(continuação)
Viviane Lopes - Humm...em que parte dele?
A.S. - Naquela que pode estar ligada à morte de Custódia
Passos..
V. L. - O Raimundo é um homem muito...físico, digamos assim,
se fosse ele a matá-la teria deixado mais marcas visíveis.
A.S. - É um homem violento, portanto.
V.L. - Sim, também se pode colocar a coisa assim, mas eu
seria mais rigorosa: é um homem para quem as palavras não bastam.
A.S. - Mas sendo escritor..deveriam bastar, ou não?
V.L. - Sabia que ele tinha sido ( e praticado) ortopedista
antes de se dedicar à escrita?
A.S. - Bem...sabia que era médico de formação, mas daí a...
V.L. - Uma falha imperdoável sua, deveria saber que os
ortopedistas são uns brutos insensíveis! Essa brutalidade está entranhada no
Raimundo.
A.S. - Tem então um currículo de agressões é?...
V.L. - Não... não... que eu saiba não...julgo apenas que se
ele quisesse matar alguém partiria qualquer coisa, ou ossito, ou assim...há vocações
que nunca desaparecem (ahah)
A.S. - Você está a divertir-se à brava com isto...também não
é normal, não acha?
V.L. - Nada mesmo...
A.S. - Mas voltemos, por enquanto, ao Raimundo Múrcia, ele
já tinha sido amante da Custódia, porque acabaram?
V.L. -
Simone is the woman, claro!
A.S. - Seria por essa via mais normal que fosse a Simone a
morrer, certo?
V.L. - «Normal»!?...Olha, olha e a brincalhona sou eu...
A.S. - Ou então a Custódia estaria a fazer alguma chantagem
com qualquer um dos dois...
V.L. - São todos demasiado orgulhosos para entrarem em
chantagens... e para além disso, tem de perceber isto: estamos perante pessoas
que conseguem ferir de forma muito mais eficaz do que tirando a vida uns aos
outros.
A.S. - Como assim?
V.L. - Sabe uma coisa, acho que está demasiado centrado na
coisa passional e nem sequer ainda abordou uma outra questão básica: sabia que
a Custódia era riquíssima? e, melhor ainda, era uma rica em segredo, uma rica
que poucos sabiam ser rica.
A.S. - Quem sabia?
V.L. - Bem...que eu tenha conhecimento: eu, o Dário, o
Salvador Arinto e, julgo... o Flávio Cossaco. Mas todos sob pacto de sangue...
A.S. - Mas todos sem motivo para a matar, suponho.
V.L. - Sou escritora, Inspector, falhada, mas escritora, não
leio corações, nem mãos, nem mentes, e, o melhor de tudo: não tenho nenhum
fetiche com a verdade, prefiro bons peitorais (ahahah)
A.S. - O testamento ainda não foi aberto, essa pista vai demorar
a ser percorrida...Tinha alguma coisa para me dizer sobre isto?
V.L. - Acho apenas que não é do género da Custódia morrer de
amores...mas tudo é possível quando se trata de morrer, até há quem morra de
tédio e o tédio é das melhores coisas do mundo!
A.S. - Qual é o seu palpite sobre a morte da Custódia?
V.L. - Empate.
A.S. - Como assim...
V.L. - Alguma coisa a andava a empatar.
Transcrição do depoimento de Viviane Lopes, recolhido pelo
inspector Álvaro Simões, um mês depois da morte de Custódia Passos, e publicado
no Boletim Mensal do Investigador
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