vai-se a ver é carolina herrera


Os nuestros hermanos, que não podem ver nada, na impossibilidade de arranjarem um consultor da onu porque são fracos em línguas, desencantaram um tal de Mulas Granados - que por acaso terá participado num tal de estudo do FMI - que escrevia artigos sob pseudónimo numa tal de fundação. Convenhamos que se esforçaram, mas não é nada que se pareça com o nosso baptista da silva. Aguarda-se agora a divulgação da marca da mala que vão oferecer às suas pepas xavieres.

alô, fala dos mercados?

Seguindo os sábios conselhos dum ex-membro da confraria do bacalhau e consultor pro bono da ONU o governo requereu o alargamento do prazo de pagamento da dívida pública, já só falta Gaspar dar uma mala Chanel a cada pensionista para apaziguar o tribunal constitucional e tudo voltará à normalidade.

dou-vos um mandamento novo


Nós somos aquele país que acaba o ano com um baptista da silva e começa o seguinte logo com uma pepa xavier. Por outro lado, não satisfeito com o tsunicómio criado há uns meses atrás, o governo mete moeda e saca dum relatório efemirizado, revelando que afinal se consegue voltar ao Estado equilibrado de salazar e caetano ( esta expressão continua a ser bastante boa, que fazer) sem precisar de pôr ninguém no tarrafal desde que uns quantos se contentem em ir viver para debaixo das pontes. Como democrata evoluído estou completamente de acordo com tudo desde que não me calhe. Como regra, o democrata evoluído deve pensar apenas nos seus interesses e por duas ordens de razões: a) somos os melhores a saber os nossos interesses (isto faz parte da evolução, por exemplo no tempo do Estado de Salazar e Caetano eram eles quem sabiam o que era o melhor para nós); b) não devemos ajuizar dos interesses dos outros porque nos podemos enganar (enganarmo-nos faz parte da evolução, antes praticamente ninguém se enganava porque morria relativamente cedo). Esclarecida a minha posição, serve o presente apenas para declarar que se deus nosso senhor me proteger presentemente prometerei votar pelo bem comum nas próximas eleições.

A Fiscalização Sucessiva


A Magna Carta

Marília e Maurício, após dois anos de namoro oficial marcado por uma oscilação programada entre momentos de parcimónia hormonal e de exaltação erótica, decidiram aderir a uma fórmula histórica e sociologicamente testada com relativo sucesso logístico por uma longa série de gerações de alegados descendentes de Eva e decidiram-se casar em detrimento de outras soluções antropologicamente válidas como a escravatura sexual ou a promiscuidade.

Bem e mal alertados por gente com boas e más experiências dotados de boas e más intenções, decidiram de mútuo acordo, passe a redundância, estabelecer, conceber, redigir, assinar e registar uma 'Carta Conjugal' que enquadrasse a sua futura relação matrimoniosa; seria um documento com óbvios efeitos internos no casal mas também com relevância para terceiros, sabido hoje que todos os terceiros são incluídos, ao contrário do que poderia transparecer dalgumas leis da lógica simplificativa.

Foi num dia de chuva molha-parvos que se dirigiram a um notário ali às Avenidas Novas, curiosamente especializado em testamentos para toureiros e em divórcios derivados do exercício de prepotência sexual feminina, a fim de deixarem solenemente registado o documento que lhes haveria de constitucionalizar os direitos, liberdades e garantias matrimoniais.

 Como enquadramento geral sabe-se que Marília tinha um rico historial de assédio, ou nalguns casos mero encosto exploratório, por parte de homens de bom porte, enquanto Maurício se arrastara com algum sucesso lúdico por ambientes de marginalidade sexual onde se privilegiava uma espécie de blitzkrieg erótico, também conhecido por orgasmo rápido.  

 Apesar deste documento não ter como objectivo a mera calendarização de actos sexuais e peri-sexuais , tanto na sua quantidade como qualidade ( daqueles que dão origem ao célebre e pitoresco : «eu cá fodo às quintas, quem está, está ») seria incontornável que estes fossem minimamente aflorados nesta forma contratual. Contudo, o corpo desta ´Carta Conjugal' afastava-se dum mero acordo pré-nupcial e visava essencialmente estabelecer qual o lugar dos valores fundamentais da mátria conjugal, como sejam o amor, o sexo, o carinho, a esfera íntima , a partilha obrigatória e a facultativa, a reprodução, entre muitos outros, e, não poderia faltar, a definição das circunscrições principais para as fidelidades, os excessos e os plafonds de recusa e rejeição.

