Últimos Parágrafos #5


«Comprou finalmente o seu direito a ser escravo por duzentos dólares. A vida livre trouxera-lhe dissabores dos quais nunca se soubera desenvencilhar de forma conveniente e ficara com frequência encurralado entre escolhas várias. Encruzilhadas, Bifurcações, Alternativas, Opções, de tudo isso ficaria agora dispensado, pagava para que decidissem por ele, era a melhor aplicação para as poupanças que lhe restavam. Quando Philip lhe perguntou se não viria a ter saudades de ser livre, respondeu-lhe com um sorriso condescendente que a liberdade apenas lhe servira para ter comido gelado de pistacho quando afinal baunilha teria sido mesmo a melhor escolha. Só a escravidão lhe permitiria apreciar a desilusão como destino e o destino como ilusão. Comprou roupa nova com os seus restantes cem dólares e entregou-se a uma instituição pública como funcionário para todo o serviço. Tomariam conta dele como numa utopia comunista falida, e fariam novamente doutrina consigo. Adquiriria estatuto de case study e daqui a uns anos certamente um econometrista em busca de fama se haveria de lembrar dele para tomar conta de alguma abcissa.»

in Purificação, de Raimundo Múrcia, edições Mosca Morta, 2013

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