O que um gajo faz para matar o tempo enquanto não chega o reboque do acp

Como todos já terão reparado, a actualidade portuguesa balança entre um Carnaval arrastado na Madeira, outro no CDS, outro na Câmara de Lisboa e ainda outro nas urgências do hospitais. Não é a mesma coisa que umas declarações do nosso Pinho, ou um flick flack à rectaguarda da Nadia Comaneci, mas é o melhor que se pode arranjar desde que somos um país livre até às dez semanas e, claro, face à impossibilidade legal de procriação – com adopção incluída – assistida entre homens e libelinhas. Custa-me ver o país a deixar-se levar no amornamento global, sem conseguir trazer novos dados para a agenda internacional, a não ser o rebentamento de gazes em Carnaxide, as marés na costa da Caparica, o ar de codorniz mal grelhada do nosso Durão Barroso, e, não podia deixar passar, as Valquírias - tão bem alembradas aqui pela patroa deste estabelecimento – compostas por aquele rapaz com nome de médio defensivo brasileiro nascido no Paraná e trazidas para Portugal por aquele gajo com nome de desentupidor nasal. Tomando em linha de conta que tenho ouvido bem mais Jens Leckman e Jeff Buckley do que um cérebro normal está disponível para assimilar, até posso dizer estou a suportar bem a realidade em geral, os negócios em particular, a paternidade responsável no que concerne, e as relações homem-mulher em concreto, designadamente as de platonismo invertido, ou seja, as que representam uma espécie de banquete na caverna- os gregos que sirvam ao menos para fazer metáforas que ninguém perceba. Este pequeno desvio da realidadezinha pode parecer uma deficiência no discurso, mas não é, trata-se dum expediente de retórica para chegar ao ponto certo: queiram desculpar mas chegou o reboque, está um frio do caralho, e nem cheguei a falar da minha vizinha de baixo, que, efectivamente foi o que me levou a vir até aqui; em modo subliminar, é claro.
notes on a scandal (*)
Alvalade, 230207

(*) Zoë Heller, 2003
The Buggles reloaded

YouTube Killed The Blogspot star
Luna park

«Só agora G. compreendia o que é o contacto íntegro com a mulher: uma coisa exigente, insaciável, insondável, que participa das forças cegas e desencadeadas da Criação, e que há milénios leva os homens a viver no terror supersticioso da fêmea, e porventura a procurar subjugá-la pela força e pelas regras da moral.»

in ‘O Milagre segundo Salomé’ de José Rodrigues Miguéis (ed Estampa, vol II)
liebling Sünden

«Wer meines Speeres Spitze fürchtet,/ durchschreite das Feuer nie!»



Wagner - Die Walküre
Última cena (3ª) do 3º acto d’A Valquíria - Richard Wagner (Bayreuth, direcção de Pierre Boulez, Donald McIntyre como Wotan)
Anita em S. Bento

Com Sócrates no condomínio

Sócrates, mulher a dias diplomada da nossa democracia pós guterriana, avançou que ‘não tem uma agenda de temas fracturantes’. Dando de barato que não era uma recado subliminar para correia de campos fechar mais umas urgências de ortopedia, devo dizer que fiquei com o mesmo descanso com que fica o caniche da minha vizinha de baixo quando esfrega o focinho e lambe na bata da cabeleireira rosnando «isto é demasiada camomila para a minha papila» (e assim ficou o primeiro pensamento canino do mundo entre aspas).

Com Sócrates a ler Alain de Botton

Sócrates, resultado dum programa de auto ajuda em que o PS esteve inscrito, mas sem registo youtubado, apresenta-se à plebe como o governante das causas certeiras, das que nem vale a pensa descortinar uma causalidade mínima, procurando elevar o common sense ao estatuto de filosofia política e antecipando uma nova lei natural baseada no stupidus lupus stupidum.

