Contos com uma bossa nova mas sem camelos II
Achavam que as suas opiniões políticas eram coisas muito íntimas e por isso dedicavam-se às questões do sexo. Nesse dia tinham ido para casa dela; entre um instrumental de ‘Tanto mar’ e umas revistas de viagens ela mostrava-se inesperadamente ansiosa. «Com músicas destas um homem nivela por cima e amolece as partes baixas» resmungava ele, ainda acrescentando, à procura de uma piada mais sofisticada «este gajo aqui lembra-me sempre a música do kusturica depois de tomar uma dose excessiva de relaxantes musculares». A chicobuarquização do sexo era algo que o aborrecia, o seu corpo não valorizava o charme e só reagia com a ivetesangalização das hormonas. E ela sabia-o. Mas ela também sabia que primeiro tinha de o arreliar um pouco. Há certos homens assim, precisam de se irritar um bocadinho para desenvolver depois. «Os homens são muito previsíveis», pensava ela, já sem dar demasiada importância (até há tipos que escrevem livros à conta disto). Depois chegam a aguentar com Simones e Betânias e marcha tudo, ‘cordilheiras’, ‘gotas de agua’, ‘yolandas’, é o que se quiser. Mas voltemos ao sexo que é para isso que aqui estamos. Naquele dia ela parecia também confusa por causa das questões de distribuição da riqueza, ou de um problema relacionado com o estado providência, não deu para perceber bem, é daquelas coisas que, sem se saber bem porquê, deixam certas mulheres com uma… avidez sensorial, digamos assim. A certa altura um tal de João Gilberto canta que ‘isto é muito natural’… e que ‘no peito dos desafinados também bate o coração’. Os deuses sabiam que esse era o momento em que os ventos mudavam: a irritação masculina juntava os trapinhos com o socialismo utópico feminino e iniciava-se uma revolução à espanhola. ‘Eu caçador de mim’ tocava ainda o Milton Nascimento, mas não ia a tempo: o molho já não estava para coalhar. Até dançaram ao som do Ney Matogrosso antes de voltarem a desfolhar as revistas de viagens. Tinham fornicado que nem uma ONG a viver à conta de transgénicos da coca, fazendo o bem com as forças do mal.
Achavam que as suas opiniões políticas eram coisas muito íntimas e por isso dedicavam-se às questões do sexo. Nesse dia tinham ido para casa dela; entre um instrumental de ‘Tanto mar’ e umas revistas de viagens ela mostrava-se inesperadamente ansiosa. «Com músicas destas um homem nivela por cima e amolece as partes baixas» resmungava ele, ainda acrescentando, à procura de uma piada mais sofisticada «este gajo aqui lembra-me sempre a música do kusturica depois de tomar uma dose excessiva de relaxantes musculares». A chicobuarquização do sexo era algo que o aborrecia, o seu corpo não valorizava o charme e só reagia com a ivetesangalização das hormonas. E ela sabia-o. Mas ela também sabia que primeiro tinha de o arreliar um pouco. Há certos homens assim, precisam de se irritar um bocadinho para desenvolver depois. «Os homens são muito previsíveis», pensava ela, já sem dar demasiada importância (até há tipos que escrevem livros à conta disto). Depois chegam a aguentar com Simones e Betânias e marcha tudo, ‘cordilheiras’, ‘gotas de agua’, ‘yolandas’, é o que se quiser. Mas voltemos ao sexo que é para isso que aqui estamos. Naquele dia ela parecia também confusa por causa das questões de distribuição da riqueza, ou de um problema relacionado com o estado providência, não deu para perceber bem, é daquelas coisas que, sem se saber bem porquê, deixam certas mulheres com uma… avidez sensorial, digamos assim. A certa altura um tal de João Gilberto canta que ‘isto é muito natural’… e que ‘no peito dos desafinados também bate o coração’. Os deuses sabiam que esse era o momento em que os ventos mudavam: a irritação masculina juntava os trapinhos com o socialismo utópico feminino e iniciava-se uma revolução à espanhola. ‘Eu caçador de mim’ tocava ainda o Milton Nascimento, mas não ia a tempo: o molho já não estava para coalhar. Até dançaram ao som do Ney Matogrosso antes de voltarem a desfolhar as revistas de viagens. Tinham fornicado que nem uma ONG a viver à conta de transgénicos da coca, fazendo o bem com as forças do mal.
Sem comentários:
Enviar um comentário