Cordia encalyculata

Rafik Bouazza Mansour, quando era ponta-de-lança júnior do ES Sétif da Argélia, ficou famoso, ainda com 16 anos, por ter feito um golo em trivela de joelho, da zona do bico da área, ao guarda redes do ASO Clef (um ex-ladrilhador recém convertido ao misticismo islâmico depois de ter falado com maomé pelo el twitter). Em virtude do fenómeno mediático que desencadeou tal jogada de fino origami, Rafik foi assediado por um olheiro francês (dentro dos limites do código penal napoleónico, do corão e do Manual Deontológico dos Olheiros do Loire) a integrar as escolas de futebol do Nantes, tendo-se aí destacado pelos seus dribles curtos seguidos de pique e assentamento de defesa, o que lhe originou a alcunha carinhosa de 'al jamboni'. A sua experiência pelas terras francesas, alimentado a generosas doses de pato fumado e brié, resultou-lhe numa combinação de velocidade, virtuosismo, envergadura física e energia de vencedor que o fazia entrar nos relvados como se que cada jogo se tratasse duma eliminatória das guerras púnicas, um campo de batalhas do caralho, perdão cartago.

Não foi assim de estranhar que um abonado clube inglês se interessasse pelo seu concurso, concretizando-se a transferência após uma época que estava a ser pontificada por impasses e mesmo alguns embaraços, incluindo a gravidez duma namorada de origem tunisina que se tinha apaixonado pela sua finta jambonette e pelo seu peugeot cabriolet.

Rafik Bouazza abraçou a experiência britânica como se de um novo renascimento mourisco se tratasse. Aceitou chuvas, nevoeiros e rosbifes com uma resignação de berbere à sombra e construiu uma carreira sólida, apenas com uma média de 3,7 filho-da-puta-dum-cabron e 2,5 motherfuckers por jogo, na primeira época, o que constituiu um record inédito para um rookie não oriundo da commonwealth e sem o cabelo pintado no pantone de fábio coentrão.

Não constituiu assim qualquer surpresa ter sido chamado à selecção do seu país, para pouco tempo depois ser titular indiscutível e isto, registe-se, sem pertencer a nenhum lobi, nem gay, nem opus-alá, nem bilderborga, nem mesmo da respeitada e influente Confraria dos Amigos da Barbicha Pingada, pois Rafik tinha-se apaixonado pelo cabelo penteado com gel depois de ter visto uma fotografia de Mário Conde numa revista dum dentista de Múrcia.

Os seus tempos livres no estágios eram passados a jogar super-mário-wii com Hassan Gezzal e Karim Halliche, mas não enjeitava um ping-pong com Nadir Chaouchi desde que este não usasse a tshirt com a fotografia de Beyonce que o desconcentrava no departamento da virilidade. Fora de questão estava jogar à bisca com Karim Belhad que concomitantemente arrotava a hortelã, principalmente se antes tivesse treinado livres directos com barreira. O seu massagista preferido era Yazid Ziani, também conhecido a norte do Atlas como o Anibal-da-falangeta, e todas as noites viam juntos (cada um no seu maple) episódios avulsos da Guerra das Estrelas escolhidos à sorte com umas rifas verdes feitas com o papel dos rebuçados de mentol que Hantar Saifi, o secretário técnico da selecção, distribuía depois do jantar.

Rafik tinha alguma dificuldade em adormecer durante os estágios da selecção, - um espécie de stress pré-traumático dizia o psicólogo da selecção, um zambiano especializado numa técnica que consistia em esfregar areias do kalahari na zona lombar - e frequentemente utilizava dois expedientes: ou pensava num golo que tinha marcado ao Portsmouth em que - supostamente - tinha rodopiado sobre o guarda redes sem sequer ter tocado na bola, ou então pensava num drible que fizera no Boxing day a Rio Ferdinand depois de ainda ter tido tempo de revirar os olhos a uma espectadora parecida com a actriz que fazia de miss Marple. Se ainda assim não conseguia entregar os seus vários níveis de consciência aos cuidados do orfeu encefálico, usava um método que lhe fora ensinado pelo preparador físico dos tempos de júnior no Nantes: ir recitando os nomes dos comandantes cristãos da batalha de Lepanto: João de Áustria, Sebastião Veniero, Andrea Doria, Marco António Colonna, Barbarigo, Alvaro de Bazán, sendo que normalmente já roncava antes de dizer o nome todo de Juan Ponce de León.

No entanto o ambiente dos estágios era tranquilo e pouco perturbado por insignificâncias relacionadas com os grandes tumultos da civilização, desde conflitos norte-sul a catástrofes nas finanças públicas, e as grandes preocupações acabavam por surgir em redor das pequenas invejas; Karim Halliche acabara por ser escolhido para rosto da campanha das cuecas Dolce & Gabbana em detrimento de Nadir Chaouchi que se tivera de contentar com a dos novos aperitivos Matutano light. Karim ainda só tivera uma pequena experiência em Inglaterra com as promoções dos saldos de inverno de pijamas do C&A, mas desestabilizara-se um pouco, isso sim, quando soube que a nova namorada de Salim Facunda, uma odalisca turca, aparecera num placard da yoplait em Southampton, sendo que Salim pouco mais sabia fazer do que despachar bolas pela linha lateral. Rafik perguntava-se frequentemente onde estava o olhar de Alá quando era preciso reparar estas injustiças. Nem toda a iniquidade está no chouriço, pensava Rafik com as suas caneleiras enquanto Hassan Guezzal rejubilava ao receber a noticia do primeiro dentinho do seu filho, e ir-lhe-ia dedicar o seu próximo golo, «só se os guarda-redes adversários andarem a xanax», resmoneou de si para si Yassoup Khadra, um interior direito que era conhecido pelo mau feitio e pelas tatuagens de crustáceos.

Karim respirava optimismo e tinha praticamente tratada a sua transferência para o Málaga, para junto da sua noiva, a hispano-marroquina Sofia Khazar, uma loira kerastaseana que chegara a ser prometida dum campeão olímpico de basquetebol, mas que dele se desgostara por não aguentar muito bem os sapatos de saltos altos. Karim, esse sim, garantia-lhe um amor solene e permanente sem ela precisar de tirar as chanatas desde que lhe preparasse sempre um arroz de gambas depois dos jogos e nunca, mas nunca, sequer focasse o olhar em Mohamed Abhad, o grande sex-symbol e ponta esquerda da selecção quando esta se apresenta em 4x3x3 ou falso ponta-de-lança quando está em 4x2x2, e cabeça de cartaz da nova campanha dos lombinhos de pescada da Pescanova.

2 comentários:

maria disse...

poralá!!! ontem mesmo o convoquei!

e vem com cromos e tudo...

beijinhos

aj disse...

ena ena um comentário!

beijos