Com Sócrates no divã com J. Machado Vaz

Sócrates, percursor duma nova terapia sexual em que primeiro vem o sexo e depois os preliminares, parece o recepcionista dum banco de esperma: começa por perguntar ao povo quando foi a última vez que ejaculou e depois diz para reclamarem com o tubinho se não fertilizarem em condições. Pois, já se sabe, não é por muito país-ovário querer fecundar que um povo-espermatozoide fica de rabo a abanar.

Com Sócrates a brincar ao Mr Bean

Sócrates analisava os nossos tiques de povo amante do petisco mas desconfiado de pratos muito decorados, sabia que gostávamos de fungar mas não nos incomodávamos com o pingo no nariz, e por isso concluiu que se devia gastar dinheiro em guardanapos mas em lenços já seria um desperdício. E mandou retirar os espelhos do mercado.

Com Sócrates a confessar-se ao padre Américo

Sócrates, beato do pragmatismo social, desenvolveu a moderna teoria de tirar a uns pobres para dar a outros pobres e tirar a uns ricos para dar a outros ricos, evitando assim promiscuidade e alargando a base de apoio. Como diria qualquer santo de altar: o importante é uma boa base de apoio perto duma caixa de esmolas encerada qb. Ou, como diria o próprio Redentor: ‘o que está feito, está feito’.

Com Sócrates a cantar Jorge Palma

Sócrates sabia que o país estava ‘frágil’, e pôs-lhe o braço no ombrinho, demonstrando que nunca mais ‘jeremias, o fora da lei’ o iria incomodar, e iria transformá-lo na ‘terra dos sonhos’, onde todos poderão ser quem quiserem, ‘à espera do fim’, que nos assentará como uma luva. Mas, até lá, ‘deixa-me rir’, pela tua rica saúde, até porque ‘a gente vai continuar’.
cooling & counting

não fosse eu uma simpatizante da PETA e hoje ter-te-ia dito, logo ao acordar, “estou apenas vestida com a tua pele” (mas não, assim não posso…)
pur’prazer



Doce - Ok Ko

Nota: se mal pergunto, ainda vai demorar muito até vir limpar as teias de aranha aqui da xafarica? É que já não deve ser possível descer o nível muito mais sem que isto se comece a parecer com um blog de referência, tenha santa paciência…
aye que calor, señor…
© Gil Elvgren @ Great American Pin-Up
ja ik
LUV’ - Ooh Yes I Do
É de facto uma pena

