Desmaker Residence
The rum service & continence girl

Vinham uma vez por semana e apenas se queriam embebedar moderadamente. Acompanhava-os sempre uma rapariga e por isso sabiam qual era a sua conta: quando o primeiro a quisesse apalpar era sinal que tinham de terminar e ir-se embora. Eram uns porreiros, faziam umas piadas giras, todos gostavam deles e nessa noite poupava-se na verba para o pianista. Quando entravam no lobby o porteiro anunciava-os: vêm aí os ‘all cool’ e a menina ‘Lénia’. Mas ela depois ficava; se calhar achava-se capaz de ser mais que um balão de soprar, ou duma espécie de pivot da continuidade para trocadilhos brejeiros. Só que afinal descobriu-se que ela era paga pela casa.
Chalasis (*)

«Não se perturbe o vosso coração. Crede em Deus. Crede também em Mim»

S.João. 14,1

(*) (reparo para ‘calão’ até se arranjava aqui uma etimologia bem finória) Podemos relaxar porque o Gide ( esse gajo foi mais alguma das contratações do FCP?) não tinha lido aquela parte em que Jesus dizia que Ele próprio era o ‘Caminho, a Verdade e a Vida’, e com isso ficou resolvido o problema de espaço.
Path (os)

"O caminho que nos indicaste Senhor, é um caminho estreito, estreito demais para podermos caminhar lado a lado."

André Gide, in "O caminho estreito", 2003 (pág. 111)
No girls, no gods, no snakes, just music

Pessoal, eu hoje estou indeciso; acontece, há momentos assim, a natureza da nossa condição prega-nos partidas e um tipo pode perfeitamente ficar ao sabor da dúvida, da indecisão, de secretárias amuadas, da prisão de ventre e da abstinência sexual. Pessoal, eu explico: Sobre o ‘Electrelane’ dos Axe leio no Público (eu infelizmente não sei ler estrangeiro e fico resumido a isto): “começa com um ‘riff’ de guitarra repetitivo, a que se juntam um piano deambulante e duas encantadoras (…) meninas enleadas (…). Um rodopio (…) um flirt (…) a progressão vintage de ‘two for joy’ e a escalada ‘oh oh oh’ que descamba”. Pessoal: assim não, assim não, já não bastava ontem ter ouvido para aí umas vinte vezes a Marina Lima. Vou mesmo decidir-me pelo outro disco não vá de pensarem que sou tarado e que extrapolo lascívia por todo o lado, sejam eles poros, sejam interstícios, sejam frúnculos. Ora então aqui sim: Hanne Hukkelberg, norueguesa, em ‘Little Things’. Nórdicas, pá, não sei se estão a ver, nórdicas, e esta de cabelo preto, vestido de alça às bolinhas, a apertar a fivela do sapatinho da chicco, e logo com esta pintarola a abrir: "feito de algodão electrónico, piruetas jazzísticas, voz que segreda intimidades em canções que fazem levitar". Eu por acaso acho que Sta Teresinha hoje também seria cantora pop-electrónico-intimista, isso para mim é claríssimo, e o S. João da Cruz ‘riffaria’ que nem gente grande a caminho do monte Carmelo. Reparem bem no misticismo da rapariga (26 anos): «dei por mim a perceber que muitas vezes a música não me excitava, mas excitava-me perceber como tinha sido feita»; ora isto é ir ao cerne, ali, ao âmago, onde o "som concreto se resgata nas pequenas coisas" fugindo da poeira dos dias. Apresenta-se pois : ‘falsamente simples’- género dribles do Pedro Barbosa; ‘procurando ângulos inusitados’ – género posicionamento em campo do Hugo; ‘uma emoção por detrás que lhe atribui sentido’ – género festival gay; ‘perde-se em minúcia mas ganha-se em dinâmica’ – género sexo em grupo; e ‘todos têm a capacidade de tocar vários instrumentos, o que cria um mar de possibilidades’ – género problemas financeiros na banda do Alfeite. Isto sim a verdadeira panóplia, há anos que eu andava para escrever ‘panóplia’, comecei várias vezes com o ‘pan...’ mas depois acabei noutra palavra, problemas com as rimas certamente.
Pois é, mas tinha que haver aqui um problemazito: a influência, a inspiração em Björk! Lá tinha de vir aquela gajita saída duma lata de pó d’arroz aos guinchos depois de lhe ter caído uma lata de alcatrão na carola. Poderia ter sido evitável, deus nosso senhor tinha já dado à Hanne os fiordes, ela não precisava dos glaciares, e ainda diz ela tipo a tentar safar-se mais ou menos: «somos mulheres, utilizamos ferramentas electrónicas, e a nossa música é alternativa». Pessoal, é só para avisar, decidi-me agora: se ele é isso, a minha mulher nunca mais pega num berbequim cá em casa.
Ele aqui também há manifestos

Ora isto é só para dizer que eu estou completamente de acordo, mesmo rendido, enfatizaria, com os projectos da Ota e do TGV. Uma nação cresce e enobrece-se de obra emblemática em obra emblemática, como um honesto grupo folclórico se ufana de galhardete em galhardete, e jamais se deve acobardar em contabilidades mesquinhas e de efeito demagógico de digestão fácil. A nobreza da política encontra-se nesses arrojos de visão, nessas consciências de futuro que não se acobardam nem menorizam perante provincianos deves e haveres. Os presidentes da república (sejam eles casados com a torre de pisa, ou insultadores de gnr’s, ou trincadores de bolo-rei) vêm e vão mas é o betão que fica, é ele que garante a consciência de nação, é dele o suporte da nossa portucalidade ( desde que não nos esqueçamos de caiar todos os anos, claro); o que seria a zona saloia sem o carrilhão de Mafra, o que seria da louça das caldas sem Alcobaça, o que seria da igreja maná sem o cinema Império, o que seria da padeira de aljubarrota sem o mosteiro da Batalha, o que seria o culto da personalidade sem um rococó manuelino, o que seria Camões sem a pala, o que seria dos peixes sem Oceanário. Não podemos olhar para um país mantendo-nos reféns das suas penosas circunstâncias, não podemos deixar calcinar o nosso futuro só porque fomos mesquinhos no basalto, no xisto e no granito, e se há interesses instalados temos de os tratar bem, porque senão transformam-se em cristaleiras caprichosas como maridos ciumentos; queremos encarrilar e pomos em causa um tgv? queremos umas pistas de como inverter o nosso atávico subdesenvolvimento e lançamos as vísceras da dúvida a um novo aeroporto? Esquecemo-nos que se Sagres não tivesse ponta e forte ainda hoje celebraríamos o infante D. Henrique como pescador de fanecas em Alcântara, temos pois de criar novas pontas que possam dar novos mundos ao mundo e nada nos diz que não será duma Ota que nos guiarão para um novo star treck ou se não será um tgv que nos libertará da nossa pouca-terra, pouca-terra. Ó gentes de também pouca fé e de rasteira imaginação, e quando no futuro precisardes de mais receitas extraordinárias vendereis o quê, os artigos do Miguel Sousa Tavares, é?
Um país de puta madre

«Mãezinha, estamos bem, o mano é presidente da junta e a mana também está muito bem, casou com aquele rapaz que trabalha para uns americanos. O paizinho já foi operado ao pulmão e está na lista para aquela fístula que lhe apareceu há atrasado. Não apanhes muito frio na plaza del sol. Agasalha-te e transfere.»
O país em classificados

Troca-se um país de poetas e comentadores de bancada lavadinhos e em bom estado, por uma sociedade civil letrada e uma boa taxa de abandono escolar. Garantimos a máxima descrição se vier acompanhada de investimento estruturante exótico, meigo e fogoso.
Le pays des Maries que vont avec les outres

O país agora oscila entre um ‘falam falam’ e um ´é que é já a seguir’. Esquecemo-nos que já fomos o país do ‘chapéus há muitos’. Fomos vidagos mas queremos ser frizes.
unfocused


Desmaker residence

A miúda das relações públicas. Uma brasa contínua.

Era uma mulher linda, uma vénus viniciusiana. Fazia o que podia por não dar muito nas vistas, usava, até, perfumes discretos, saias travadas nos dias pares, saias rodadas e compridas nos outros, mas a torneada silhueta torturava-os a todos; ao longe arrepiava e ao perto tirava o pio, o pianista do bar quando a sentia por perto fugia-se-lhe a pauta, sentia-se um astronauta, o servente dum triste fado, um «raisparta e eu praqui a dar ao pedal sentado». Quando ela se passeava pelo jardim deixava as flores cabisbaixas, ficavam a desconfiar da sua real eficácia no papel de enfeite, tal o olhar de deleite que lhe mandavam os comensais, que a espiavam de soslaio e depois expiavam melancolia à base de sais. De branco, um dia ela veio de branco, e então aí já ninguém conseguiu olhar, as suas relações eram públicas se calhar mas o seu coração era tão privado que até causava dor, uma dor que persistia, e que vinha com mais força quando se perguntavam se ela de facto existia; ou se era apenas herpetico ambientador.
Weekend fantasy I
Procura-se

Optimista com quotas em dia. Oferece-se lugar de época cativo, com vista privilegiada para o fosso. Vizinhança cínica mas animada. Insultos em bar aberto.

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Weekend fantasy II

Poundlhices

The saccharescent, lying in glucose,
The pompous in cotton wool
(…)
and the swill full of respecters
bowing to the lords of the place

This sort breeds by scission
(…)
boredom born out of boredom
(…)
skin-flakes, repetitions, erosions
(…)

One’s feet sunk,
The welsh of mud gripped one, no hand rail
The bog-suck like a whirl-pool
(…)
And my eyes clung to the horizon

In ‘cantares’, praí o xv, em regime salteado. Sem sal mas caindo que nem cebolinha picada no refogado dos dias.

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Weekend fantasy III

Shakespeare na pradaria

«Não amas o suficiente quem defendes, não odeias o suficiente quem atacas»

in ‘’Jerónimo’. Fala dirigida ao tenente Gatewood (amigo do chefe Apache e quem o consegui definitivamente ‘capturar’)

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Weekend fantasy IV

O amor assim nem tem hipóteses nenhumas

Com os amigos (…) não perdemos tempo a tentar perceber quem somos ou de que substância específica nos compomos. Ela está ali para quem a quiser fixar.

in Diotima.
Airwi(t)c(h)k

'- Que perfume usa?
- Ambientador!'

L. Moore, in "Como a vida", Relógio D'Agua, 2003
No girls, no gods, no drugs, no rules, just music

Isto estava a parecer-me difícil falar sobre a crítica musical desta semana, e já me estava ver a ter de comprar o ‘mil folhas’ outra vez e depois a ter de escondê-lo em casa para manter a reputação de ‘gajo que sabe muito bem do que gosta e que não precisa que venham outros a dizer-lhe’, só que eu tenho uma fraqueza, uma gaita duma fraqueza: eu adoro rótulos; adoro rotular pessoas, políticos, situações, gajas, recalcamentos, blogues, religiões, frases-feitas, negócios, aperitivos, sentimentos, trocadilhos, adereços femininos, tudo! Gosto até mais de rotular do que de rimar, vejam ao ponto a que um homem, praticamente um homem de cultura, pode chegar. E foi então como uma autêntica revelação orgásmica quando me deparei com a crítica no Público ao novo disco do Jamie Lidell – que ainda não ouvi (é só uma pequenina mentira) com manda a regra – denominado ‘Multiply’. (e espere aí que eu já falo das prostitutas gregas reformadas, já ) Este gajo, que pelos vistos fez a sua vidinha nas ‘electrónicas abstractas’ e nas ‘performances impossíveis’, certamente não me iria falhar com os seus ‘ângulos instrumentais inusitados’ (cheguei a pensar que isso era um termo sofisticado para ‘voz fanhosa’ mas um especialista disse-me que nesse caso seriam ‘ângulos sinusitados’- um homem está sempre a aprender) . E é que o tipo não é mesmo para brincadeiras pois ‘tem uma mente extravagante e uma voz flexível’ e apetecia-lhe «articular coisas para o exterior», e não é o facto de já ter encontrado tipos assim com as mesmas características ali nos sinais da av. do Brasil com a av. de Roma que me vai impedir de dar o devido valor (e espere aí que eu já falo das prostitutas gregas reformadas, já) a um rapaz que não é para modas e faz só isto tudo - vou até alinhavar umas alíneas, no fundo alienavar ( que se trata dum trocadilho de índole fusionária):
a) ‘toque celebratório das Motown dos 60’s’
b) ‘R&B seco e intenso à Otis Redding’
c) ‘Sentido melódico à Stevie wonder ou Marvin Gay dos 70’s’
d) ‘Funk sintético dos Cameo dos 80’s’
e) ‘Funk trepidante à James Brown’
f) 'Falsete e minimalismo à Prince’
g) ‘Saturação pós punk’
Sinto aqui talvez a falta à referência do reggae psicadélico do kid Criolo e talvez o folk arrastado dos Pogues mas não lhe levo a mal este esquecimento tanto mais que o Jamie acaba por ‘revolver as entranhas do soul encarnando-os de forma desmesurada’ e o rapaz podia perfeitamente já não ter verba para tudo. Temos assim uma espécie de funkalhada em registo tipo enciclopédia britânica, mas que se poderia perfeitamente resumir de forma económica por um gajo muita maluco com um talento do caraças para a música e para fazer a barba a dançar mas que não aparece no cartão dos pontos do galp frota nem passa nas juke boxes dos lares de idosos para meretrizes gregas. E já quase me esquecia dos amantes de posts minimalistas – como também parece ser a ilustre convidada deste estaminé – e por isso ainda vos direi, ao jeito de bónus track-post: antes a moral duma prostituta arrependida que os joelhos duma beata em ferida; mas nem sei.

