Apenas o sexo

dos dias



Como se os demagogos e os homens sem ideias não pudessem fazer bom uso do poder. Como se da confusão, da irresponsabilidade, da frivolidade, do jogo de interesses não se pudessem forjar governações fortes e arrebatadoras. Arrepia um bocadinho, concedo, mas bolas, um arrepio sabe quase sempre tão bem, e depois pode-se fumar um cigarrito, ou ficar a olhar para o tecto, ou ficar a treinar o sorriso malandro, ou o meigo, ou ir beber um copo de água, sabe tão bem um copo de água depois dum arrepio, um ginger ale também dá bom efeito, ou pegar num livro ao calhas, tem de ser é ao calhas, e recuperar do estremeção cardíaco como um ciclista trepador, e voltar a treinar o arrepio outra vez, arrepiando caminho até ao “primeiro estranha-se e depois entranha-se” que o Portugal dos Pequeninos recuperou há uns dias com seu muito peculiar empenho, e que eu agora também repesco.  Nesta espelunca (fica tão bem este falso miserabilismo) eu até já tinha escrito em tempos (fica também tão jeitosinho dizer isto) que a «realidade não é sexual porque é impenetrável», mas reparo agora que ela poderá ser de facto entranhável, e isso acaba por lhe fazer corresponder uma sexualidade mais romântica, mais flaneurizada, mais inconsciente, mais inadvertida, e divertida quem sabe, no fundo, se calhar, uma sexualidade mais ajustada aos dias que correm. Que valoriza mais o contacto, a tangencia, valoriza os conceitos a esfregarem-se uns nos outros, pois poucos serão agora os conceitos que gostam de ir em frente aproveitando as brechas abertas pela obscena dúvida. A sexualidade da moda e dos dias é a do entrelaçamento, arriscaria: da fornicação mímica, uma espécie de permanente “na cama com Deleuze” (salvo seja), ou um eterno brincar às enfermeiras, não, também não é puro voieurismo, pois tomou-se o gosto de pôr a mão na massa temos de reconhecer, sim, vivem-se momentos dalgum besuntamento, que talvez dure mais que nove semanas e meia sou agora forçado a admitir. Bem, haja alguém que filme isto em condições, é o meu desejo.



Nota final ginecológica (que também já não fazia há muito tempo): Mas lá porque vivemos momentos de esperanças difíceis ou estéreis, não se pode querer resolver isto com uns bebés "profetas". Tal como as mentes demasiado gastadoras de ideias não se tratam com a "insovinação" artificial. Há que dar tempo à placenta dos dias, e ir controlando o deficit, hormonal, claro.

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