É péssimo ter uma ideia que achamos gira, engraçada até, buliçosa, reboliçosa mesmo, para os neurónios, inclusivé, e estar a dar-nos um sono de caixão à cova, aquele apelo de almofada ao qual qualquer humano com as hormonas no sítio é incapaz de resistir, a chamada vertigem de leito, o verdadeiro apelo da horizontalidade. Ainda começamos a tentar espremê-la – não confundir com espermê-la - e é quase como que se o teorema de fermat se transformasse num pitágoras requentado. É uma pena um homem não lhe apetecer ter ideias profundas e bem articuladas - sim dessas, como antigamente - a partir da hora em que as crianças já estão a dormir – e então quando se viciaram a adormecer treinado rimas, ainda piora - é o drama do pai responsável (mesmo fora do modelo monoparental), o drama do chefe de família (modelo patriarcal, mitigado), o drama do cabeça de casal (dentro do modelo de comunhão de adquiridos) , enfim, basicamente, é o drama dum gajo que lá tem as suas coisinhas. E isto leva-me à tal ideia. Sócrates, que já tinha passado o período de reflexão, e extravasado em muito as 10 semanas, agora queria remodelar, mas estava com pena. Já se tinha afeiçoado à gaffes do nosso M. Pinho (é pá agora começou a Quadratura do Círculo… concorrência muito forte às gaffes do Pinho…), sabia que o povo também já contava com elas, chegou a temer que ele se chegasse a pronunciar a favor do ‘sim’ mas esse susto acabou por passar - o Público até tinha feito agora um investimento grande de imagem e era inglório tirar-lhe o pãozinho da boca - enfim, Pinho era um activo da sua governação- ali a meio caminho entre Braga de Macedo e Carlos Borrego (fazendo Macário Correia parecer um autêntico Churchill de Tavira) - em inglês asset, inclusivé, eu avisei que o sono dá estes esgares de humor forçado e decadente, e o Pacheco Pereira está a fazer aquele efeito com os dedinhos tipo fecho éclair, irresistível, se bem que os dois polegares espetados em arco a fazer de corninhos já não conseguem o mesmo efeito, bem voltemos a Sócrates, não, volto outra vez à QdC, é pá o Jorge Coelho disse que: ‘fez-se história em Portugal’ e a Êropa… – é feio brincar com as formas de falar dos outros meninos,eu sei, farto-me de dizer isso ao meu filho… – agora já não acha que ‘somos umas aves raras’. Eu por acaso até gostava de ser ave rara. Uma catatua, por exemplo; tanto mais que um pensamento obtuso ao quadrado, se obtém com a soma dos quadrados de duas catatuas, - o pitágoras havia de aparecer, eu avisei - e não há nada como um pensamento obtuso para adormecer com os anjos. Aliás, eu agora até vou pensar em como montar um negócio relacionado com os ‘períodos de reflexão’. ‘Clínica dos Arcos de Ofir - junta-te a nós e vem reflectir’. Porque, como diz o Jorge Coelho: ‘isto não é assim’, ou, como diria o nosso Guterres: 3 X 6 = 18.
faq’s

Nick Cave & The Bad Seeds - Do you love me?
Luna Park

«Para amar bem é preciso saber pensar ainda melhor.»

A partir de Racine, em 14 Janeiro 2007
Luna Park

«Porque tal como o sol é novo e antigo,/ Assim de meu amor o dito digo.»

Shakespeare, Sonetos, trad VGM, nº76

*

[…] sei que o amor é começado pelo tempo / E porque vejo, em factos experimentados, / Que o tempo extingue o seu brilho e o seu fogo. / Dentro da própria chama do amor vive / Uma espécie de torcida ou morrão que há-de apagar o amor. / E nenhuma coisa mantém seu primeiro esplendor, / Pois o esplendor crescendo até sua plenitude / Morre do próprio excesso, o que queremos fazer / Temos de o fazer enquanto queremos; pois o «querer» muda, / E tem abatimentos e demoras tão numerosas / Como o são as línguas, as mãos, os acidentes. / Então o «querer» é como o suspiro de um pródigo, / Que magoa aliviando.

Shakespeare, Hamlet, IV.7
Martinho de Arcade Fire

‘Neon Bible’ pode ficar na história recente da música pop como o melhor segundo disco de gajos que tiveram um grande, grande, primeiro disco. Para já isto é o possível. A primeira vez ouve-se mal, à segunda, bem, à terceira, mal, à quarta, bem outra vez, é claramente um disco para ouvir em modo shuffle só para vezes pares. Retenho-me no ‘My body is a cage’. Fica ali entre a salve rainha e a sétima estação da via sacra. Pouco tempo depois dos Strokes em ‘Heart in a cage’, a gaiola volta a ser a metáfora de turno. Apesar de lembrar bastante o Silvestre e o Piu-piu, e ter uma terminação um pouco avarinada, a palavra gaiola encerra inúmeras potencialidades. Não chega a ser tão poderosa como sifão, ou arroz de grelos, mas, vendo bem, transporta o verdadeiro imaginário pessoano: «Perde-te, transcende-te, circunda-te, vive-te, rompe e foge». De repente até li: ‘circuncida-te’.
Luna Park

