frente, tornamo-nos grilhetas uns dos outros, e amontoados à volta duma bandeira abanamos o rabo da história fazendo o efeito de matracas amestradas. O efeito dos peitos em quilha recorda-nos que poderemos ser apenas perus desfrutando da derradeira bebedeira.



As Coincidências – A geometria desenvolve-se mais com tangentes e secantes do que com paralelos-pífios



A visão dum homem – Com as armações da moda, qualquer míope faz figura de estrela de cinema em ascensão, desde que lhe arranjem um bom perfil, uma amante em desvelo permanente, e saiba fazer boquinhas melhor que o Bruce Willis e o Richard Gere. Piscar bem o olho será sempre vantagem.



O jogo dos interesses cruzados – Num jogo do galo em que as bolas se amancebam com a cruzes, o que é preciso é não deixar entrar nos quadradinhos os símbolos das brincadeiras da concorrência.



O movimento incontrolável das massas – Temos de mexê-las com a delicadeza e no momento certo para ficarem soltinhas, mas temos também de tirá-las do caldeirão da história a tempo de não ficarem pastosas. Valerá talvez a pena besuntá-las de ideologias amanteigadas um pouco antes de servir. Mas já é uma questão de gosto. E de como antes lhes escorremos a vontade de se pirarem.



Uma alcova bem alcatifada – Onde um matreiro cochicho parece um coice de artilharia, onde um ligeiro soprar nos olhos transforma um torpedeiro num catamaran, e onde uma suave e deliciosa festa na cara põe um segredo de estado ao nível dumas trufas de chocolate. O poder serve-se másculo e frio, mas está sempre refém dum banho-maria.
É por essas e por outras

Ou não terei ouvido bem



Parece que a vinda de Madonna a Portugal poderá estar comprometida por causa duma tal de reunião da Igreja Maná. A liberdade religiosa dá no que dá, e depois queixam-se da intolerância. Eu avançaria mesmo para a perseguição religiosa. Volta Torquemada, estás perdoado.

E de caminho traz-me o queijo Manchego que já se me acabou.

Glandulagem again

“O cão bebe ruidosamente com a língua (...) ladra quando tem medo, geme sobre as pancadas. O lobo, esse aspira a água em silêncio, uiva os seus amores e enfrenta a morte sem um queixume» (*)



Eu por acaso até aprecio o insulto. Raramente me choca uma ofensa pessoal, e acho que é duma extrema humanidade fazer relevar os defeitos do alheio duma forma exemplar, desabrida e honesta. Poupar as pessoas pela via da atenção delicodoce é muito pior que entrar-lhes pela estima adentro e desfazê-la a nosso bel-prazer. A chamada dignidade humana é um pregão que se vende agora em qualquer banca de peixe fresco, e o melhor que lhe pode acontecer é acabar numa caldeirada misturada com as batatinhas às rodelas do respeito mútuo.

O carácter e o feitio são meras latas de abertura fácil, e feitas para viver em ambientes de frescura controlada; não valem sequer uma história bem contada, apenas lhes descortino interesse demagógico, ou mesmo um mero pretexto para o jogo do achincalhamento. Xaropadas de achincalhar antes de usar.

Quem quer ter direito à imagem que sonhou para si, o melhor que tem a fazer é disfarçar-se de herói de banda desenhada, e pedir que o artista esteja inspirado na “tira” que lhe coube na rifa. Viver poderá ser uma intifada monótona se não usarmos pedras aguçadas. Só o insulto mostra a nossa condição. Não há política nem poder sem sangue. O suor e as lágrimas são as secreções reservadas para quem é bem mandado. A civilização foi uma invenção de bárbaros preguiçosos, acomodados e amaricados. De quem quis babar os seu amores, em vez dos uivar.



Para desenjoar de gajas inacessíveis.

(*) in “ O Lobo Mongol “ de Homeric, prémio Médicis, ed. Ulisseia

Os momentos da verdade



Quando alguém me diz que «perdi o ritmo e agora está a custar-me recomeçar», eu só me apetece dizer que «para desculpa até nem está mal». Quem encara a vida como um relógio de corda, está mesmo a pedir que se lhe desenrosque o mecanismo todo de vez em quando, pensava eu cá comigo, mas já um bocadinho à rasca, porque como não escrevia há uns dias neste mata-borrão, cheguei a suspeitar que tinha mesmo de me socorrer da CIAtica do Bush ou da Ana Gomes aos beijos com o Ali Alatas para voltar a olear a engrenagem.



Eis então que me lembro daquele balanço clássico que as grandes multinacionais do consumo fazem com as suas “imagens ético-corporativas”: entre o 1º momento da verdade - a escolha, e o 2º momento da verdade - a utilização; imediatamente associo que as “rotinas” do consumo nos ensinam muito sobre a nossa condição.



Consumir está demasiado ligado ao jogo da subtileza do vício, à ambiguidade da vaidade, e à “ruindade” da necessidade, mas também nos aproxima da espontaneidade amoral própria de Deus, a quem (tal como dizia Montaigne) chamamos bom e forte mas não chamamos virtuoso. Deus não “pensa”, e felizmente para Ele, não balança entre a “escolha” e a “utilização”. Deixou-nos pois o consumo para abrilhantar (ou será aligeirar) a nossa condição de eternos “dependentes da liberdade” e da “posse & uso”.