(e a responsabilidade toda deste post deve ser acometida ao mulherio cá de casa que está a ver dvd’s do ‘serviço de urgência’ ininterruptamente há coisa de 4 horas)
Desmaker residence

A decepcionista

À menina da recepção faltava-lhe só um tudo-nada para fazer os clientes felizes: desperdiçava-se com a obsessão das regras do preenchimento da papelada, para ela tudo se resumia aos procedimentos do check in ou do check out, à recolha dos elementos, ao consumo de mini-bar, e não reparava que os clientes apenas queriam conversar; derramava-lhes explicações sobre o funcionamento do ar condicionado, das persianas eléctricas, das horas de entrada, das horas de saída, falava-lhes do iva incluído, e não reparava que eles apenas queriam ficar a olhar para ela ali ao balcão, pedir-lhe uma sugestão para um restaurante, dum sítio para passear e assim ver-lhe as mãos a deslizar pelo mapa bem esticado, mas nada disso lhe interessava, para ela tudo era expediente, um enquadramento, um cliente, e ela geriria esse casamento. E eles acabavam por se ir embora sem sequer experimentarem a ousadia de lhe pedir que soltasse o cabelo: bem recebidos mas decepcionados. Nem um olhar carinhoso, nem um fastio desopilado num soprar de franja, nem um «fique mais uns dias que eu arranjo-lhe uma tarifa só para si». Eles iam-se embora sem energia nem à vontade para esboçar um lamento mas ainda ficavam com ciúmes por causa do amor que ela tinha ao regulamento.
Sapphic challenge

(Still no rules)

E já lá diziam os Gregos: não há mais convicta moralista que uma prostituta reformada.
Este é um post praticamente politico
( no fundo porque ainda não me passou o torcicolo seguido de lombalgia depois de ler a provocação do ultimo post; e se ainda for a tempo: nunca se metam com gajitas que leiam muitos livros é o meu conselho de amigo)

Ora face à demissão do mr campos só me resta fazer algo que já está muito, muito, em atraso e que mais não é do que agradecer a todos os que deram os parabéns pelo 2º aniversário desta humilde pensão, seja por que via foi (se bem que ninguém se lembrou de fazê-lo na via verde, nem uma loura num Mercedes nem nada, e eu acho isso uma desfeita). Este agradecimento estende-se também a todos os blogs políticos, aos de gajas, aos da terceira via, aos de tricot, aos de fotografias com entardeceres marinhos (e mais vale um entardecer que um arrepio na nuca), aos de religiosidade explícita acompanhada com bebidas adocicadas, aos de nostálgicos da rampa da falperra, aos de ciclismo, aos amantes de blogues minimalistas, aos comensais da residence, aos que nunca viram um golo do Reinaldo Ferreira, aos de lampiões (com esta consigo praí menos 10 anos de purgatório) e não me queria esquecer também da Britney Spears (ainda estou derretido, e telefona à vontade que arranja-se sempre um tempinho livre), nem da Kelly Key, abençoada sejas filha, pois a posição de ‘sentado e calado’ o que perdeu de misticismo ganhou de potencial erótico, e face a isto eu reabriria a comissão Constâncio – ajudas de custo e despesas de representação incluídas - porque o novo ministro quer trabalhar com números actualizados, de preferência às três, quatro casas decimais para sermos mais rigorosos: o nosso deficit não deve ficar a dever nada ao pi.
Sapphic challenge

(No rules, no 'rights & wrongs')

Herpetia era uma projecção da necessidade de amor de Esopo.

E agora topem-me vocês este dilema

Um gajo, assim tipo eu faz de conta, casado, sem ser de fresco, pai de filhos, filhos esses da mulher com quem casou – reparem bem que um pai saber que os filhos são seus biologicamente é sempre um óbvio acto de fé – num casamento feliz dentro dos cânones possíveis para este conceito vago - nota técnica: um tipo não se casa para ser feliz, isto parece básico, para ser feliz um gajo vai para um convento, ou faz uma viagem de 20 anos à volta da terra, ou come pistachos ininterruptamente a ver vídeos do maradona intermeados com os do roberto baggio e os pontapés de bicicleta do negrete, ou conta anedotas porcas à desgarrada (luar opcional), ou faz cinema minimalista a gozar com o espectador e com os financiadores, ou compra uma porcaria por 10 e vende-a no segundo seguinte por 200 e o tipo que a comprou fica a pensar que fez o negócio da vida dele, ou faz pontaria com as cascas dos percebes para as jarras de cantão oferecida pela sogra, ora casar é algo que um gajo faz, ponto, está feito, ama oficialmente ( oficialmente não é menorização) alguém, ponto, ama, está combinado, juntou os trapinhos, ponto, juntou. Não é que o pessoal não goste da mulher, ou não se sinta bem com ela, não é que não se passem uns bons momentos, não é que não se retire algum proveito dessa coisa das revistas chamada ‘cumplicidade’, ou segurança, ou carinho, não é que um gajo não sinta realização físico-psicológica-sentimental (juntei o ‘sentimental’ só para desanuviar o ambiente) com o sexo versão in door, e com outras tantas coisas, ó mãe do céu, (esta jaculatória intercalar também é de teor desanuviador) mas a felicidade cheira-me sempre a uma variável que joga noutra equação ou dimensão que não esteja comprometida com a organização logística da espécie. Mas adiante, nem é este o nervo do problema, o importante é mesmo analisarmos como é que neste enquadramento um gajo se pode safar sem chatices internas e externas se quiser escrever – género para desopilar como alternativa a beber umas cervejolas que só aumentam a barriga - uns textos sobre o amor, o sexo, a paixão, as ondas do corpinho feminino, o arrepiar da espinha, o arredondar da saia, o húmus pélvico, os cabelos mal presos ao vento por um lenço colorido naquele azul vivo mas casto, a pesca de arrasto, ( sorry, não resisti) e não sendo ninguém especificamente visado, nem sequer a própria mulher por pudor ou inibição explicita em acordo pré-nupcial; então o resto do pessoal vai pensar o quê!? Que o gajo é poeta, é escritor, seria uma hipótese, … ora aí está logo um problema: isto por exemplo comigo será impossível, ninguém no seu perfeito juízo poderá pensar isso de mim, vão logo é pensar o gajo é depravado, sonso, dissimulado, sofre de ejaculação precoce, saiu à pressa dum convento, está apanhado pelos nervos, já não dá conta das amantes, está cravejado de dívidas, perturba-se com o bambolear da secretária, sei lá, parvo será o mínimo. E isto não é confortável para um rapaz com eu, que até sensível chega a ser desde que a lua não esteja em quarto minguante. E é pois assim que nascem os blogs políticos. Como este, cuja padroeira é aquela moça, tipo gaja inacessível, acho que se chama becky andersen, ó lá o raio, que apresenta as noticias da CNN. E se eu algum dia escrevesse algum texto mais fresco e inspirado, o meu advogado tem indicações expressas para afirmar que era nela que eu estava a pensar.
E topem bem nisto: um post sobre um assunto delicado sem um único palavrão! (cânone não é ordinarice, pois não?) e até sem citar o Óscar Wilde e com uma jeitosa que estava mesmo a apetecer-me.
On my knees