«Cada insensível rotação do mundo tem destes deserdados / a quem não pertence nem o que foi, nem o que há-de seguir-se./ Pois o que há-se seguir-se é longínquo para os homens. A nós isto/ não nos deve perturbar; antes nos dê a força de guardar a forma ainda reconhecível» de Rainer Maria Rilke, na Sétima Elegia (Assírio & Alvim)
larmes à la pedropaixão, sauce estrogène

Here comes the rain again / Falling on my head like a memory / Falling on my head like a new emotion / I want to walk in the open wind / I want to talk like lovers do / I want to dive into your ocean / Is it raining with you

So baby talk to me / Like lovers do / Walk with me / Like lovers do / Talk to me / Like lovers do

Here comes the rain again / Raining in my head like a tragedy / Tearing me apart like a new emotion / Oooooh / I want to breathe in the open wind / I want to kiss like lovers do / I want to dive into your ocean / Is it raining with you

Here Comes The Rain Again - Eurythmics
talvez

José Cura, «Nessun dorma», in Turandot (Puccini)
Ladainha

Dignidade
Fetal
Liberdade
Progenitor
Moldura penal
Vão de escada
Ilegal
Abortivo
Laurinda Marta Fernanda Alves Rebelo de Câncio
Duas menstruações em falta já são um bom prenúncio
Mulheres
Moral
Gâmeta
Consciência
Vida humana
Telemóveis
Tolerância
Estabelecimento autorizado
Inviolável
Vital xarope Moreira para a tosse
O maior flagelo é a ejaculação precoce
Indesejado
Idade Média
Espermatozóide
Médico
Crime
Responsável
Badajoz
Humilhação
Viável
Saúde
Jerónima Daniel de Teixeira & Oliveira
Estando sol e não havendo preservativos tapa-se com a peneira
Arbítrio
Castigo
Higiénico
Embrião
Ético
Liberalização
Dia seguinte
Lídia Bagão Inês Jorge Félix de Pedrosa
Afinal não rebentaram as águas era só um copinho de gasosa
Ecografia
Gestação
Agulha de tricot
Autonomia
Barriga
Matilde Joana Sousa Amaral de Franco Dias
Para apalpar em condições nunca se pode ter as mãos frias
Desejado
Solução
Mãe
Sanitária
Depressão
Marcelo Ricardo Rebelo Araújo de Sousa Pereira
Não há amor como entre um marujo e uma sopeira
Cadeia
Slot-Machines
Misoprostol
Hipócrates
Sofrimento
Opção
Contínuo
Civilização
Vasco César Rato das Neves
Uma de Citotec e duas de percebes
Intra-uterino
Contracepção
Clandestino
Zigoto
Valha-nos Sta Mª da Descriminilifjlicilipekolitifização, ora pro nobis, ‘dasse, amen
Luna park

«Há muito tempo que o rock não tinha tanta paixão» de Vítor Balenciano, Suplemento ‘Y’ do Público, 9 de Fevereiro, a propósito do concerto dos ‘Arcade Fire’, na apresentação do seu novo álbum ‘ Neon Bible’
postcards from …
Luna Park

Um homem não se renova a si próprio através do amor renunciando às mulheres; torna-se simplesmente um masturbador. E acredito que há sempre mais a aprender de um olhar virgem acabado de regressar de uma volta pelas coisas que nos são familiares do que de um olhar comum que tenha sido privilegiado com o vaguear por territórios virgens.

