Entrei confiante. Estava um dia frio e o calor do
restaurante trouxe-me uma tranquilidade de que não estava à espera. Já sentado
ainda me veio ao paladar da memória aqueles cabrões dos tomates cherry. Nada
puxa mais pelos instintos de vingança que um mau sabor de boca. Mas hoje tinha
uma missão que estava para além do almoço: precisava de a confrontar com o meu
olhar. Eu sabia que se ela sentisse o meu olhar pousado nela jamais o seu corpo
me conseguiria mentir. Um gesto, um olhar, uma ondulação de corpo, qualquer
coisa a iria atraiçoar, e isso dava-me aquela margem que um homem, que se sabe
& sente enganado, precisa para enfrentar o destino. Antes que o empregado
pudesse esboçar qualquer estratégia pedi arroz de coelho e outra vez antes que
ele tentasse uma manobra de diversão com sugestões de bebida, usei aquela
palavra que tudo mata num restaurante: água, só água. Flanqueadas as primeiras
hostilidades concentrei-me na tarefa de pôr os olhos em cima de L. Como não
consegues copular vais coocular, sussurrava-me o filha da puta do
grilo-falante-dos-trocadilhos, o gricadilho. Mas eu estou muito treinado em
enviar consciências para o caralho e já estava a saborear o coelho quando L.
entra pela primeira vez na sala. Via-se que tinha posto o escudo contra olhares
e voltou para dentro rapidamente. Nem napoleão fazia reconhecimentos de terreno
tão rápidos. Ela está incomodada com a minha presença, foi o que disse o
criptógrafo que tenho sempre no bolso. Talvez esteja complexada por me ter
tratado sempre tão mal, disse-me o ingenuoscópio q tenho no outro bolso. Tirei
as mãos dos bolsos e pus-me na alheta antes que viessem condescendentemente dizer
que eu não pagava, como de costume.
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1 comentário:
a falta que eu sentia desta prosa... :)
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