O meu sonho era viver um tudo de nada dilacerado. Mas não consigo. Quando parece que estou quase lá aparece logo qualquer coisa prosaica, desde queijinhos frescos à ‘world of interiors’, que me afasta sem glória e me reduz à condição de normalopata. E qualquer coisa me serviria. Tentei dilacerar com a miséria em geral, com as mães solteiras, animais feridos, famílias desagregadas, conflitos norte-sul, ondas migratórias, inclusivamente cheguei a estar lá perto pensando fixamente em potenciais desgraças relacionadas com decadências morais, mas, é oficial: não dilacero assim.
Dizem que a alma devidamente cristianizada está mais apta a desconfiar de si própria e das outras e sou levado a acreditar no sofisticado fenómeno. Desprovido de ilusões sobre a natureza que a acolheu [uma espécie de contentor kleiniano], a alma cristianizada vive, contudo, de e numa convicção de possibilidade de melhoria constante ou intermitente, antecipando umas soit disant normas ISO (instability soul organization) adaptadas à sua condição de ‘meio degredo/meio éden’, e sempre olhadas pelo Grande Auditor com um misto de glória e compaixão. A ‘melhoria’ cristã foi o primeiro paso doble da humanidade.
O cristianismo inventou assim o progressismo, mas julgando estar simplesmente a enviar pescadores para o coliseu, e tratando de elevar a resignação activa ao estatuto de política ecológica da alma.
Além disso, as sensações de pecado e redenção estão para a alma cristianizada como dentro duma – também prosaica – relação amorosa estão as sensações de ‘fiz merda’ e ‘desta safei-me’. Ou seja, a alma cristianizada combina com alguma eficácia – e surpreendente equilíbrio – vertigens contrárias (o abismo da existência e do amor não correspondido a par do empolgamento da salvação e do amor correspondido) sem necessitar nem de especiais aditivos éticos, nem de nenhum banho de conservantes filosóficos (independentemente de um ou outro shot de bourbon ou de valeriana): basta-lhe aquela cristã e cristalina noção de que a condição humana dentro de todas as misérias é a mais asseada.
É evidente que o cristianismo carrega uma sobranceria ontológica, transporta orgulhosamente a verdade revelada, ora num altar, ora numa padiola, mas, convenhamos, aquela coisa do ‘amai-vos uns aos outros’ dá pica, não dá?
Dizem que a alma devidamente cristianizada está mais apta a desconfiar de si própria e das outras e sou levado a acreditar no sofisticado fenómeno. Desprovido de ilusões sobre a natureza que a acolheu [uma espécie de contentor kleiniano], a alma cristianizada vive, contudo, de e numa convicção de possibilidade de melhoria constante ou intermitente, antecipando umas soit disant normas ISO (instability soul organization) adaptadas à sua condição de ‘meio degredo/meio éden’, e sempre olhadas pelo Grande Auditor com um misto de glória e compaixão. A ‘melhoria’ cristã foi o primeiro paso doble da humanidade.
O cristianismo inventou assim o progressismo, mas julgando estar simplesmente a enviar pescadores para o coliseu, e tratando de elevar a resignação activa ao estatuto de política ecológica da alma.
Além disso, as sensações de pecado e redenção estão para a alma cristianizada como dentro duma – também prosaica – relação amorosa estão as sensações de ‘fiz merda’ e ‘desta safei-me’. Ou seja, a alma cristianizada combina com alguma eficácia – e surpreendente equilíbrio – vertigens contrárias (o abismo da existência e do amor não correspondido a par do empolgamento da salvação e do amor correspondido) sem necessitar nem de especiais aditivos éticos, nem de nenhum banho de conservantes filosóficos (independentemente de um ou outro shot de bourbon ou de valeriana): basta-lhe aquela cristã e cristalina noção de que a condição humana dentro de todas as misérias é a mais asseada.
É evidente que o cristianismo carrega uma sobranceria ontológica, transporta orgulhosamente a verdade revelada, ora num altar, ora numa padiola, mas, convenhamos, aquela coisa do ‘amai-vos uns aos outros’ dá pica, não dá?
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