Odysseus Elytis, «Open book» (excerto adaptado). Tradução do grego por Theophanis Stavrou (Books abroad, vol. 49, no 4, 1975)
Luna park

«O que faz a grandeza adulta de uma história de amor é a capacidade de não deixar desfazer em fumo de tolo orgulho arranhado a palavra ‘tudo’; o que mostra a pequenez adolescente de uma paixoneta é poder reduzir-se à efemeridade esfumada da palavra ‘nada’.»
O homo erectus já não é o que era

«Eu quando escrevo procuro não alimentar nenhuma fantasia» disse ainda VPV na sua tão badalada entrevista à televisão que finalmente acabei de ouvir.
Luna Park

«As grandes histórias de amor (…) desfazem-se em fumo a seguir a uma palavra, a uma entoação, a registos ou tonalidades que são verdadeiras humilhações de alma, quando teriam suportado qualquer outro acto inoportuno» de George Steiner, a propósito da ‘Antigona’ de Sófocles, em entrevista a Ramin Jahanbegloo (ed Fenda)
Luna Park

«Sentir tudo excessivamente,

Porque todas as coisas são em verdade excessivas»

(…)

«De que serve ter uma sensação se há uma razão exterior para ela?»

Fernando Pessoa, Álvaro de Campos
A coisa mais bonita do mundo

É um homem triste. Aquele olhar alephiano para um ponto que tudo contém mas não existe, aquela inclinação de corpo, vergado pelo abandono, bicho de companhia mas sem dono, aquele não conseguir dizer nada, aquela pele seca mas suada. Não é decadência, não é melancolia, é apenas a beleza da indecência duma alma plenamente vazia. Não há nada mais bonito que um homem triste, aquele ar de nada tens e nada pediste, de tudo perdeste mas nada esqueceste, aquele encanto mortífero de a quem nada doeu mas que tudo sofreu. Um homem triste é a coisa mais bonita do mundo, pois mesmo não sendo casto nem sábio mais ninguém morde assim o lábio, e pode não ter um suspirar perfeito mas ninguém retém o choro com aquele jeito, pode até morrer quando o abandonarem, mas o seu fado será sempre o fado do ressuscitado, ou então um poema maldito, que se canta quando ficou por escrever mais do que aquilo que ficou escrito.
what’s a name?



José Carreras e Leonard Bernstein, «Maria», West Side Story
E porra, ninguém fala dos padrinhos, então e os padrinhos!?

A pior acusação que me poderiam fazer era chamarem-me intelectualmente honesto. Palavrazinha de honra, até afinava. Por exemplo, agora só me saem piadas sobre o referendo, do género: «E já agora como é que se despenaliza uma mãe galinha? Escaldando?»; eu sei, isto não é bonito, mas reparem, eu ainda há pouco constatei que durante todo o ano que passou, no caminho de casa para a igreja, e da igreja para casa, eu ia sempre a ouvir os ‘Band of Horses’ e posso confirmar que isso aproximava o meu espírito de Deus, e não foram poucas as vezes em que, na bicha para a comunhão, ia a cantarolar (baixinho porque, reparem, eu frequento a mesma igreja que o nosso césar das neves) uma sacana duma música dos ‘Dirty Pretty Things’ que não me saia da carola. Ora, se no meio disto ainda fosse intelectualmente honesto, género reconhecer que as ‘gajitas do sim’ são mais giras, são sim senhor, isso era péssimo, e assim eu em cada ‘gaja do sim’ vejo a cabeleireira da odete santos ou a dentista da inês pedrosa porque tem mesmo de ser assim, eu sou um ‘gajo do não’, um enjoativo ‘gajo do não’, e é pela dignidade fetal e mainada. Mas tenho de reconhecer que a expressão ‘gaja do sim’ é toda ela mais empolgante que ‘gaja do não’, convenhamos, e isso custa-me, mas temos de ver o outro lado da coisa, basicamente convida-se uma ‘gaja do não’ a ir a qualquer lado e acaba por dar menos despesa, e mesmo no supermercado são muito mais escrupulosas com os prazos de validade e tudo, principalmente com os termómetros por causa dos métodos das temperaturas e assim, valha-me deus que eu nem devia pensar nisto, quanto mais dizer em público, isto é público, não é? Reparem que se me chamassem intelectualmente honesto até estavam a pecar, tanto mais que o vital moreira disse que as mulheres não podem viver sob o ‘tapete da clandestinidade’, ora porra, quer-se dizer, não podemos andar a fazer leis à medida das mulheres a dias! Agora tenho de ir, vai falar o portas e a clara de sousa, porra quem é que lhe pintou os olhos hoje, tu queres ver que foi outra vez a tratadora do oceanário!?
Eu cá se fosse ao Moisés nunca tinha saído do Egipto

