Comam fibras, muitas fibras.


É interessante verificar ( analisar é já enfadonho) algum ‘fascínio’ que o novo Papa exerce em não-crentes-de-matriz-intelectual-conservadora ( foi assim a definição mais jeitosa que encontrei). Eu tenho poucas declarações de interesses a revelar aqui: sou apenas católico apostólico romano, leio o que o cardeal Ratzinguer escreve há carradas de anos, sempre preferi a Sta Teresa, o Dostoievski e o Hamlet, e gosto mais de uma patuscada de pasteis de bacalhau com arroz de tomate do que da reflexão (cristã ou não) em torno da história cultural da Europa e do cálculo matricial judaico-cristão do nosso totoloto civilizacional.

Antes de tudo note-se: o Catolicismo sempre se ‘fundou’, ‘aprofundou’ e ‘evoluiu’ no equilíbrio entre um debate doutrinal forte, uma espiritualidade rica e plural, e uma economia de incertezas e mistérios.

Apelar às bondades culturais da profundidade teológica é uma moda intelectual recorrente e muitas vezes vem associada à tentativa de ‘menorizar’ o valor cultural da crença não racionalmente estruturada (não estou a dizer justificada); agora já nem me lembro bem o que queria vir para aqui dizer, certamente irritado por qualquer coisa que li ou ouvi no intervalo entre dois yogurtes de fibras, mas eu adoro sentir-me irritado, se calhar vou beber mais um, e de caminho cito uma passagem da 1ª encíclica de Bento XVI, sobre a qual até já estava a parecer mal não dizer nada (ainda o patriarcado me tirava o patrocínio): «A força divina que Aristóteles, no auge da filosofia grega, procurou individualizar mediante a reflexão, é certamente para cada ser objecto do desejo e da paixão (...) mas ela mesma não necessita de nada e não ama, é somente amada. Pelo contrário, o único Deus em que Israel crê, ama pessoalmente. Além disso o seu amor é um amor de eleição: entre todos os povos, Ele escolhe Israel e ama-o – mas com a finalidade de curar, precisamente deste modo, a humanidade inteira. Ele ama, e este seu amor pode ser qualificado, sem dúvida, como eros, que no entanto, é totalmente ágape também». Não sei se estão bem a ver. Isto é forte (ou fraco) demais para quem quer encontrar principalmente um denominador cultural ou fideista no cristianismo, e ainda mais para quem nem toma atenção a que a Igreja foi edificada sobre a cabecita dum dos apóstolos que aparentava menores capacidades para ser modelo ou cátedra do que quer que fosse, o tal Pedro que O havia de negar três vezes. Uma doutrina firme e dura e ‘fechada’ tanto pode funcionar como arma de arremesso como de escudo para uma alma. Tudo depende da sua predisposição e da elasticidade dos movimentos das fibras intestinais. Acreditar é uma mucosidade e amar é um espasmo.

O passado, o presente e o futuro do Cristianismo, do Catolicismo, será sempre essa misteriosa Odisseia de reciprocidade de amor entre dois seres desiguais. Demasiado viscoso para as novas sociologias comparadas. E a Igreja será sempre ¼ perturbação ¼ consolo ¼ empolgamento e ¼ organização tanto para quem está aparentemente dentro como para quem está aparentemente fora.

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