Eu não me sentiria bem a mais a minha consciência
Se não vos dissesse
para ter paciência
comigo.
É que houve na minha vida um momento
de fraqueza,
que eu lamento,
em que não apreciei devidamente a Michelle Pfeiffer
e agora se calhar estou a pagá-las
tendo de escutar músicas de ‘corazones que se desnudan’
e eu sem saber tocá-las
resumindo-me à secura duma alma
essa sim ao sol secada
e, como todas,
insuficientemente amanhada
que esta é que é a verdade
verdadinha
‘desnuda de impaciência ante tu voz’
moscada tal como a noz;
mas agora é que vão ser elas:
para ‘bordar de corales tu cintura’
é preciso mais perseverança
que a da água mole com a pedra dura
e como não estou
‘mutilado de esperança
nem de razão’
no dia em que me sacar uma dança
transformo-me em reles pião.
Mas não me levem a mal,
É que estou
Em período de castidade verbal.
E agora não se queixe
Pois acabou de me dizer que isso é adereço de peixe.
Mas ainda deixe
que lhe acrescente
mesmo sendo o mal de muita gente,
‘mojado en ti’,
citando o maluco do jamiroqai,
muitas vezes não passa
duma ‘virtual insanity’.
Ao cuidado dos F’s do Amaral e artistas similares
(Será que o problema dos terroristas também é que não estão a conseguir explicar suficientemente ao mundo as suas medidas drásticas?)

Desde a fase final da governação de Cavaco que intermitentemente aparece interpretado por diferentes artistas o insuportável discurso da ‘mensagem mal passada’; confirma-se pois: o povo está na grelha, aparece a mensagem, o povo não aguenta tanta alcatra informativa por perto e por isso ela acaba por ficar mal passada. Eu julgo que a populaça até já está habituada à mensagem tártara, está é farta dos cozinheiros. Mal por mal: enlatados, ao menos não temos de olhar para os gajos que mexem no tacho, e acompanhemos com água tónica sonhando que são 'burbujas de amor'. ( e eu já a lixo ó...)
Para levar isto – refiro-me a essa entidade mítica denominada ‘o mundo conturbado em que vivemos’ ( o ‘conturbado’ deriva da excessiva proliferação de pessoal com turbantes e afins) - com alguma calma, a principal sugestão do dicionário não ilustrado será: rezar pelos que têm informação a mais, rir de e com os que têm informação a menos, e oferecer uns toalhetes perfumados aos que estão no meio. Nas entradas 1065 a 1071 são totalmente escalpelizadas ( eu passo-me com esta palavra mas deve ser para exorcizar a queda do cabelo) as novas técnicas da saison para lidar com o inimigo; whateveritmeans.

Negociar – Sofisticado processo em que se tira a bissectriz na testa do adversário tentando que o tiro lhe acerte rigorosamente no meio dos cornos e não tenha a leviandade de se desviar para alguma das sobrancelhas e ainda lhe dê para resvalar

Compromissos – Momento intercalar de elevado potencial energético e que é aproveitado nas trincheiras para umas belas patuscadas ao vapor e no campo de batalha para passar bronzeador nos cadáveres

Sedução – O piscar de olho ao inimigo deixá-lo-á sempre entre o tentado e o ofendido. Só o descobriremos em definitivo quando se lhe virar sobranceiramente as costas. E nessa altura sugere-se uma oraçãozita pedindo para que ele seja dos fornica para o lado certo.

Tirar as medidas – Etapa da mais fina alfaiataria negocial que permite gerir as folgas das nossas oscilações de potencial, para que não sejamos atraiçoados no momento em que se teste a posição estratégica dos ditos no célebre movimento táctico de ‘baixar as calças’.

Manobras dilatórias - Depois de engolir alguns sapos deverá ser devidamente encanada a perna à rã por forma a que quando a tivermos de comer outra vez pelo menos seja em espetadinha e assim já se poupe no pau de louro.

Surpreender – Devemos entrar para a arena apetrechados de nariz encarnado e de chicote, mas só no final verdadeiramente descobriremos se fomos palhaços ou domadores, consoante as palmas e os risinhos venham das crianças ou dos leões.

Ir passo a passo – Verdadeiro ovo de Colombo do processo negocial com terroristas que permite passar por uma primeira etapa em que apenas se troca a redução em 20% do número atentados a autocarros de carreira urbana por menos 15% de F16 a patrulharem as caravanas de vendedores de tapetes no kosassan, até alcançar uma fase posterior em que se consegue que os bombistas suicidas troquem a mochila por uma mariconera tendo apenas por contrapartida que os presos de guantanamo possam tomar duche três vezes por semana, passando pelo acordo intermédio em que as fardas do exercito iraquiano serão confeccionadas nos campos de costura da al-quaeda e comprados a um preço indexado inversamente ao logaritmo do preço do barril de petróleo. Ámen.
así?

Tengo un corazón
mutilado de esperanza y de razón
tengo un corazón
que madruga donde quiera
¡ayayayay!

Y ese corazón
se desnuda de impaciencia ante tu voz
pobre corazón
que no atrapa su cordura.