Moral’ e ‘consciência’, duas das mais puras e mirabolantes construções da linguagem humana (não sei se nos golfinhos haverá algo parecido), servem de biberon e agitador (e palhinha) à espuma dos dias. É um pouco como discutir a vida sexual baseados no orgasmo das pestanas e no clitóris da papoila, ou discutir o direito romano com base no assassinato de Papinianus por Caracala.
Assim meia dúzia só para aliviar

(e matar saudades)

Acto médico – O que está a meio caminho entre o do barbeiro e o da costureira, mas está isento de Iva

Acto sexual – Sublimação mecânica duma pulsão química recalcada entre um sonho biológico e uma livre associação (tomate e alface servidas à parte)

Acto único – Aquele que nem conseguiu ser Constituição nem sai de cima

Acto e potência – Forma como Aristóteles conseguiu sacar um arroz à valenciana quando a mulher só lhe queria dar arroz branco (aqui arroz de Herpilias também dava um trocadilho giro)

Acto cénico – Parte duma dramaturgia que serve para a Beatriz Batarda amaranhar pelas paredes porque o don juan não apareceu e só lhe saem hipólitos sem sal

X-acto – (fodasse, tanto afiei que agora me arrepiei)
(as melhores) declarações de amor (ouvidas) (de Janeiro)

Alguma pancada mais forte levou-me a ouvir, reouvir e tresouvir de empreitada quase todos os discos dos ‘Magnetic Fields’ durante uns dias. Seria impossível que, assim, não esgotassem quase por completo o que eu tivesse de resumir sobre o melhor amor ouvido em Janeiro.

‘If There’s Such A Thing As Love’ (1), ‘All I Want To Know’ (2), is if ‘I Think I Need A New Heart’ (3), or if I’ve to send ‘letters from the moon’ (4) to ‘You You You You You’ (5); ‘I’m Sorry I Love You’ (6)

(1) ‘I’
(2) ‘Pieces of April’
(3) ‘69’
(4) ‘the wayward bus’
(5) ‘Hyacinths And Thistles’
(6) ‘69’
Importa-se de repetir, Excelência?
Breve história da Luxúria

Pega-se num desejo, afasta-se de tudo quanto o irrite e pinta-se com farripas de apetite. De seguida dá-se-lhe um banho de ausência, ensaboa-se de paciência, esfrega-se bem com a mão e seca-se com um feltro de ilusão. Depois deixa-se ao ar uns tempos para branquear ao sol, reza-se para que nunca fique mole, nem fuinha, e que volte para dentro com vontade do quentinho e da mãezinha. Sustém-se a primeira ameaça de gemido, asperge-se de líquido benzido, apela-se à graça do prazer imaginado, e estica-se em cima dum plano inclinado. Dá-se a cheirar. Se causar ardor nos olhos é falso e tem de ir centrifugar; mas se der lágrima escorrida está no ponto de aproveitar, é só evitar a frieza, fazer-se membro da nobreza, transformar o lamento em fermento, engrossar quando alguém lhe mexe, e pedir para ser transportado numa caleche.
«a arte da guerra»

«Se o mensageiro do inimigo usa palavras moderadas, mas as suas preparações de guerra continuam, vai avançar.»

