Isto agora já só lá vai com um panegírico encharcado nas trombas
Julgo estar a chegar atrasado à coisa; mas.
Eu gosto do Carrilho. Estou quase a sentir-me como uma minoria étnica, mas tenho de admitir: eu aprecio a figura. Não consigo distinguir por entre as brumas do inconsciente qual será o motivo, se será a sua vitoriana popa, se será o sorriso de contornos sacanóides, se será o maravilhoso tique de ombros, se será aquele seu bucólico amor à verdade verdadinha, não consigo descortinar, mas na realidade há ali algo que me faz aderir quase incondicionalmente (a meio caminho entre o efeito epidural e a massagem do couro cabeludo). Mas julgo que será até algo de objectivo, de índole racional, elaborado mesmo, arriscaria.
Avancemos em formato avulso mas sem maçar com a exaustividade; o vídeo. Não vejo como é possível não se admirar alguém que conseguiu pôr o filho a dizer para a televisão sem se babar que adoraria ter o papá como presidente da câmara; pessoal! eu acho isto o máximo; por exemplo no meu triste caso particular treinei durante dois anos o meu filho mais novo (também são os piores, parecem touros que vão para a lide já toureados antes) para dizer que gostava de mim para as mais diversificadas e sofisticadas plateias, mas o sacana em mais de 90% das vezes preferia o Nestum com mel com Bayblades, isto sim é um facasso; quanto à famosa cena do aperto de mão, ora gaita, qual será o português que não sonha com aquele dia em que, quando um presidente da câmara qualquer lhe tentasse apertar a mão, ele o mandasse mas era para a bicha. Isto é definitivamente a melhor encarnação do portuguesismo profundo, e Carrilho (como poucos a usar a subtileza da ausência) soube condensar de forma exemplar. Depois reparem, o nosso Carrilho diz sempre que a culpa é dos outros e, isto sim, é que é corajoso nos dias de hoje; assumir as culpas é uma banalidade, ter a coragem de dizer que os outros todos é que são uma grande merda, e crápulas e incompetentes, isso é que é verdadeiramente distintivo e estruturante numa personalidade que valha a pena. Não há como o capote que tem a água bem sacudida para fazer pirraça aos impermeáveis de ocasião. E temos ainda aquela genuína pureza da ausência de metáforas. Carrilho não precisa de muletas de bafio naftalinizado, de pântanos, de cabalas, de tabus, Carrilho diz simplesmente que alguém o esteve a foder no serviço do quarto poder (aqui não tive verba para um trocadilho com room service) e acha que tem de deixar este testemunho às gerações vindouras (já se sabe que, tendo de ser geração, a melhor opção é ser da vindoura). Mais nobre intuito nos dias que correm, só estou a ver a lei das rendas, ou as estatísticas do Eurostat, ou os clisteres opacos.
Por detrás daquela popa em erecção controlada, por detrás daquele amor balsâmico (salada não incluída) por Bárbara, por detrás do apuramento de raça que é aquele seu nariz, está um homem que consegue escrever Nitsxe e Vitgenstein assim de repente e em corrido com menos erros de que o JPP a relatar o bolor nas lombadas de uma livraria no Bangladesh e, revelo-vos agora em primeira mão: só um ligeiramente obsessivo complexo de perseguição consolida uma personagem de eleição.
É pois na esteira daquele que muitos tentam boçalmente diminuir, de quem muitos escarnecem com maledicências de subúrbio em déficit de acessibilidades, daquele que muitos invejam a lata de ser politicamente pedante (a palavra arrogante como sabemos foi comprada em leilão por Mourinho a troco do elástico das cuecas que vestia quando foi campeão europeu), dos que sabem expor os seus complexos como se fossem as suas virtudes, é na senda destes homens que se formam as urbes independentes e livres de leviathans hayekenizados (ligeiramente diferente de lexotans viagrinizados). Carrilho usa a pose como paramento, enquanto outros fazem dela o próprio cálice. Saber perder é coisa para parvos.
Faltam-nos é mais Carrilhos e sobejam-nos badalos, concentramos esforços a criticar provincianamente Carrilhos para depois sermos complacentes com Armandos Varas, ou como alguém diria, com tenores que só miam. Portugal, que já foi o país da inveja, sim já terá sido, agora é o da brotoeja.
Uma das coisas que a Bíblia também pode mostrar é que depois da lavagem de mãos de Pilatos a verdade nunca mais se recompôs.
