Hoje apeteceu-me começar pelos doces. Pedi um gelado para
começar, para me encher logo à partida. Lançaram-me uns olhares estranhos mas
não passou disso, sentia-se conformismo no ar. Era um dia calmo no restaurante,
mais de meia casa mas de gente sossegada, sem exigências especiais e também sem
grandes intimidades com os empregados, tirando numa das mesas em que estava um
tal de S. que tinha sido sócio do pai de L. no arranque do restaurante e por
quem ela tinha – sempre teve - um certo fascínio. Cheguei a falar com ele uma
ou duas vezes, era um tipo cheio de interesse e via-se que olhava para a L.,
para desgosto dela, com um carinho paternal. Hoje vivia entre Angola e cá,
seguindo um roteiro muito preenchido e não se percebia bem se a vida lhe corria
de feição ou apenas geria a fortuna como quem gere a gaveta das peúgas. Depois
do gelado pedi uma espécie de empada de lebre, um prato com ares alentejanos e
que, obviamente, não encaixou bem depois dum gelado. É irritante quando
queremos subverter uma ordem qualquer e a coisa não nos corre bem. A L. depois
de cumprimentar S. chegou perto da minha mesa e perguntou se se podia sentar.
Estava com um ar triste e cansada mas ainda foi buscar recursos para me dar um
sorriso pelo qual eu ainda nada tinha feito por merecer. Desde que a conheço
que é a única pessoa que eu sinto ter de merecer. Isto é uma fragilidade de
merda, sem qualquer explicação e que me condiciona como se fosse uma dor lombar
que me faz andar de lado a pedir licença às costas para endireitar o pescoço.
Peguei-lhe na mão, algo que não fazia há anos e subiu-me pelo corpo (também desceu) a desagradável
sensação de que a tinha perdido. Comemos um gaspacho juntos e eu saí ainda com
os lábios vermelhos a ruminar à volta duma tal de sorte macaca.
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