O Conde Corado


No reino tinha estalado o escândalo. O Conde deixara a noiva à beira do altar e fugira com uma amante estrangeira de seu nome Eurora. Várias razões, todas moralmente inválidas, saliente-se, eram invocadas nos mais diversos foros de coscuvilhice do reino, desde os oficiais (o parlamento do reino) até aqueles mais informais (o barbeiro de sua majestade, ou a dildograria das princesas solteiras) passando pelos clandestinos (o bordel da tia Conspurcácia, onde o Rei se abastecia regularmente de pecados, nos intervalos da virtude).

A escandaleira passou as etapas definidas pela praxe estabelecida no Grande Protocolo da Hipocrisia e, passado algum tempo, o Conde já dava entrevistas, de mão dada com Eurora, dissertando sobre o futuro do Reino e o seu enquadramento nas mais diversas galáxias, ao ritmo de suaves acenos de queixo providenciado por uma corte de fiéis semi-defuntos que aumentava de dia para dia, alimentada de subsídios e indulgências várias.

Mas Eurora era uma mulher ambiciosa e dada a excitações de vária índole. Cobiçada por muitos, temida por outros tantos, fazia razias de deboche por entre os mais diversos sultanatos, deixando por geografias várias um rasto de destruição na reputação no Conde. Este, ocupado com as suas propriedades e com o destino histórico do Reino, limitava-se a encolher os ombros, a alargar as costas e a exercitar de quando em vez os quadris sempre que a mulher o levava a despacho.

Entredentes corriam certezas sobre a sua impotência e incertezas sobre a sua úlcera. Aparentemente o duodeno não estava a acompanhar as exigências de um estadista em fase de corno. Ora Eurora também não lhe queira mal e quando o deixasse haveria de fazê-lo em beleza, dando-lhe a chance de mostrar a si mesmo o garanhão que galopava nas suas entranhas. Humilhante na traição mas magnânima no abandono.

Pegou mão das suas melhores lingeris, adornou-se com as suas melhores hormonas, colocou um avatar de Afrodite em cada curva do seu corpo e atraiu-o para a grande armadilha do prazer. O conde nem queria acreditar em tamanha revolução. Afinal tudo não passavam de mal entendidos e mexericos corroídos pela inveja. Ali estava ela estendida, como uma Mata-Hari de Calcutá, num altar de luxúria e reconciliação.

Mas eis que o mais temível movimento intravenoso aconteceu: quando ela se apresentou louca e disponível, frágil e devoradora, o sangue do Conde baralhou-se no tráfego e, em vez de se apresentar de rompante nos locais mais desejados pelo desejo, não, espalhou-se, qual delta de Nilo à beira de Mare Nostrum, pelas generosas bochechas do Conde, que terminaram a noite num hino ao mais belo entrecôte.

Quando o Rei o viu largou todos os seus afazeres, refazeres e desfazeres, e deu-lhe a medalha do Rosto Ejaculado do Reino.

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