 Tentando não causar escândalo nem embaraço na leitura notarial e pública do documento, nos artigos em que se regulamentavam as práticas de sexualidade mais recreativa tentou-se utilizar uma linguagem que, sem deixar de ser objectiva e isenta de ambiguidades, pudesse assinalar alguma motivação poética-cientifica subjacente. Assim, podiam encontrar-se normas que se referiam ao «botão de rosa plantado no ribeiro do Vale da Nádega da mulher», ou à «polpa do grande labial da consorte», como também tudo o que relacionasse a «suprema vaginalidade feminina» com a «sumarenta língua do parceiro», chegando até a referir-se que «a geometria da cópula deverá ser escolhida em regime de permanente alternância». Enfim, todo o articulado tinha de estar ao serviço do sucesso do Acto Único Conjugal que se pretendera regulamentar, sempre sem descurar a tradição historico-jurídica em que estava inserido.

 Uma das salvaguardas importantes da Carta Conjugal foi aquela em que Marília e Maurício assumiram que o serviço sexual subjacente à sua relação era tendencialmente gratuito, ou seja, tudo deveria ser feito de molde a que não houvesse ocasião para cobranças excessivas em nenhum caso, inclusive nas práticas mais arrojadas que fossem permitidas ao parceiro, nem, por isso, nas experiências efectuadas por qualquer deles fora do Serviço Matrimonial de Sexo (SMS), ou seja, nos chamados Sub-sistemas privados de Pulo da Cerca.

Outro dos capítulos mais importantes deste documento fundamental era o que dizia respeito às amizades que extravasassem a mera cordialidade social e profissional convencional.  Ficaram definidas as «zonas possíveis para o contacto físico» com terceiros que não parentes de 1º grau ( foram assim excluídos todos os pontos que se enquadravam no conceito de 'extremidade', designadamente falanginhas e falangetas, narizes, orelhas, pilas, joelhos, mamilos, calcanhares e cotovelos - o rabo considerou-se subentendido) , o grau de «isolamento permitido» (a pessoa mais próxima em isolamento não poderia estar a mais de 2 metros de alcance do olhar) e a duração destes «encontros em isolamento legal» ( meia hora foi considerado o limite de tempo para temperaturas abaixo dos 18 graus, mas acima desta temperatura ambiente só eram permitidos encontros em isolamento com duração abaixo dos 5 minutos); quanto ao local dos encontros em isolamento legal com terceiros era dada mais abertura (desde que respeitadas as normas antes referidas) mas fora de qualquer possibilidade estavam locais onde se constatasse a instalação, de forma temporária ou permanente, de peças de mobiliário que permitissem o apoio de braços ou pernas ou até o aconchego lombar, e muito menos adereços com propriedades dissimulatórias, como biombos, cortinados, mesas de camilha ou cobertores de lã escocesa.

Uma das zonas de regulamentação essencial é que a consagrava os princípios da igualdade. Marília e Maurício tinham direito a tratamento igual em situações iguais, isso estava expresso sem deixar margem para dúvidas. No entanto, não seria possível escamotear a existência de diferenças estruturais e a sua consequência não poderia ficar exposta às arbitrariedades das circunstâncias. Assim, se a altura mínima duma saia de Marília podia ser regulada, o mesmo já não faria sentido para Maurício que, dessa forma, teve de transigir numa limitação relativa à abertura das suas camisas, que assim ficou limitada ao segundo botão, qualquer que fosse a moda vigente.  Houve, no entanto, total liberdade para o branqueamento de dentes, o que acabou por permitir a Marília a utilização de implantes ou alavancas mamárias, sem que para tal fosse necessário reunir o Conselho de Concertação Glandular.

Tratava-se dum documento longo, elaborado com cuidado, sem excessos burkânicos e num equilíbrio balanceado de precisão e abrangência que, por exemplo, não interferia na imaginação de cada consorte, que assim poderia perfeitamente estar a pensar no vizinho de baixo enquanto se banqueteava nos entrecostos do parceiro, da mesma forma que um rico pode pagar os seus impostos progressivos com boa cara enquanto chama cabrão aos pobres, mas não poderemos aqui apresentar toda a amplitude ou alcance desse documento de uma riqueza inquestionável.

No entanto, um importante elemento adicional terá de ser referido. Nele ficou instituída a existência - competências e modus operandi - do 'Tribunal Conjugal', um orgão que deliberaria sobre todas as situações controversas que se colocassem e que exigissem a sua análise à luz do texto - letra, pontuação e espírito  - da 'Carta Conjugal'.

