Patos Bravos, voltem estão perdoados.

Quando iniciámos o nosso último sonho europeu desfizemos no modelo do pato bravo e acarinhámos o modelo do faisão dócil. Os construtores do nosso futuro idílico seriam então aqueles que recheavam de rodriguinhos e ripipilados estratégicos os seus planos de negócio, com muita baba de tecnologia e inovação, muita zona de caça exclusiva, evoluindo educadamente do endividamento para o financiamento a fim de aterrarem serenamente no leverage, e o português deixaria de ser pau para toda a colher passando a ser mioleira da fina. Aqueles que tinham andado a fazer piquena, rápida e injusta fortuna com o sapato, o ladrilho, a peúga ou a sardinha tinham os dias contados, recolhessem os ferraris à garagem e empacotassem as máquinas de costura porque os dias deles tinham acabado. Fossem para a roménia, para angola ou para marrocos, pois por cá apenas tinham lugar a fina flor do project entulho finance, os faisões dóceis, os que transformariam o cimento em oiro desde que beijassem o cuzinho da fada.
Deu merda.
Agora precisamos outra vez do nosso pato bravo. Precisamos urgentemente daquele nosso jeitoso-oportunista-empresário que desencantava uma fabriqueta de merda num armazém fedorento e explorando umas vinte mães de família desocupadas e meia dúzia de reformados marrecos produzia de rajada 50.000 cuecas ou chanatas, para depois as vender a um holandês que as revendia pelo triplo a uns armazéns de roupa interior em Dusseldorf, derretendo entretanto parte do lucro em mercedes, amantes e sobretudos de cachemira. O tal modelo ultrapassado torna-se de novo uma necessidade premente, e daquelas estratégicas, que são as mais doces. Afinal fazem-nos falta os desenrascados, os patos bravos, os verdadeiros 'exploradores de abismos', fazem-nos falta aqueles que andavam desavergonhadamente atrás do pequeno dinheiro, dos que esticavam até ranger com falta de óleo, mas que, entre mortos e feridos, deixavam uma auréola de miseriazinha bacana, que hoje parece oiro ao pé deste monte de contratos de foguetório e paybacks de cheirinho.
Voltem. Chegou outra vez a vossa hora entre os escombros da social-burocracia e do ressuscialismo. Afinal, foi-se a ver, tínhamos feito a via-sacra ao contrário. Toca a subir 'que o Barrabás quer ir descansado à vidinha dele e o Bom Ladrão tem mais que fazer.

1 comentário:

Mar disse...

Fabulosa sátira..o retratinho exacto deste país.
:-)