A revolução em Portugal acabou por não conseguir gerar uma
mitologia decente e consistente. Se, por um lado, Soares ainda se aproximou do
brilho da liturgia aristocratico-revolucionária, dando cores persistentes à
primavera politica e construindo em seu torno uma película lafayettiana de esplendor e espontaneidade,
nada de jeito se produziu no outro extremo. Chegados à troikicidade do momento
olhamos à nossa volta e não encontramos nenhum grande calculista, nenhum grande
e perene manipulador de bastidores. Vários candidatos foram ficando pelo caminho
(marcelos, almeidas santos, jaimes gamas, angelos correias, etc) sem deixarem
nenhuma marca que não o episódio ou flirt irónico e conspirista. Chegados aqui
vemos que a revolução em Portugal não produziu nenhum Grande Cínico, alguém que
trouxesse no sangue a dissimulação em estado puro, um reflexivo obsessivo. E
que falta nos faz a existência desse pólo agregador de todas as forças da
especulação e do genuíno amor aos bastidores e aos cordelinhos. Fosse por
incompetência, por excesso de vaidade mediática ou por mera mesquinhez
genética, estamos órfãos desse talleyranico poder, e o país rumina pelos cantos sem descobrir nem
redenções nem conspirações que o salvem. Em nos ter falhado o poder mítico dum
cavaleiro andante e duma eminência parda estamos confiados a pardos andarilhos
de poder. Sempre com o picotado ao pescoço.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário