Por regra, no excêntrico universo da análise moral,
consideramo-nos pecadores em abstracto mas boas pessoas em concreto. Com
facilidade assumimos uma contrição quase estética sobre uma tendência genérica
para a imperfeição (não confundir com a maldade) mas confrontados com um
contacto objectivo com ela somos facilmente levados a descartá-la, ou a
camuflá-la sob capas do psicoloden, quando não a veementemente negá-la. A
experiência da culpa definida e circunscrita é muito mais penosa que a falha
assumida como uma tendência imanente de malandragem, ora literária, ou mesmo
cómica. Por outro lado todos temos pecados de currículo, pecados que nos ficam
bem, como adereços de moda ou relações de conveniência. Ou seja, a imoralidade-como-composição
é uma das boas invenções do espírito humano no intuito de se proteger desse
peso esmagador que é a existência duma lei moral omnipresente. Assim, a batalha
essencial da alma malabarista é conseguir transferir do concreto para o
abstracto a sua ligação à imperfeição, à culpa, ao pecado. A experiência
amorosa costuma ser boa e didáctica companheira neste processo pois nela
geralmente encontramos bons exemplos de grandes amores abstractos que se
transformam sem grande esforço em indiferenças, quando não mesmo negligências ,
objectivas e concretas quando o suposto-amado está ali disponível para ser pau
para toda a colher. O fenómeno da diluição da experiência por força da
capacidade de criação do eu-de-referência permitirá ao homem apresentar-se
perante o Criador com uma limpeza que seria imprevisível face aquilo que hoje
se chama de vidas complicadas. No
entanto, o contacto com o eu-de-experiência também não será totalmente
descabido uma vez por outra, até como molho agridoce duma existência que tudo tem para ser enfadonha, mas a grande aventura
humana é mesmo elevarmo-nos a seres de ficção, avatizáveis, imunes a essa
contaminação de catecismo a que se chama a culpa concreta. Filhos da grande Mãe
Inocência e apenas amamentados por uma Eva de Percalço, estamos talhados para
ser santos, o pecador é um tipo que se distraiu com os detalhes.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
1 comentário:
vê e divulga amigo
http://youtu.be/lI9nw_hdklA
Enviar um comentário