Quaresma X
Búzios, chanatas e empalitanços...
«Há muito tempo já eu preferia as fábulas relativas aos amores e às querelas dos deuses aos comentários ineptos dos filósofos sobre a natureza divina. Aceitava ser a imagem terrestre daquele Júpiter tanto mais deus quanto é homem, protector do mundo, justiça encarnada, ordem das coisas, amante dos Ganímedoes, e das Europas, esposo negligente de uma Juno amarga. (...) Teria podido, por meio do divórcio, desembaraçar-me dessa mulher que não amava. (...) Mas ela importunava-me muito pouco, e coisa alguma, na sua conduta, justificava um insulto público. Jovem esposa, melindrara-se com os meus afastamentos, como o seu tio se irritara com as minhas dívidas.(...) Como muitas mulheres pouco sensíveis ao amor, compreendia mal o poder; essa ignorância excluía ao mesmo tempo a indulgência e o ciúme. Inquietar-se-ia apenas se os seus títulos ou a sua segurança estivessem ameaçados. Não lhe restava nada daquela graça de espanhola que outrora me havia brevemente interessado (...) Dava-me satisfação que a sua frieza a tivesse impedido de ter amante; agradava-me que ela soubesse usar com dignidade os seus véus de matrona. (...) Acontecia-me pensar naquele casamento fictício (...) entre a sacerdotiza e o hierofante, casamento que não é uma união, nem mesmo um contacto, mas que é um rito e, como tal, sagrado»
...na versão de Marguerite Yourcenar em ‘As memórias de Adriano’ ( Ulisseia pgs 143/4)
Demostrando que para superarmos verdadeiramente uma vida de aparência só mesmo com uma de ilusão.
Búzios, chanatas e empalitanços...
«Há muito tempo já eu preferia as fábulas relativas aos amores e às querelas dos deuses aos comentários ineptos dos filósofos sobre a natureza divina. Aceitava ser a imagem terrestre daquele Júpiter tanto mais deus quanto é homem, protector do mundo, justiça encarnada, ordem das coisas, amante dos Ganímedoes, e das Europas, esposo negligente de uma Juno amarga. (...) Teria podido, por meio do divórcio, desembaraçar-me dessa mulher que não amava. (...) Mas ela importunava-me muito pouco, e coisa alguma, na sua conduta, justificava um insulto público. Jovem esposa, melindrara-se com os meus afastamentos, como o seu tio se irritara com as minhas dívidas.(...) Como muitas mulheres pouco sensíveis ao amor, compreendia mal o poder; essa ignorância excluía ao mesmo tempo a indulgência e o ciúme. Inquietar-se-ia apenas se os seus títulos ou a sua segurança estivessem ameaçados. Não lhe restava nada daquela graça de espanhola que outrora me havia brevemente interessado (...) Dava-me satisfação que a sua frieza a tivesse impedido de ter amante; agradava-me que ela soubesse usar com dignidade os seus véus de matrona. (...) Acontecia-me pensar naquele casamento fictício (...) entre a sacerdotiza e o hierofante, casamento que não é uma união, nem mesmo um contacto, mas que é um rito e, como tal, sagrado»
...na versão de Marguerite Yourcenar em ‘As memórias de Adriano’ ( Ulisseia pgs 143/4)
Demostrando que para superarmos verdadeiramente uma vida de aparência só mesmo com uma de ilusão.
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