«O diabo saiu-lhe do corpo pelas três da tarde. Aproveitou e
foi beber uma cerveja bem gelada testando de caminho em que estado lhe tinham
ficado as entranhas. A primeira sensação foi boa, afinal o diabo deveria ter
passado o tempo apenas em zonas mais subidas, e o paladar também não o traiu, exceptuando
um certo travo exagerado, mas esperado, a enxofre. A ultima golfada foi
acompanhada duma ave-maria mental, uma espécie de oração de circunstância mas
eficaz. No pires ainda jaziam uns quantos cajús, que de forma
súbita começaram a exalar um odor bafiento e acre. O diabo esconde-se nos
aperitivos, riu-se. Sentia-se verdadeiramente aliviado, tinham sido dois anos
de convivência controlada com o maligno, sem subsídios, sem nenhuns apoios,
contra a opinião de todos, sem nunca saber ao certo onde estava metido,
diga-se, mas guardara a última moeda no forro das calças para o exorcismo e
vencera a tentação de a trocar por um arroz de lampreia; afinal um arroz de lampreia não passa
dum arroz de lampreia e uma alma sem diabo ainda é um mar de oportunidades.»
in Infernizar, de Dário Carneiro, edições Choco com Tinta, 2013
2 comentários:
sobretudo gosto da cerveja bem gelada
sim, a cerveja faz toda a diferença
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