Inesperadamente aquele tecido com acabamentos tão intensos, tão profundos, com tratamentos dos mais sofisticados e persistentes, um dia, depois de passar por uma simples limpeza a seco, acordara cru, como um pano cru. Todas as cores o deixaram, todas as protecções, todos os efeitos especiais, tudo aquilo que o tinha feito um tecido cobiçado pelos mais afamados costureiros e pelas mais glamorosas modelos. Perdera o toque, o brilho, a subtileza, a queda suave, o passear ondulante, e era agora um pano liso, baço, teso, seco, empapelado. Nunca mais tocaria naquelas peles sedosas, nunca mais lhe passariam pelos poros os odores dos perfumes, nunca mais roçaria num corpo ardente de desejo. Tudo se fora naquela lavagem traiçoeira. Nas nódoas estava afinal o seu poder. Mesmo tendo sido fugaz a sua presença junto à vida do corpo que amava, agora estava preso na pureza estúpida do pano cru, virado para si próprio, em dobras e vincos feitos no rigor duma geometria de conveniência, feita moeda de compensação.
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