Quisiera ser un pez
para tocar mi nariz
en tu pecera
y hacer burbujas de amor
por donde quiera
¡oh! pasar la noche en vela
mojado en tí.

Un pez
para bordar de corales tu cintura
y hacer siluetas de amor
bajo la luna
¡oh! saciar esta locura
mojado en tí.

Canta corazón
con un ancla imprescindible de ilusión
sueña corazón
no te nubles de amargura
¡ayayayay!

Y este corazón
se desnuda de impaciencia ante tu voz
pobre corazón
que no atrapa su cordura.


Juan Luis Guerra Y 440, Burbujas de amor in Bachata Rosa
No girls, no gods, quer musica ‘tá visto
(a hóspede exigiu mais variedade no piano-bar)

Desta vez arranja-se uma tal de clássica. E nada melhor que ler a crítica ao disco ( vem-no-público-mil-folhas-ao-ponto-a-que-um-homem-chega-para-ter-uma-rubrica-séria) dum gajo que eu não fazia a mais piquena ideia de quem tinha sido mas que tem um nome de registo peri-masturbatório: Joseph Bodin de Boismortier! Aleluia. Esta ligação entender-se-á ainda de forma mais profunda se atentarmos que ele «é hoje sobretudo conhecido pelas suas obras para flauta» e foi o primeiro francês a escrever um concerto e logo para fagote, um dos chamados instrumentos de «tessitura grave» - mas que convém, adianto desde já, não apertarem muito com ele para não ficar a piar fininho, principalmente na insuspeita ‘Suite de pièces que l’on peut jouer seul’ -op.40. Ora este entusiasmante cd, onde «as cordas dedilhadas conferem ocasionalmente um saboroso contraste», do ‘ Le concert Spirituel’, algo que - já se sabe – se me assenta que nem uma luva tal a espiritualidade que emana do meu ser, «apoia-se numa eficaz realização do baixo contínuo» e isto é algo que manifestamente ( que é um advérbio) nunca se deve desprezar, tanto mais que aproveita para trazer à luz a «recriação da “Musette”», que não é uma musa pequena como poderíamos ser levados a supor, mas sim uma «pequena gaita de foles», tornando-se pois este o verdadeiro e definitivo contributo do orgásmico compositor ao trazer assim à dignidade polifónica aqueles instrumentos que doutra forma estariam «confinados» a ser apenas as partes baixas da música.
No entanto devo confessar-vos que já não confio tanto no potencial de bombeamento – metafísico, claro – do «introspectivo “Lentement” da Sonata op 16»; mas isto já sou eu a falar porque desconfio de tudo o que é feito devagar; felizmente que o crítico também dá o devido valor ao andamento ‘Le Brut’ da abençoada e ‘contrapontística’ Suite op.31.
E dado que a devoção minimalista deve continuar a ser acarinhada, ainda acrescentaria uma algebridade clássica, também toda ela duma riqueza tímbrica que não deve ser menosprezada: Antes montados num belo 31 que estarmos feitos num 8.
r u talkin' 2 me?


™ MMK, Frankfurt Am Main
Desmaker Residence
A hóspede

Gosto quando aparece sem reserva, quando entra à socapa, sem avisar, fora de horas, mas às vezes cheia de nove-horas, quando se cruza em identidades diferentes para baralhar as autoridades, quando finge que fala comigo mas afinal fala sozinha e à base de meias verdades, quando me deixa acordado à espera e acaba por não vir pernoitar, certamente para demonstrar que tem mais onde descansar, quando se mete com quem aqui se vem aviar, quando se arma em batoteira fina ou quando vem com as santinhas armada em peregrina, e depois quando lhe dão escrúpulos sobre o que pensa o resto da clientela, mas mal sabe ela, que não há dia que passe em que eu não sonhe em dar-lha de trespasse.
...

Raffaello di Giovanni Santi (1508). "La Belle Jardinière", óleo s/ madeira, 122 x 80 cm. Musée du Louvre, Paris
The original sin(ging)

(pré-texto para um ensaio neo-rafaelita post-fosforilado)

Ao contrário de ti, nem sou poeta nem sei filosofia. Por essa razão também não serei capaz de, à tua semelhança, inventar palavras - tão pessoais que só tu saberás o significado - como forma de sobreviver à falta da luz que me é tão essencial quanto a noite às corujas.

[no entanto há muito que nos meus sonhos entrava escrever num blogue, era uma espécie de 'entrada no reino do céu dos pardais' que, sendo a barriga dos gatos, só podia encantar-me mas nada sabendo de agá-tê-émieles via-me a braços (bruços também mas noutro local) com a precoce despedida do sonho em que sairia do anonimato (não é ilustre mas toda a gente sabe que esse é só para quem nele acredita e depende muito da lâmpada e do abat-jour) e me tornaria musa (também servia divã mas com pouco Addict para não opacificar o écran) blogosférica]

Tal como tu, gosto de sentir e gosto das palavras e gosto de sentir com as palavras. Ainda que sabendo haver, para cada um de nós, um número certo e limitado de palavras esforço-me por resistir à inevitável usura das que deixamos escapar - e das que evitamos sem avareza.

[quando optei pelo regime de hospedagem (devidamente contratado em papel azul de vinte e cinco linhas e com registo notarial) tive a garantia por parte do senhorio de uma adequada recepção: a inclusão de fundos com flores e odores num template até então mais ascético (e asséptico?) que colarinho de cónego, comentários a certificar a excelsa qualidade da minha 'intidade', uma grafonola a debitar um bem sincopado ritmo de 2-por-3, uma caixa de correio para receber memórias descritivas da aderência ou da concorrência, respondíveis em concurso público ou em post-público que é muito mais giro e sempre dá assunto e publicidade]

Talvez seja, como me dizes entre sorrisos, a elitista intransigente que - tal como ou ao contrário de ti? gosta tanto do gosto pela inteligência de Valéry, da loucura lúcida de Michaux e do cepticismo apaixonado de Cioran como da irreverência de Aleschinky, da sensualidade de Picasso ou do kitsch de Lempicka; como dos flamengos, demasiado próximos na minha vida para que neles reparasse e que me fizeste redescobrir, há tanto tempo, lembras-te?, através de um van der Ast cujas flores me ofereceste, ou dos escritores russos perdidos há quase três décadas e de que quase não me recordava - hoje, excepcionalmente, baixa as guardas e despe a reserva admitindo gostar de alguém para além dos advérbios.

