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O triângulo mágico inveja, cobiça, ciúme atinge o seu clímax geométrico na desconfiança. É ela que lhes dá o volume, transformando o que se poderia ficar como mera figura artística do plano numa pomposa pirâmide por si encimada. Não deixa de ser estranho o papel que assumem na condição humana algumas propriedades da personalidade que, vistas sem circunstanciação, parecem autênticos monstros de parábola. Mas toda a doutrina moral devia ser muito cuidadosa a abordá-las. Quando o homem sai de si próprio a primeira poça que pisa é a da cobiça. Delicadamente os poetas chamaram-lhe deslumbramento, os prosadores fantasia e, por último, os confessores pecado, por isso muitas vezes não nos damos conta de que é apenas um buraco com água parada. Mal refeito e de pés molhados o homem pisa de seguida uma bosta chamada inveja. Sente-se logo mais desconfortável com o cheiro, o toque pastoso, e procura limpar-se apressado e ajudado pela grande madrinha: a vergonha; eis quando pensava que já poderia andar aos pulos pelos prados verdejantes da virtude quando, depois dum salto mal calculado, escorrega numa folha seca: o cabrão do ciúme; o mais incomodativo dos vértices do triângulo, ali a meio caminho entre o castigo e a sina. Levanta-se, olha para cima, suspira e hesita. Não sabe se deverá continuar ou se deverá voltar para si próprio. O céu transmite sempre sinais contraditórios. Está sempre na mão do homem escolher entre a desconfiança ou a confiança. Escolher entre um topo de pirâmide ou uma infinita abóbada.

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