Não fazendo a Antena 1 parte das minhas rádio-preferências, foi através do f-world que percebi ter-me escapado uma série de entrevistas que Pedro Rolo Duarte, com as suas sobejamente conhecidas inteligência e delicadeza, vem fazendo a autores de blogs portugueses. Hoje ocupei algum tempo livre a escutá-las (ou parte delas, até ao limite da suportabilidade). Se posso afirmar que me agradou tanto a do autor do Portugal dos pequeninos como me agrada o conteúdo do blog até quando em total discordância com ele, posso também afirmar que das restantes retive apenas o vazio quase absoluto (e que alguém a meu lado classificou, de forma bem menos caridosa, como «patético») do seu conteúdo. Há cerca de meio ano, talvez um pouco mais, num mail anónimo e sub-repticiamente hostil, sugeriam-me a leitura do livro de Sun Tzu, «A arte da guerra». Foi deste livro, que entretanto li com o empenho que me merecem todos os bons conselhos e ainda melhores intenções, que me recordei (e nem foi necessário rever Habermas) quando dei por finalizada a audição: o Pedro Rolo Duarte está a fazer, agora bem e com sofisticação, aquilo que no Verão de 2003 fez mal e de forma primária: denegrir a imagem dos blogs. Ou a de alguns autores, pelo menos.
E ao 7º dia pronunciou-se

«os patriotas não se devem afligir com a “imagem de Portugal no mundo”, se o mundo tem a mais vaga imagem de Portugal, o que nada indica. Apesar dos milhões que se gastam em propaganda turística e em viajatas várias, para a maior parte da humanidade Portugal, coitado, não existe (…) A maior gaffe da viagem foi a viagem. » pelo nosso Pulido Valente, no Público de hoje.

Façamos agora aquele exercício básico…

«os fãs não se devem afligir com a “imagem de Vasco Pulido Valente no mundo”, se o mundo tem a mais vaga imagem de Vasco Pulido Valente, o que nada indica. Apesar dos milhões de palavras que debita em comentarísmo turístico e em historietas várias, para a maior parte da humanidade Vasco Pulido Valente, coitado, não existe (…) A maior gaffe dos seus artigos são os seus artigos».

Parece-me justo. VPV, cada vez mais previsível que uma bordadeira de naperons, andou vários dias a pensar de que forma é que conseguia dobrar a tontice de M. Pinho e dizer qualquer coisita que mais ninguém tivesse dito, e, principalmente, que nos levasse inevitavelmente àquela malvada salazarice invisível que nos persegue: sossegadinhos para não levantarmos muito pó.

Já causa sonolência tanta verborreia em torno da nossa pequenez implícita e explícita, e piora quando a conclusão é ainda reforçá-la – artificial e retoricamente - mais. Sócrates, amigo, fizeste bem em ir, o Hu Jintao ( belo nome) andava a fazer de novo colonizador, não te preocupes, um dia bate a bota e ficam os outros, fizeste bem em te artilhares para o jogging, são geralmente as tuas melhores imagens, e fazes melhor ainda em ter ministros broncos porque, se não, repara, falávamos de quê?

Nota: João Pereira Coutinho, no Expresso de ontem, tem uma certeira consideração quando diz que os agora apoiantes do não (como eu) andaram a dormir em cima da lei actual, julgando que o problema tinha ficada enterrado, e mais enterrado ainda com uma lei feita letra morta, que se foi tornando para muitos ‘uma lei a feder para lá do tolerável’. Sobejou-lhes (me) de catequese e que lhes (me) faltou de investimento na realidade.
Como preparar um sonho jeitoso

