In a minute, sir

Uma maid é uma maid (não, aquilo não é uma farda fetichista nem de dominatrix, desengane-se) e não está ao seu serviço senão para o satisfazer. Sente-se, quieto, e escute "your life as a sequel" dos Lambchop em fundo (daradada... should i know your place / and my place or undiscovered / through a curtain or refinery / not certain or temporary / daradada...) como preliminar para a degustação da minha por enquanto apenas receita de perna de borrego com nabos:

Aproveita-se uma perna de borrego previamente assada (é o mais sensato, claro, quando os dentes já acusam o uso). Desossa-se com cuidado e envolve-se delicada mas completamente em tiras acetinadas de presunto (porco, ok? reabilitado do fundo do esterco pela citação de Bernard Shaw via Abrupto) 15 den. Polvilha-se com farinha de trigo (fina ou ultra-fina, com um pom-pom de preferência) e leva-se ao lume em manteiga derretida (mas não liquefeita porque seria mais inútil que um bronzeador de écran total). Logo que tenha tomado cor (a gosto, há quem prefira tons de carne mais claros), junta-se-lhe um caldo de bom cognac (por todos os santos, a evitar o vodka, em absoluto!) e deixa-se cozer em fogo brando (por todo o tempo necessário, ainda que à custa de muito investimento em energia e doses maciças de resiliência). A meio da cozedura (ou quando se sentir abrandar a resistência carnal) juntam-se-lhe cenouras, batatas, cebolinhas e finalmente nabos, tudo partidinho por quartos (mas nunca ao acaso! haja preceito e cuidado, isto não é uma jardineira!!!). Logo que os legumes estejam cozidos ('ternes' como dizem os franceses, já a dobrar sem opôr resistência a dedos ou garfos) põem-se de lado, deitados numa travessa, ornamentando a carne doirada. Serve-se quente, de imediato. Como ao pecado. Da dita, mas sem o murillo para evitar cenas nas revistas cor-de-rosa ou alarido em blogs de histéricas vegan ou auto-consideradas honorárias da LPN.

[Nota de edição: apesar de continuar 'sentado e quieto' e só sair desta posição quando receber instruções nesse sentido, assumo uma desconfiança natural - no sentido (shakespeariano) de impulsiva - sobre receitas sem sal e com a demasiada exposição dos legumes 'deitados numa travessa'; e, a despropósito, deixo-lhe ainda, querida mad'am, a sugestão de visitar umas clássicas-costas-nuas-de-homem, que tanto a inspiram, na seta despedida; ternement, antº]

[Acatada a sugestão para admirar o másculo exemplar, pétreo como convém, em exibição na Seta despedida, concluo da necessidade de uma viagem rápida a Nápoles para reeducar o gosto - da última vez que lá estive preocupei-me com o cone do Vesúvio, infrutiferamente. Servidora sua consciente que sou, peço-lhe encarecidamente que retorne às, muito suas, afrodites agachadas e deixe, por conta de quem melhor domine o tema, os apolos erectos. Já pode levantar-se, é claro. a.]

[Já levantado e recomposto, e ‘se a minha constituição é tão boa, minha mente/ tão genuína e minhas formas tão autênticas’ sinto-me agora qual homo erectus – fraudulentamente shakespeariano, claro - a olhar para o cone do Vesúvio e a pensar numa bela sardinhada acompanhada de pão de lenha da Ereira, se é que me permite mais esta agachada gourmeterie desafroditada; antº ]

[Por bem o escuto, odmundo, preferindo embora o bobo. Mui me espantara tão fermosas propriedades de constituição, mente e formas, fruto fossem, que não apenas ideia de vis gentes, de 'fugaz e natural lascívia'. Por mim aqui me basto, posto que 'comigo está tudo certo desde que como eu preciso'. E de momento apenas lhe peço que me faça chegar as molas porque a roupinha, que havia a lavar, por hoje lavada está, estendida à lua será e amanhã outro sol a corará. a.]

Assinalados por ' - excertos de falas de Edmundo, Rei Lear (1.2)

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