Dia da Mãe



Arriscaria a dizer que já ajudei a “construir” duas mães. Não... não sou avô! As mães que eu ajudei a “conceber” foram a minha própria mãe, e a mãe dos meus filhos. Tenho de repescar aqui novamente a expressão de Mia Couto: “Um filho, afinal, é quem dá à luz a sua mãe”.

Mas ao pensar nisto lembro-me outra vez do livro das “ Memórias de Branca Dias” de Miguel Real. Um texto vertiginoso e envolvente, que acabou por me deixar também relativamente marcado pelas passagens relativas aos muito peculiares partos da personagem, recheados dalguns requintes tipo “Kill Bill na maternidade”, por exemplo: «quando não suportava mais as dores e a barriga se me descaia para a terra, eu alçava a unha afilada do mindinho direito e zás, cortava a carne, a matriz abria-se em pregas, e eram eles a sair (...); mas antes, referindo-se ao primeiro parto, até já tinha dito : « eu gritava e chorava ao mesmo tempo, fazendo força, querendo expulsar aquele bubão de carne que me afligia as entranhas, a minha mãe continuava, empurra, empurra, dizia ela e eu fazia força, a carne a rasgar-se-me, os ossos a rangerem, eu empurrava como podia (...) levantei as coxas, queria sair dali, espojar-me na terra, rebolar, (...) guincha que alivia». Chiça!



E é nesta altura que eu me retenho numa outra “realidade”, talvez até mais crua que a própria paridura. A “qualidade” de mãe julgo que é acompanhada duma das maiores solidões que a nossa condição nos reserva. Uma mãe é totalmente só na sua circunstância, no seu apego ao filho, na sua dependência dele. Inexoravelmente. Reproduzo aqui talvez o lugar comum por excelência: precisar doutro para ser verdadeiramente só. Nunca a um filho, ou a um pai lhes será revelado esse mistério. Também está na sua condição serem ignorantes daquilo que ajudaram a empreender. E se calhar reféns duma eterna dívida, mas bem camuflada pela famosa “ ordem natural das coisas”. O livro da judia que fugiu para o Brasil explica.

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