[neste momento até mareei a olhar para o "name-dropping" lá em cima, há quem se dê a cada coisa... e linques para o rapaz da anatomopatolografia, para o escritor de poemas espanquianos, para o quase-jornalista-económico-político amador, para o especialista em rabecas e oboés, para o humorista desempregado por excesso de qualificação, enfim, o que necessitaria para ter a atenção do mundo cá dentro sem que, ostensivamente, tivesse de explicar a realidade do que já todos deveriam teriam percebido pelos diversos sinais e harpejos (e desenhos, etc, sim, sou loira mas explico-me nem que para tal gaste rios de conversa fiada e repetitiva ou de imagens sem sentido ou de pescadas, digo, postas a soarem a concerto de música das esferas): a existência de uma estrela subestimada de uma galáxia pré-blogbânguica, que cometeu o pecado original (e grande erro estratégico) de não abrir o seu próprio blogue]

E agora que me aventurei pelos temas, conceder-me-ás?, da fé deixa-me dizer-te ainda que, pouco ou nada sabendo de fenomenologia nem sendo carmelita mas evocando Edith Stein, também é "coisa muito minha" o tão rigoroso e difícil, quanto quase impossível, critério com que adopto a verdade protectora que é a gestão da vivência que se acoberta numa palavra enigmática como "silêncio". Para, citando de memória a mesma Edith Stein de quem, no entanto, dificilmente serei seguidora ideológica, poder dizer: "não lamento ter-me dado até ao Amor".
Apenas para ajudar a aterrar no real enquanto o mundo parece um ora bolas

O entendimento será sempre mais instrumentalizavel que a acção. Porque a acção cansa e às vezes não está para brincadeiras. Mas o entendimento será sempre mais livre que a acção. Porque o entendimento pode brincar com a história, com a álgebra, fingir que Deus não existe, pôr o mal a rimar com Carnaval, conceber as tácticas do Peseiro, repescar clássicos, interpretações dos Corões, nirvanar, pode tudo, até começarmos a ter formigueiro nos pés. E a melhor expressão que alguma vez uma língua inventou foi ‘pussy cat’, só que aqui acho que já sou eu a levantar voo outra vez. Mas não é erva, é apenas necessidade de acção para ajudar a drenar o pensamento.
My "whatever" (side of the soul) kind of garden (party)

® JL, 97. Tinta da China e aguarela sobre papel. Colecção particular.
L’Être et le Néon

Deus quis investigar melhor outra vez essa coisa do romantismo porque lhe começou a cheirar a esturro; algo poderia estar a fugir ao controlo. Ao existencialismo já tinha dado o devido correctivo quando deixou o Kierkegaard sem namorada para o resto da vida, e o Nietzsche (para além de o ter fodido com o nome) tinha-se tornado inofensivo quando caiu na esparrela e anunciou precipitadamente o Seu velório. Estes até podiam ter dado bons rapazes, se não se tivessem baralhado nos matraquilhos com a ‘angústia’ e o ‘desespero’, mas acho que têm todos um lugarzinho no céu ali na zona dos te deum com vista para a cintura industrial; o S. Tomás já se tinha abarbatado com as vistas para a cintura da Sta Teserinha, mas eu agora estou-me a afastar, acabou de me dar indicações o meu anjo da guarda que desde que eu ando a escrever neste trampanário não me larga a peúga, chiça. Retomemos o fio à meada, mas agora não é piada, foda-se rimei e não queria, e não estou a avançar nada nesta porcaria, merda rimei outra vez, isto é o cabrão do inconsciente, bem, eu inicialmente (caraças, pá) estava a falar dos românticos, vês! e agora vou ter de abreviar: Deus foi fazer uma experiência: um homem e uma mulher que não se conheciam, nem sabiam da existência um do outro, suspendeu-lhes a ligação com qualquer causalidade, fê-los filhos da nostalgia do infinito, (lerem Espinosa foi opcional) e pô-los a apaixonarem-se e a sobreporem essa paixão à necessidade de se conhecerem. E esperou. Como um cientista português moderno: a ver no que dá, sem ter problemas de orçamento. Passados uns tempos tirou a tampa: o casalinho já estava junto a contar umas anedotas, a fazer trocadilhos com o Heidegger, a comer uns ovos estrelados e uns búzios, a borrifar-se para o romance etéreo, e até já tinham passeado na red light zone e comido umas farturas à luz duns néons. Deus descansou, afinal era como ele tinha a coisa pensada, e foi ver se os tipos que actualmente ainda liam o Kirk & Nietch levavam mesmo aquilo para a brincadeira e se punham a jogar srabble com o 'dasein', ou ficavam aparvalhados e nem ‘eram- aí’ nem saíam ‘de cima’, no fundo este sim, o mais empolgante estado da natureza: o ‘oben sein’. Pronto, pronto, eu paro e vou-me deitar, chiça, é que não me larga a peúga mesmo.
The original post-segmentation

Não querendo que lhe falte pedacinho nenhum e porque talvez 'não haja História mas histórias', recordo-lhe que, para além de referir 'a diversão de apagar a história conhecida sob os anais do anonimato', também em Monsieur Teste, Paul Valéry escreveu:

"C'est ce que je porte d'inconnu à moi-même qui me fait moi."
Desmaker Residence
Acabaram as bebidas à pressão. He is a zero bar man.

Os sonhos mais sumarentos teve-os enquanto adolescente, mas nessa altura não se sabia espremer em condições. Hoje serve cocktails vistosos, apimentados, mas não é a mesma coisa. Mesmo com a rodelinha da crise de meia-idade para enfeitar, nos aperitivos já só conseguia trabalhar com favas contadas.
E agora soltando a fera minimalista que me assola por vezes o ser:

Today,
I should say,
put your pretty face, pray,
and have a really good fucking Sunday

