Sexta-feira e sala cheia. A proximidade do fim-de-semana
descontrai-nos e põe os sentidos mais disponíveis para o lado deseconómico da
existência: comer mais do que precisamos, correr mais do que precisamos,
descansar mais do que precisamos, pensar mais do que necessitamos, conviver
mais do que necessitamos, beber mais do que necessário e etecetera e tal mais
do que necessitamos. Como que a compor o ramalhete L. trazia vestido uma saia
também um pouco mais curta do que aquilo que seria necessário para ela, mas um
pouco mais comprida do que seria necessário (e proveitoso) para mim. Ainda me
lembro da primeira vez que lhe vi as pernas (um bom bocado delas, para ser mais
rigoroso) despidas pela primeira vez ali junto ao rio. Já levava a memória um pouco
acima do joelho dela quando fui impelido a escolher o menu pela
empregada-dos-molhos. Reparo de caminho que ela também é benfeitinha, benza-a
deus , e escolho bacalhau à Brás sem perder muito tempo a exercitar o pouco
livre arbítrio que ainda me resta. Já vou no terceiro dia que retomei as minhas
idas ao restaurante e a L. ainda não me dirigiu palavra nem sequer se aproximou
a menos de 15 metros. Haverá criminosos com medidas de restrição menos
exigentes. Via-a a sair da cozinha a rir-se, seria certamente uma piada boa
porque se manteve num estado quase efusivo durante mais de 10 segundos. A
última vez que eu a tinha feito rir assim já fora à custa de muito esforço.
Acho que agora terá a minha imagem fixada mais como um filho da puta do que
propriamente como um gajo engraçado, mas nem sequer um grande filho da puta,
apenas aquele tipo de filho da puta que ainda recentemente foi desmamado de
tipo-sem-interesse. Chegou a sentar-se junto dos clientes que estavam na mesa
mais próxima do balcão, notava-se que eram clientes que se tinham tornado mais
regulares recentemente, e ainda alimentou alguma galhofa técnica, o suficiente
para fixar o charme necessário para um negócio em fase de ivas majorados. E foi
assim, entre necessários, suficientes e insuficientes que acabei por tomar um
café já frio; bem a condizer. Estupidamente fui até ao balcão sob o pretexto de
pagar a conta mais rapidamente e ainda tive tempo de ouvir do lado de lá da
cortina de ferro: ele sabe que aqui nunca pagará nada. Saí como se fosse um Barrabás
em corpo de Lázaro.
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2 comentários:
Viva! delicioso...
beijos
Viva! São os seus olhos, são os seus olhos! :)
beijos
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