Pega-se num desgosto de amor, ou, na falta, numa digestão incompleta de arroz de amêijoas, acrescentam-se duas frases soltas mas a rimar, e ouve-se ‘Tonight’ do Richard Hawley. Depois do coração ter suspirado três vezes, e o intestino grosso quatro, bebe-se uma bebida morna, resmunga-se com o excesso de canela no arroz doce e olha-se para as estrelas pensando que elas estão de costas viradas para nós. Entretanto vai-se ao inconsciente, trazem-se dois recalcamentos ligeiros resultantes do envolvimento platónico com o sexo feminino na adolescência, junta-se com um pequena trauma de infância relacionado com apple strudel ou chocos com tinta, e põem-se em vinha de alhos com uma contrariedade recente, polvilhada duma sensação de fogagem na nuca certamente provocada pela respiração húmida e ofegante da Sónia Braga. Espera-se uma horita, durante a qual há que ser parco no contacto com felicidades passageiras e ansiedades crónicas, e passa-se os olhos por dois ou três poemas previamente escolhidos, mas nunca de uma tristeza explicita, nem de russos simbolistas. Alisa-se o travesseiro, aquecem-se os pés, dá-se uma fungadela tripla e uma rotação sobre o occipital, troca-se o Richard Hawley pelos Luna, e tenta-se adormecer pensando naquele pequeno almoço que a Sharon Stone tomou connosco a ver o mar no Albatroz no dia da primeira comunhão. Ao fim de cinco minutos estamos a subir o elevador de Sta Justa com a Nicole Kidman, é certinho.

Luna Park

«Não há mulher que durma serena sempre ao peito de homem algum» de Fátima Rolo Duarte, in f-world-blog.blogspot.com
merry-go-round
Nobre povo, nação Valente

«Mas triste de quem espera do Estado uma fonte de legitimidade moral» diz Vasco Pulido Valente no Público de hoje, largando ao vento um lugar comum anglo-saxo-liberal, decorado com uns sininhos de bem soar ao ouvidinho da plebe pseudo esclarecida.

Muito mais triste é quem espera do Estado um esgoto de banalidade e indiferença moral onde desaguarão apenas os restos dos interesses e facilidades de ocasião.
Fonétiks

As discussões em torno do referendo têm apresentado vários conceitos diferentes para a mulher, e essa diversidade sobressai com alguma nitidez das distintas formas de entoação da palavra ‘mulheres’; a saber:

Muulheres – geralmente associadas ao paradigma anatómico de um par de amamentação e um saco amniótico, com vários orifícios de integração social.

M’lhereshh – geralmente associado à fêmea do macho homem enquanto elemento decorativo mas acrescentador de valores como a combinação de padrões de sofás e de cortinados.

M’nhershh – geralmente associado ao conceito de vítima social, histórica e antropológica.

Mulheeres – geralmente procriadoras compulsivas, amantes de embrião, de feto e inclusive de animal de estimação se tal se proporcionar.

M’lhesh – geralmente representa a mulher enquanto drive exterior da capacidade reprodutiva do homem, e que se deverá ir mantendo em constante upgrade (mas limpinha e com as seguranças feitas).

Monheresh – geralmente está ligado ao conceito de uma kitchnete com pernas, propiciadora da sustentação da espécie pela via segura da sua alimentação regular.

Môlhérissss – geralmente identifica-se com uma potencial dadora de consolo emocional e aliviadora de saldos bancários.

Mlhéx – geralmente associado às herdeiras de Beauvoir e Chanel, mas que estorricaram a herança com a sedução de serem padeiras de aljubarrota embrulhadas em celofane às cores.
Dicionário de interiores #2

(Toda a alma que vive em condomínio precisa de receber os vizinhos em condições)

- tipo de iluminação difusa e indirecta que só reage aos interruptores da vontade de ver

Amor - zona interior da casa que umas vezes serve para repousar e outras para arrecadação

Moral - tipo de janelas de correr que, quando estão viradas para poente, também funcionam como condutas de material descartável

Princípios - tinta de água barata que se usa quando não houve tempo para betumar com massa de preservar

Consciência - sanefas decoradas a tromp d’oeil de decalques

Responsabilidade - rodapé já sem parede. Nele tropeçam os que afinal descobrem que apenas eram visitas da casa

Costume - corredor que liga a sala das ‘sortes grandes’ à salinha das ‘terminações’

Aparências - biombo que, de tão transparente, acaba por se tornar uma autêntica parede de chumbo aos olhares mais crédulos