(eina, saiu verso em escadinha como eu gosto)
No girls, no gods, just music

Geralmente (ia a escrever ‘por princípio’ mas consegui evitar mesmo à justa) só disserto sobre assuntos dos quais tenha um desconhecimento profundo. É o caso do último disco dos Shivaree que não ouvi de todo. Recorro pois à crítica do Público de hoje – o que já faço pela segunda vez seguida, correndo por isso o risco de tornar esta rubrica num clássico, e como eu gostava, meu Deus, de ter uma rubrica que fosse um clássico – e que é iniciada com a sempre empolgante mas enigmática palavra: ‘apesar’. E há uma outra coisa que será justo esclarecer: eu detesto escrever sobre música, mas adoro falar sobre críticas de música, principalmente daquelas que utilizam o divino método: primeiro escrever a crítica e depois escolher o disco. Aparentemente os Shivaree ‘ não existem mas são o veículo para transportar a paixão que verte da boca de Ambrosia’, e isto quase que chegava para um tipo ir correndo a comprar o disco de forma desaustinada, pois poderia usufruir do prazer proibido quase com a mesma devoção com que acede às graças sacramentais gregoriana e polifonicamente acompanhadas. Mas eis que, como se não bastasse, inesperadamente o disco se apresenta ‘tão musicalmente previsível como emocionalmente fascinante’. Pessoal, eu aqui parei, acho que estamos em lua nova e eu fico muito sensível, não sei se o fascínio emocional é que me fará melhor, tanto mais que neste perigosíssimo disco a ‘ambiguidade reina por cima da batida marcial mas doce’. Água benta para cima disto, Ambrósia volta para dentro que um homem não é de ferro, e agora dois dias de Aretha Franklin para purgar. Apesar, claro.
E para os devotos dos blogs minimalistas, e pelo mesmo preço, vos digo, hoje faria um post praticamente melancólico, dizendo que: em terra de passarinhos que tem olho é coruja, e em terra de marinheiros quem tem mamas é maruja.
Resposta a um que «Tu que escreves sobre coisa nenhuma»
(e de caminho ajudando quem possa andar com problemas técnicos)

No tricot começa por se ‘lançar as malhas a partir do ‘nó corredio’’, esse nó que desliza, a verdadeira antítese do nó cego. Mas não sei qual é o melhor dos dois. Um que permita irmos por aí marcando pontos, gerindo a malha, ou um que nos prenda, nos fixe, nos diga: é isto, não percas tempo em floreados nem em losangos.

Mas o ponto propriamente dito já aparenta ser um verdadeiro kamasutra de mãos : “dê uma volta com o fio em redor do dedo mindinho da sua mão direita. Passe-o por cima do dedo anelar, depois por baixo do dedo médio (nesta altura já estarão a revirar os olhos certamente) e então por cima do dedo indicador”. Não sei se assim se fazem meninos, ou os ditos preambulares, mas camisolas não se farão certamente. Eu queria ser fio, sim eu queria ser fio. E aos dias nove, faria um novelo.

Mas como em tudo é preciso ter cuidado: “ Ao tricotar conserve o dedo polegar da mão direita sempre em contacto com a agulha, usando o indicador para fazer passar a lã à volta da agulha» Nunca perder portanto o contacto com a agulha. Parece-me justo e acertado, tivéssemos nós sempre esse cuidado, e até os camelos entrariam no reino dos céus e o mundo não nos pareceria um palheiro. Não sei se vocês estão a acompanhar isto, se calhar vou mudar para ‘ponto liga’ porque do avesso às vezes é mais giro. Como o mundo. Em certos dias.

Tudo ter um fim, apesar de ser uma expressão absolutamente estúpida e fazer parte daquelas que são impossíveis de demonstrar, dalguma forma dá-me jeito aqui para o trico-post , tanto mais que “isto tudo só acaba quando as malhas estiverem todas trabalhadas e a nova carreira estiver toda na agulha da mão direita”. Sim, é limpinho, no final todos vão comer à mãozinha dos mesmos. Liberais e outros amantes do crochet do poder.

E claro, este postezinho também é dedicado à convidada que ultimamente, e de vez em quando, tem escrito aqui neste blog metendo-se comigo sempre com uma letrinha amaricada, ora disfarçada de Eva-chip, ora de vendedora de aguarelas manhosas, ora de escritora de ficção mal friccionada. É o que dá um tipo ter andado carradas de anos no negócio da lavagem de passwords e agora o feitiço se ter virado contra o feiticeiro. Mas eu dou conta dela, não se preocupem.

E os textos em itálico e entre aspas foram retirados duma revista que o pudor masculino me impede de revelar.
Ocytocin memories

é manhã cedo de um dia qualquer, os pombos deixam ainda abandonados os bancos e os caminhos da praça vazia da cavaqueira dos velhos, o vento manso desliza entre as folhas das árvores, tenho saudades tuas

(há aqui qualquer erro... bem te disse que não sei escrever, afinal não posso ter saudades tuas se são tuas e estas são minhas, de ti)

e refugio-me neste pedaço que é outro de ti para me sentir aconchegada como num dos teus abraços e leio as tuas irreverências com o mesmo prazer com que deixo que me despenteies e me mordas as pontas dos dedos

(ao abrir esta 'porta' faço de conta que não reparo tal como o faço quando, da forma que só tu sabes, me provocas ao tirar a gravata na minha frente)

em que mimo um constrangimento que não tenho... e agora, já acreditas no meu lado masculino? e que a escrever aqui ainda acabarei por convencer os teus 'pestanejantes intermitentes' que tens um exemplar perfeito de blogue político?
Desmaker residence
Árduas, carentes e frígidas

Este blog possuirá uma coisa boa: não tem leitores; terá quanto muito olhos que pestanejam intermitentemente por aqui. É como um hotel feito para não ter hóspedes mas apenas passantes; poupa imenso na lavandaria e não tem despesa com recepcionistas giras. Aqui ninguém deve arriscar uma meia pensão. Muito menos o room service.
Ou caçarola ou assai-me, não: ou cassarola ou açaime, não: ou caça rolas ou açaime, não: ou caçarola ou açaime, chiça.

Todos temos um pouco de Alberto João dentro de nós, só que nem todos temos um jardim onde o passear.
Para pôr no manjerico
a ver se não murcha

Algumas deambulações teóricas sobre a existência de Deus – agora relativamente desvalorizadas por uma espécie de raquitismo mental, mistura de misticismo com andarilhice pastoralícia - desembocavam nesta extraordinária constatação: o mundo, nós, não parecemos necessários, não se encontra uma razão plausível para existirmos, encaixamo-nos muito melhor como resultado duma vontade expressa, arbitrária para os nossos rasteiros cânones, difícil de definir, mas bem explícita: quem nos quis, saberia o que queria. Mas quanto a nós não sabermos o que queremos, inexplicavelmente também faz parte do mesmo filme. Julgar que sabemos, também. Tudo uns belos fodasses, pois então.
My kind of (sexy) boy

(Ou é desta que o dono aqui da baiúca me 'estrafoga' sem me dar tempo a ..., uótevere!)

® JL, 98/99. Tinta da China, marcador e aguarela sobre papel - pormenor (*). Colecção particular.

