Hoje o restaurante transmitia uma boa disposição para a qual
eu não conseguia encontrar explicação, nem sequer impressão, nem sequer aquele
instrumento híbrido da mente (eventualmente fusão dos dois anteriores) que é a
célebre intuição. Não percebo mesmo como nunca apareceu nenhuma corrente
filosófico-artistica chamada intuicionismo (tipo gnosticismo laico) que aqui me
daria certamente elementos para caracterizar o ambiente de frescura e alegria
que se vivia naquele restaurante. A L. apresentava uma espécie de melancolia da
família do desgosto leve, mas bem disfarçada por uma pose absorta, como que
indicando que as mamas estavam na sala mas a alma ficara a marinar junto à
batedeira numa tigela com piranhas em vinagrete. De todo o modo, hoje foi o
primeiro dia, desde que tinha voltado ao restaurante, em que pude observar bem
o corpo dela. Não sei se foi de propósito mas o que é um facto é que ela várias
vezes se encostou ao balcão com aquele ar de diva em pleno exercício do seu
múnus gastronómico, parecendo querer ilustrar o momento do Génesis em que Deus
Todo Poderoso, depois de hesitar, decidiu arredondar mais o corpo da mulher
qual ampulheta a mostrar ao homem que por vezes têm areia a mais para a sua
(deles) camioneta. Pataniscas e arroz de tomate, nada mais adequado para um dia
com tais enquadramentos, e ainda uma passagem da rapariga-dos-molhos pela minha
mesa, com um ar de vampira a servir raminhos de salsa, largando a enigmática
deixa: « ‘Ela’ manda dizer que ao senhor também lhe caia bem uma dietazinha».
Touché. Será que se avizinha uma concordata pelo lado do cardio-fitness? A
carne tem razões que o molho desconhece. Saí intrigado mas animado. O homem
encontra esperança onde um qualquer outro animal apenas descobriria um sítio
para mijar à vontade.
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