A minha única incursão no mundo da fotografia foi atribulada. Quis jogar uma parada alta e avancei para a falsificação dum tríptico de Mapplethorpe dedicado a rabos chineses descaídos (procurando vir a aproveitar financeiramente a suposta revelação da existência duma sua fase secreta e alternativa à das pilas grandes e pretas). Pela primeira vez dependia explicitamente de terceiros: chinesas de rabo descaído. Como se pode antever sou um falsificador perfeccionista e já com algum pedigree, e jamais utilizaria um rabo que não fosse de chinesa, mesmo que o pudesse substituir por outro semelhante e com sucesso. Por isso, compreenderá o leitor, ficar, de certa forma, na mão do rabo descaído de uma chinesa era algo que me preocupava; profissionalmente. Aluguei exclusivamente para o efeito um atelier em Cabo Ruivo, e contratei três moças à saída dum restaurante, onde tinha comido um pato lacado, por acaso até bastante saboroso, para além de 23 crepes, que foi a forma utilizada, por força do ir-e-vir do serviço de mesa, para visionar, aferir e escolher uns traseiros bons para a chapa (leia-se ‘para a fotografia’, obviamente). A sessão fotográfica correu com normalidade, elas, por coincidência, já tinham posado para uma campanha da Multiópticas, se bem que, nesse caso, deram destaque fotográfico a outra zona. Lá compus o tríptico final, uma sequência interessante, com o exemplar central a evidenciar uma suave borbulhagem nas nádegas, e os exemplares dos extremos a revelarem uma ligeira assimetria, o que dava um toque, digamos, perverso, e, por isso, genuíno; houve apenas de ter o especial cuidado para que um eventual plano mais roliço das pequenas nádegas, ao ser apanhado com menos luminosidade, não corresse o risco de se confundir com um par de testículos nigerianos. Mapplethorpe poderia, sim, efectivamente, ter fotografado aquilo. Aliás, cinco segundos depois da obra estar concluída, era mesmo ele o seu autor, pois um falsificador que não se deixe ele próprio enganar com a autenticidade da sua obra deve abdicar de imediato e dedicar-se ao private banking. O tríptico fotográfico foi então apresentado a uma galerista de Gotemburgo, fascinada em fotografia oriental pós-confuciana e que, ao vislumbrar a possibilidade de possuir um genuíno Mapplethorpe com esse tema, praticamente me ofereceu o seu corpo, ainda de muito boa serventia, note-se. Mas dava-me mais jeito cobrar mesmo em contado, e acabei por alargar castamente o meu humilde pecúlio. A excitação sueca era tal que acabou por me dispensar ao relato de como tinha chegado à posse de tamanha relíquia fotográfica, o que agradeci para todo o sempre; era uma história inventada, mas que não dignificava a fama do meu tio-avô. A falsificação de qualidade deve controlar as suas próprias fronteiras, de forma a não se confundir com artes falsárias menores como, por exemplo, a banal politica.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário