«Comprou finalmente o seu direito a ser escravo por duzentos
dólares. A vida livre trouxera-lhe dissabores dos quais nunca se soubera
desenvencilhar de forma conveniente e ficara com frequência encurralado entre
escolhas várias. Encruzilhadas, Bifurcações, Alternativas, Opções, de tudo isso
ficaria agora dispensado, pagava para que decidissem por ele, era a melhor
aplicação para as poupanças que lhe restavam. Quando Philip lhe perguntou se
não viria a ter saudades de ser livre, respondeu-lhe com um sorriso
condescendente que a liberdade apenas lhe servira para ter comido gelado de
pistacho quando afinal baunilha teria sido mesmo a melhor escolha. Só a
escravidão lhe permitiria apreciar a desilusão como destino e o destino como
ilusão. Comprou roupa nova com os seus restantes cem dólares e entregou-se a
uma instituição pública como funcionário para todo o serviço. Tomariam conta
dele como numa utopia comunista falida, e fariam novamente doutrina consigo.
Adquiriria estatuto de case study e daqui a uns anos certamente um
econometrista em busca de fama se haveria de lembrar dele para tomar conta de
alguma abcissa.»
in Purificação, de Raimundo Múrcia, edições Mosca Morta,
2013
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