Hoje almocei com o Ernesto. É a mente mais brilhante que
conheço. Dá quase raiva assistir aqueles momentos que se produzem na cabeça
dele em que a intuição se abraça à dedução e saem ideias que flutuam que nem
bolinhas de sabão, que nós, ao irmos para as agarrar, vemos desfazerem-se numa
névoa fugaz e mágica. Inevitavelmente acabámos por falar da Simone e da
Custódia. Há um incomodo profundo no seu interior, parece saber algo, ou
pressentir algo, não sei, de repente fica bruto, radical, não foge ao tema mas
torna-o tão desagradável que temos logo que o abandonar. Hoje disse-me que o
Raimundo é um cabrão e que devia ter sido ele o envenenado, que a Custódia não
sabia o que andava a fazer, que andava a brincar com o fogo, enfim, foi uma
sucessão de observações básicas mas ou mesmo tempo sinuosas e atordoantes que
me deixou incapaz de reagir. No final ainda perguntou se a Simone já me tinha
falado sobre a morte da Custódia. Já nem me lembro o que respondi, e a última
coisa que eu faria seria comentar o que quer que fosse sobre a Simone. Antes de
se ir embora deixou-me esta bomba na mão: vou ter um filho da Simone. Só lhe
respondi, - devia estar bêbedo - «bonito serviço». Riu-se, - com aquele sorriso
típico dos vingativos profissionais e compulsivos - disse-me que iria ser
entrevistado pela Mel & Fel, e foi-se.
Excerto do Diário
de Salvador Alves Arinto, entrada de Maio de 2014, apresentado em
pré-publicação em Maio de 2015 no Agregador Cultural Sigma.
2 comentários:
caramba
já vais em 2015
estás em expansão acelerada como o universo?
já não se pode ter um espirito visionário!?...caramba.
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