(*) Versão integral só para adultos (i.e., prélaiveides livres d'amolecimento por surtos passadistas).
Conto do life hei-de

Tinham-se conhecido num concerto, ela ainda corria descalça mas ele já vinha saído dum aperto; improvável aquele encontro, mas mais uma vez o narrador prepara o arranjinho: dá-lhe um toque no vestido, põe-lhe os joelhos a brilhar, cozinha-lhe um coração ferido e uns olhos a arregalar. Tudo se torna possível naquele relvado, desde um beijo inesperado até um abraço apertado, desde o desejo mais viscoso até ao desabafo mais doloroso. A música agora era calma e por isso dedicaram-se a constatações: verificavam-se mutuamente, queriam anular as diferenças e reduzir as surpresas, o narrador deixou que eles se continuassem a enganar porque não queria interferir no alinhamento do concerto, vejam lá; mas o que não tem conserto consertado está: dali ia sair uma vidinha a dois, algumas fornicações ainda teriam a gloria dos encores, depois alguns sins começariam a dar em pois, e no final já não se distinguiam os acordes. Foi preciso arranjar outro concerto, entraram de mãos dadas, roçaram-se como nos velhos tempos, ele mordeu-a no pescoço, ela chegou a estremecer como uma amante ensinada, sabiam que já estavam a roer a paixão na zona do osso, riram-se numa tonalidade menos amarelada, depois choraram, depois riram, e foi só o que este olhos viram, porque eles depois foram para trás dum arbusto ansiando pela emoção juvenil dum susto, confiando-se naquele sexo reparador, religioso, dos livros. Mas ela saiu de lá descalça, trazendo no cabaz um ‘hei-de ser capaz’, era bom sinal, estava pronta para sofrer outra vez, essa sim a verdadeira garantia da felicidade, e esta sim a verdade em apreço, o coração d’ele era apenas um adereço. Um cinto para apertos.
Dramas do maximalismo

Hoje não tive nenhuma vagem cozida que me acompanhasse.
Projecto de vida : sentado & calado
Primeiro parece que levei tampas das gajas, agora foi de deus, viro-me por isso para a música.

Eu confesso que gramo o Jamiroquai. É pá gramo, pode ser coisa apanascada, pode ser coisa do mau ouvido, micose no tímpano, neurónio sifilítico, hemorróidas groove, eu sei cá, pode ser tanta coisa. E foi por isso que li a critica do público sobre o último disco (que ainda não ouvi pois andei com os lambshop e ….bem, foi o que se viu…) a dizer que não presta e acabei por encontrar ali novamente todo um projecto de vida: ‘funk, soul, disco e easy listening’ e as letras ‘amor, alusões sexuais, festa e um toque de consciência social’, sem falar da ‘electrónica ali’ e ‘guitarra mais esgalhada acolá’(por acaso esta última expressão até me doeu, mas adiante). Eu, em sinceramente, não sei o que é que estes gajos, que a modos que são críticos, fazem com a música que ouvem, aquilo metaboliza-se-lhes ao nível da enzima pela certa e passam todos a lado duma vida de plena satisfação, com as entranhas repletas de areia virílhica e a carola exageradamente solfejada. Então o final é esclarecedor: ‘os fãs vão gostar, os cépticos não vão mudar de ideias’; pronto, eu já sabia, afinal é tudo como nas nas gajas e religião, ou seja o mundo podia definir-se em ‘coros femininos e inclusão de cordas funk’. Mas eu sei pouco disso. Refiro-me a coros, claro.
‘Oops! I did it again’

Dedicado e enternecido com a bomba que é – a milhas - o meu blog religioso preferido

Existem essencialmente duas formas de conservar o sentimento (ou dimensão – é mais fino – ou fervor – é também muito asseado) religioso: a ‘pascalização’ ou a ‘ paroquização’. Mas já lá irei, impõe-se sempre um intróito e desta vez não é para maiores de 18 (isto é rima algébrica)
A fé é uma virtude teologal de registo muito sobrevalorizado, tornou-se uma espécie de antibiótico de largo espectro daqueles que se toma à primeira dorzinha d’alma e que nos dá um consolo tipo sopinha de carneiro a aliviar um intestino que esteja em brasa por exemplo com uma moral sexual que se bamboleie à nossa frente sem pedir licença à dona da casa. É pois uma virtude muito enganadora e nem o bom ladrão se safou apenas com ela.
Quem esquecer que a Igreja Católica é uma igreja de vocações e de caridade terá muita dificuldade em enquadrar (é como o sacana daquele rabo que não pára de mexer há mais de meia hora na mcm, o tipo que inventou a curva também deveria ter direito à glória dos altares) a fé e de sobreviver ‘apenas’ com ela. Mas muitas vezes, como é sabido, uma pessoa não tem mesmo mais nada, nadinha, onde se agarrar – agora estou a referir-me à fé.

Algumas discussões relativamente enfocadas na moral sexual e rodeos ‘cesarianos’ ( saiu-me outro termo para-ginecologico mas foi sem querer ) afins levam-me então para a sintetica escalpelização dos dois sofisticados processos que a mente e a vontade utilizam no sentido de nos safarem de sermos uma mistura mais ou menos folclórica entre calvinistas e astrólogos.

A ‘pascalização’ é um método muito apreciado, exige uma certa capacidade de ironia interior, a valorização duma certa decadência existencial, é no fundo uma espécie de racionalismo embebido em petróleo sempre pronto a arder no primeiro contacto com a faísca do mistério, mas com um bom acordo com a associação idealista dos bombeiros. Conserva-se assim a fé como quem injecta produtos químicos para controlar a fermentação mas ansiando que ninguém se lembre de mastigar muito daquele petisco. Mas vai funcionando, desde que cada um conheça bem o seu prazo de validade.

A ‘paroquização’ é o outro processo também usado em diversos ambientes que não o religioso. Trata-se de pensar em conjunto, dar à nossa alminha o calor da companhia, o aconchego do ‘há outros que dão o ámen ao mesmo compasso que nós’. A alavanca faz de rolamento simultaneamente e é o milagre mecânico da religião feita carrocel e farturas: e temos a certeza que no final haverá sempre alguém para ficar com as rifas da quermesse. E como ‘fora da igreja não há salvação’ já se sabe, pelo menos estando dentro um tipo dessa dúvida anda mais aliviado. É a comunhão dos santos comprada como brinde dum scrabble de ladainhas.

Viver a nossa condição é, sabe-se há muito tempo, um trabalho para a mente, para a vontade e para aquela coisa esquisita, quase filha da puta, coisa de gajas e gajos, que é o coração. Por isso a real mensagem, o real ensinamento do cristianismo é este: como amar a Deus. A vida é um test drive. Espero que, no final, quem conhecer que me compre.