Julgo estar a chegar atrasado à coisa; mas.
Eu gosto do Carrilho. Estou quase a sentir-me como uma minoria étnica, mas tenho de admitir: eu aprecio a figura. Não consigo distinguir por entre as brumas do inconsciente qual será o motivo, se será a sua vitoriana popa, se será o sorriso de contornos sacanóides, se será o maravilhoso tique de ombros, se será aquele seu bucólico amor à verdade verdadinha, não consigo descortinar, mas na realidade há ali algo que me faz aderir quase incondicionalmente (a meio caminho entre o efeito epidural e a massagem do couro cabeludo). Mas julgo que será até algo de objectivo, de índole racional, elaborado mesmo, arriscaria.
Avancemos em formato avulso mas sem maçar com a exaustividade; o vídeo. Não vejo como é possível não se admirar alguém que conseguiu pôr o filho a dizer para a televisão sem se babar que adoraria ter o papá como presidente da câmara; pessoal! eu acho isto o máximo; por exemplo no meu triste caso particular treinei durante dois anos o meu filho mais novo (também são os piores, parecem touros que vão para a lide já toureados antes) para dizer que gostava de mim para as mais diversificadas e sofisticadas plateias, mas o sacana em mais de 90% das vezes preferia o Nestum com mel com Bayblades, isto sim é um facasso; quanto à famosa cena do aperto de mão, ora gaita, qual será o português que não sonha com aquele dia em que, quando um presidente da câmara qualquer lhe tentasse apertar a mão, ele o mandasse mas era para a bicha. Isto é definitivamente a melhor encarnação do portuguesismo profundo, e Carrilho (como poucos a usar a subtileza da ausência) soube condensar de forma exemplar. Depois reparem, o nosso Carrilho diz sempre que a culpa é dos outros e, isto sim, é que é corajoso nos dias de hoje; assumir as culpas é uma banalidade, ter a coragem de dizer que os outros todos é que são uma grande merda, e crápulas e incompetentes, isso é que é verdadeiramente distintivo e estruturante numa personalidade que valha a pena. Não há como o capote que tem a água bem sacudida para fazer pirraça aos impermeáveis de ocasião. E temos ainda aquela genuína pureza da ausência de metáforas. Carrilho não precisa de muletas de bafio naftalinizado, de pântanos, de cabalas, de tabus, Carrilho diz simplesmente que alguém o esteve a foder no serviço do quarto poder (aqui não tive verba para um trocadilho com room service) e acha que tem de deixar este testemunho às gerações vindouras (já se sabe que, tendo de ser geração, a melhor opção é ser da vindoura). Mais nobre intuito nos dias que correm, só estou a ver a lei das rendas, ou as estatísticas do Eurostat, ou os clisteres opacos.
Por detrás daquela popa em erecção controlada, por detrás daquele amor balsâmico (salada não incluída) por Bárbara, por detrás do apuramento de raça que é aquele seu nariz, está um homem que consegue escrever Nitsxe e Vitgenstein assim de repente e em corrido com menos erros de que o JPP a relatar o bolor nas lombadas de uma livraria no Bangladesh e, revelo-vos agora em primeira mão: só um ligeiramente obsessivo complexo de perseguição consolida uma personagem de eleição.
É pois na esteira daquele que muitos tentam boçalmente diminuir, de quem muitos escarnecem com maledicências de subúrbio em déficit de acessibilidades, daquele que muitos invejam a lata de ser politicamente pedante (a palavra arrogante como sabemos foi comprada em leilão por Mourinho a troco do elástico das cuecas que vestia quando foi campeão europeu), dos que sabem expor os seus complexos como se fossem as suas virtudes, é na senda destes homens que se formam as urbes independentes e livres de leviathans hayekenizados (ligeiramente diferente de lexotans viagrinizados). Carrilho usa a pose como paramento, enquanto outros fazem dela o próprio cálice. Saber perder é coisa para parvos.
Faltam-nos é mais Carrilhos e sobejam-nos badalos, concentramos esforços a criticar provincianamente Carrilhos para depois sermos complacentes com Armandos Varas, ou como alguém diria, com tenores que só miam. Portugal, que já foi o país da inveja, sim já terá sido, agora é o da brotoeja.
Uma das coisas que a Bíblia também pode mostrar é que depois da lavagem de mãos de Pilatos a verdade nunca mais se recompôs.
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