Esse Tribunal era composto por 13 membros, a saber: um pater famílias condom-free, um solteirão militante, um libertino com provas dadas, uma divorciada ressabiada, um encornado assumido, uma viúva alegre, um ou uma encalhada, uma mal-fodida, um frustrado não psicótico, uma avozinha especialista em tricot, uma padreca da igreja evangelista, uma fêmea do modelo sempre-em-prenhe, e um membro dos casais empenhados de uma paróquia do diocese do Fundão.

O Caso

Raimundo fora um dos namorados mais esmerados e entusiásticos de Marília e nunca se conformara com o seu enlace com Maurício. Depois do casamento destes arrastou-se pelas sarjetas do costume (psiquiatras, bordeis, vodka, amigas conselheiras e feias, amigas conselheiras e boazonas, pornografia cara e barata, bolo de chocolate e séries da fox) até que caiu em si , pôs mãos à obra e foi estudar Direito de 'Carta Conjugal'.

Entretanto a vida de Marília e Maurício lá ia correndo dentro da tramitação normal, com uma ou outra ida periódica ao Tribunal Conjugal para esclarecimento de situações concretas que iam aparecendo, das quais se destacam uma ida de Maurício às putas em Ibiza enquanto Marília bebia Ponche com um amigo do infantário, uma exigência de fellatio no aniversário da 1ª comunhão de Marília e a utilização por parte desta duma máscara de Margaret Tatcher durante uma sessão em posição de missionário (como retaliação a um preservativo com sabor a sardinha) e que foram resolvidas com inteligência persuasória e equilíbrio por parte dos Juízes, o mesmo já não acontecendo numa situação  concreta em que Marília quis passar um fim de semana romântico-a-dois em Veneza, enquanto Maurício queira ia jogar bridge para Albufeira, tendo acabado os dois, depois duma decisão controversa e de índole salomónica do Colectivo, a fazer canoagem na barragem da Aguieira.

Já profundo conhecedor de todos os meandros do Direito da Carta, Raimundo ficou à espera duma oportunidade para testar a adequabilidade constitucional do comportamento do casal.  A ocasião apresentou-se quando um belo dia Maurício tentou sacar de Marília uma repetição da kamasutrica posição retro-quadrípede como compensação de um cunnilingus efectuado depois de uma copiosa derrota do seu clube de futebol. Marília, já de joelhos amassados,  insurgiu-se de imediato com esta fria contabilidade do parceiro, mas quando, por inércia, já estava quase a consentir sem exigir a fiscalização preventiva do acto, recebe um sms de Raimundo a propor-lhe um pequeno almoço na Baixa ao abrigo da regra de excepção consagrada na 2ª Emenda do 'Acordo Conjugal' designada na gíria constitucional como 'brunch without broche'.

Aí se encontraram, relembrando velhos tempos de uma frescura irrecuperável e acabou por ser inevitável o desabafo de Marília. Assim, e entre um croissant misto e uma meia de leite (Raimundo tinha apenas pedido um pingado), chegaram à conclusão que estavam reunidas as condições para a fiscalização sucessiva da conjugostitucionalidade de certas e determinadas práticas reiteradas de Maurício. Raimundo emitiu um parecer, fazendo inclusivamente referências eruditas às Memórias de Adriano e às famosas 'punhetas de roth' (como na gíria do Direito da Carta Conjugal  é conhecida a possibilidade de denúncia do contrato matrimonial quando uma das partes utiliza a auto-gratificação solitária como escape privilegiado da frustração de expectativas), no qual dava bastantes argumentos ao Tribunal Conjugal para determinar da prática de repetidos comportamentos anti-conjugostitucionais por parte de Maurício e que configuravam um inequívoco e irreparável desrespeito pela Lei Fundamental da Conjugalidade.

Raimundo já esfregava as mãos e fazia povoar os seus sonhos com noites escaldantes na companhia do espírito de Marília e das respectivas carnes, quando sai o Acordão com uma decisão inesperada e, no mínimo, controversa. Este estabelecia que o que devia prevalecer era o Primado do Amor e da Estabilidade. Desde que o binómio «lubrificação e intumescência» se mantivesse e desde que em paralelo existissem meios económicos e biológicos para garantir a reciprocidade de gratificação, o contrato matrimonial não poderia ser desfeito pela via conjugostitucional.

