A bateria só tem 15 minutos, rasguei-me um pouco ao lado do picotado e saiu um pó esverdeado, típico duma soberba reprimida à base de cacetadas bem dadas de moralismo cirúrgico, mas persistente; apresento um cheiro adocicado quando virado para a luz, acre na sombra, deitei-me um pouco no pires, ao mais pequeno contacto com a humidade real começaram as bolhas de susceptibilidade, o metal da lâmina da faca foi acolhido primeiro com desconfiança, depois com crueldade e finalmente com resignação, sim faca, para me mexerem bem teve de ser com uma faca, ria-me quando vinham para mim às colheradas. Feito em montinho - já só tenho 10 minutos de bateria - pareço impreparável para o contacto com o leite e muito menos com o forno. A minha pasta inicial é repelente, sou desajustado para amores à primeira vista, quando chega o primeiro garfo cheio de proselitismos deixo-me ir, ponham mais leite que se lixe, serei tarte, serei torta, bolo, rolo, seria o que quisessem. Sete minutos. Encaixo-me na forma fingindo ser um espírito irrequieto, o melhor que consigo é ficar com um farrapo de fora, uma pila de robespierre, aceito todos os celsius que o forno me pôs à disposição e saio de lá com um interior duro e uma capa mole, não era o que estava previsto. Faltam 4 minutos. Desenformei fácil. A travessa em calha tinha um friso doirado que me parecia não merecer. Assentei despreocupadamente, irresponsavelmente afinal, já só sentia saudades do calorzinho do forno. Aguardava-me o refrigério. Numa prateleira do meio, entre melões e requeijão, invejando a puta da mostarda sempre a ir e a vir. Esperavam que saísse de lá rijinho; pode ser que sim, pelo menos já teria a cara de broche. Dois minutos apenas. Sou cheirado. Dei conta até duma curiosidade genuína, dois elogios forçados e três esguelhas. Vai acabar a bateria, adeus, talvez venha a combinar bem com gelado de baunilha, quem sabe, ou então ponham-me muito chantilly e chamem-me foda-d'anjo.
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