Os despojamentos anti-consumistas cheiram-me sempre a teorias mal amanhadas (ou incompetência elegíaca), mas o mero «consumir é bom, pronto» também não resolve a questão. Quem acaba por nos safar a charada são mesmo os insondáveis poderes mágicos do marketing que nos reduzem à condição de meros manipulados e portanto inimputáveis. Seres que procuram eternamente ser aliviados.



E como ao homem lhe está impedido ser indigno de si próprio, mesmo que nos queiram convencer do contrário, o mal e o bem devem ser olhados e tratados como as técnicas para vender um shampoo: primeiro fazer com que se escolha o que julgamos precisar, depois fazer com que não nos desiludamos com o uso imediato, e depois gostarmos de nos afeiçoar ao cheiro com que ficamos. A nossa vida pode ser uma mera questão de bom gosto.



E eu mais valia mesmo ter falado do Bush e da Ana Gomes. São bastante mais consumíveis. Falhei neste outro momento da verdade. E nem fui espontâneo, como os deuses.

Banalidades & Irrelevâncias. À discrição.

Não querer ir a lado nenhum e gostar de estar em todo o lado



Eu gosto imenso de roscas moídas. Das que já não estão dependentes da inevitabilidade duma espiral. Das que se libertaram do sinistro papel que é ter de apertar, de segurar, de encaixar, de prender. Gosto dos seres que desprezam as buchas, que se encavilham bem em qualquer lado sem precisar de aconchegos para folgas.

Gosto de quem sabe deslumbrar com uma trivialidade, de quem não precisa dum rodízio para ser variedade, de quem vê um buffet em qualquer jantar de restos. Gosto de gente repetitiva, de gente que não precisa das novidades para inovar, de quem não precisa de obscenidades para meramente ordinarar. De quem lhe basta a luz para ser suavemente obscuro (esta foi um bocadinho para encher)

Gosto imenso de roscas moídas. Borrifam-se para a sua finalidade. Vivem como pregos. Confiam apenas na força e acutilância da sua forma, desdenham os caprichos do seu feitio. Não tenho paciência para gente com feitio. E desprezo conversas com destino. Desprezo discursos com conteúdo. Tristes dos que precisam de conteúdo. São meros jarrões, que acabarão certamente em jarretas.

Admiro imenso os políticos. Sendo simples tapiques aguentam o edifício das nação. Sendo singelos pioneses seguram firme a nossa identidade nacional. Sendo meras dobradiças mantêm-nos as portas abertas para o futuro. Sendo os donos dos discursos de estimação, ainda são os que vão arranjando trabalhito para os tratadores das realidades que trazem atreladas e desejam amestradas.



Hoje o novo dicionário não ilustrado presta uma discreta homenagem aos grandes inertes do discurso. No fundo são os que o fertilizam, são o verdadeiro adubo da palavra mascarada de seara redentora. ( entradas 736 a 745 )



Lugares comuns – Os verdadeiros portos de abrigo do pensamento. Quem não se recolhe nestas enseadas acaba mareado, a ajeitar as velas ao sabor do vento, e a decorar a tábua das marés.



Frases feitas – Aquelas que dão pouco trabalho a montar e deixam-nos tempo livre para poder viver sem precisar de sofisticadas mansardas, meio acampados, meio ao relento.



Generalidades – O que nos descansa do cansaço que são os pormenores, onde alguns quiseram convencionar que estava Deus; só que Deus está em toda a parte, e o pormenor é apenas uma debilidade da nossa condição



Mãos cheias de nada – A falta de argumentos sólidos, permite-nos dar as verdadeiras banhadas só tendo de prestar contas à Senhora da Manicure, que nos vai tratando das unhas e cortando o excesso de peles. ( Ia dizer que no esfregar é que está o ganho, mas achei por bem acobardar-me)



Ideias vazias – São como uma prisão sem condenados; à sua volta, os polícias de turno revezam-se jogando às cartas com as grandes teorias guardiãs, e o tribunal dos princípios exara despachos sobre o desenho e o colorido das grades. A sua existência é mesmo o que garante a verdadeira sociedade livre e segura.



Baboseiras – São os disparates que não se arvoram em teoria. Que se limitam a apadrinhar noivados inconscientes, sem desejarem participar na boda, nem escolherem o destino da lua-de-mel.



Lavagens ao cérebro – Qualquer cérebro tem o direito de viver asseado. Temos é de secar rápido que é para não ganhar fungos. O grande inimigo da liberdade de consciências é um pensamento a condensar vapor. Bem, se for muito ainda dá para passar a ferro, e alisar as personalidades muito vincadas.



Conversas de chacha – A verdadeira conversa, a que não é refém duma finalidade, como uma oração, nem está dependente duma origem, como um reles silogismo.



Palavras ocas – Camada deliciosamente superficial, feita duma massa que nem é dura nem mole, e cujo sonho é ver-se recheada do creme macio e doce das ideias profundas, para que possa ser confundida com um profiterole discursivo. Regar sempre com um adjectivado quente.



Floreados – Figuras de estilo que ajardinam o discurso, e que dão muita boa serventia quando não há tempo para alinhavar um presente de jeito. Já se sabe que quanto mais artificiais mais duram. Mas são raros os que se safam sem umas verduras à volta, e sem um arrepiante postalinho de adorno.