E foi assim que Raimundo rapidamente passou de mãos esfregadas a mãos a abanar, e frustrada a fiscalização sucessiva dedicou-se ao voyeurismo constitucional: mais ejaculação, menos ejaculação, nada lhe dava mais tesão que colocar Marília em tentação e Maurício em exasperação.

anda, caralho


Apesar de não possuir caderneta profissional de terapeuta julgo que todos, numa aproximação imperfeita ao Mandamento do Senhor, temos a obrigação de proporcionar ao próximo um mínimo de condições para que ele extravase a sua raiva interior e que o faça da forma mais benigna para os que o rodeiam. Este é o ponto, e é um ponto bonito, na minha maneira de ver.

Um dos locais de eleição para esse transvase de bílis é do conhecimento de todos: o trânsito. Não irei discorrer sobre o tema em teoria, ele já está tratado seja por especialistas, seja por curiosos, seja por amantes da opinião livre em geral e da badalhoquice em particular.

A forma que escolhi para cumprir este mandamento na sua versão terapêutica foi atrasar-me ligeiramente a arrancar ao sinal verde, proporcionando assim ao condutor de trás momentos de verdadeiro êxtase de raiva e ódio sobre mim expelidos de forma concentrada, mas sempre devidamente controlada e confinada no espaço.

A fórmula de escape terapeutico que tenho assistido com mais frequência e que me parece de resultados mais imediatos é um «anda, caralho», dito apenas com um ligeiro arregalar de olhos e um levantar das maçãs do rosto que muitas vezes evidencia duas rugas laterais de belo efeito em caucasianas sem maqulhagem excessiva. Na maioria das situações este movimento terapêutico atinge-se com um mero atraso-de-arranque de 1,5  segundos mas já encontrei casos desesperados de reacção aos 6 décimos de segundo.

Um segundo modelo de intervenção é aquele que tem associado o formato de impropério simples:  «foda-se, arranca!». Dado o grande potencial de dinamização económica que tem associado, geralmente é adequado a pessoas com uma intervenção cívica relevante e que se preocupam realmente com o estado das contas nacionais, deficits e espirais recessivas. Por regra, esta fórmula terapêutica deve vir acompanhada com aquele movimento de braços que numa primeira fase se afastam em leque do volante para depois nele aterrarem com veemência  recolocando-se em posição de ataque ao semáforo e ao carro da frente (o terapeuta - eu) . Grandes oscilações de pescoço já não são necessariamente observadas nestas ocasiões, e como se seguem arranques rápidos a terapia conclui-se sem efeitos secundários. Já acompanhei pacientes que depois do arranque chegam mesmo a conseguir bufar duas ou três vezes o que é altamente recomendável desde que não embacie.

Uma outra técnica terapêutica que também aconselho é a que está associada a sinais de amarelo intermitente. Atrasar o arranque acima dos 2 segundos em bastantes destas situações consegue proporcionar ao nosso cliente do carro de trás aquele movimento para trás com a cabeça e olhos no zénite e que, com jeitinho e paciência, conseguimos que ainda esboce um «merda, mexe-te, merda». Se repararmos, este impropério terapêutico é de enorme potencial pois não só permite a irritação adicional de ter de dizer desenroladamente 3 émes seguidos, sendo que um deles é um verbo, e ainda para mais é uma frase capicua, o que nalguns espíritos mais escrupulosos adiciona bastante valor-de-exasperação.

É evidente que - e os leitores mais atentos e conhecedores certamente já terão pensado neste reparo - nem sempre a terapia termina nem esgota com o mero atraso de arranque seguido de impropério de ódio dirigido contra certos-incertos. É preciso garantir que se segue um alívio e esse alívio tem de ser muitas vezes concretizado com expressões em surdina como «não tens nada para fazer, cabrão», ou «é por causa destes cabrões que isto não anda para a frente», ou mesmo até um «país de conas é o que isto é» (as generalizações em certas sessões terapeuticas podem ser bastante apropriadas). E é nestes momentos que o terapeuta que todos temos dentro de nós se deve sentir realizado.
Mais realizado que isto só mesmo hoje a seguir ao almoço quando uma miúda bem gira do pescoço cima, ali num semáforo às Amoreiras, depois de lhe ter atrasado um arranque em coisa de mais de 1,45 segundos, lhe consegui sacar um «fode-me assim outra vez, meu amor, fode», com sopradela de franja e tudo. São estas coisas gratificantes que nos ficam. Nem passei factura, que Deus me perdoe.