Posta restante: "Não se cai no ridículo, sobe-se no ridículo." - António Ferro (Teoria da indiferença – da arte e da vida)

O direito de resposta #2

A-da-Gorda, 16 de Julho de 2004

Meu caro senhor Félix

A sua atenção e dedicação só se compara à dos suspiros de amêndoa que se me colam ao tabuleiro por mais farinha que lhes ponha por baixo e deixe-me dizer-lhe que agora até fiquei com pena de não os ter tido ao balcão para que os pudesse provar mas lá em casa comem-nos todos antes do amanhecer e, quando me ponho a pensar sobre o assunto, concluo que seja por causa da Lua. Não, eles não uivam à Lua como os poetas e os cães! Comem, simplesmente. Fica assim a perceber por que tenho tanto trabalho na cozinha com tão pouco material no balcão; mas, veja se percebe, o que tenho é com muita atenção aos desejos da clientela. Aliás, já que fala nas "tartelettes" de "causa e efeito" é bom de ver que só as faço por pedido expresso e para clientes muito especiais; às vezes lá sobram e há quem as prove mas é mesmo por acaso e deve ser por caírem fora do tempo que fazem azia; também pode ser por caírem fora do prato ou por causa da carne utilizada, há quem se dê bem e quem se dê mal, já se sabe que é uma questão de estômago para pratos reaquecidos feitos a partir de restos. Por outro lado não quero deixar passar a oportunidade sem lhe recordar que faço pratos de encomenda e, por conseguinte, bastará que me envie o aforismo que pretende revisto e esforçar-me-ei por decorá-lo a seu contento ainda que seja com uma imagenzinha do "menino-das-lágrimas" que, pinderiquice por pinderiquice, vai a dar no mesmo que o cavaleiro solitário do Sahara ou que algumas coisas que aquela mocinha que ainda não decidiu se é inglesa ou portuguesa, uma Isabelinha que tem uma revista, costuma escrever. Já a Inês é mais "fazes-me-falta", sempre um molho de belo efeito como tempero de saladas até quando se sem moderação ou quando se pretende um efeito garantido no polvilhar dos confettis. A Betinha, a mocinha brasileira da oficina de automóveis onde vou, hoje também me recomendava que usasse um novo produto cuja representação ela tem por cá e que vende muito bem: um "topping" para os gelados com o nome genérico "m'apaixonêporsuaspalavras" mas que existe em vários sabores e texturas que incluem variantes sem palavras. Nem lhe digo nem lhe conto! é cada vez mais difícil gerir a doçaria do pronto-a-comer com tanta oferta rica em adoçantes artificiais no mercado mantendo o cuidado de não exagerar, para mais ou para menos, no de cana. Gosto muito de o saber vivo e de boa saúde e daqui lhe envio, soprado como faria a uma peninha de colibri perdida na ponta dos meus dedos (é da alergia a peninhas e coisas assim, sabe? mas com Claritine bem doseado e mantendo-me longe da causa passa depressa), um beijinho doce como o dos "ziguezagues" azeitados que a Micas sempre me recomendou que fizesse para amaciar, perdão, cativar os clientes antes de lhes apresentar a conta.
Atenciosamente à sua disposição,
Carlota S.


Servido por Posta restante. # 08:30

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