Desmaker Consulting Group

O único cluster em que Portugal pode verdadeiramente apostar e desenvolver com fortes probabilidades de sucesso é o ‘cluster religioso’.

Fazer negócio estruturado à conta do ‘sentimento religioso’ é, antes de tudo, algo até bastante louvável, preserva-o inclusive das nefastas manifestações de espiritualidade desenfreada, mas deve ser feito com profissionalismo e rigor, respeito pelo cliente e pelo produto. O sentimento, a persuasão, ou a convicção religiosa existem, estão aí, são tão humanas como a fome ou o cheiro e merecem a mesma devida atenção do mundo dos negócios e das artes e ofícios em geral.

Sucinta e graciosamente para quem quiser aproveitar, há que tomar em atenção os seguintes aspectos:

Grupo (mercado alvo) de significativa dimensão e homogéneo - Ao contrário de outros, como por exemplo os automobilistas ou os lampiões, que são claramente grupos heterogéneos, ou doutros, tipo os monhés ou os paneleiros, que se apresentam com muito mais tiques segregacionistas e minoritários, o vasto sortido de crentes representa uma fatia significativa da população, com costumes, ou meras práticas mais ou menos esporádicas, consolidadamente estáveis e comuns. Para além disso, entre o cristão doméstico e o cristão de exportação existem mais pontos de confluência do que, por exemplo, entre o português com caspa e o alemão com caspa, e esta maior uniformidade de interesses ou necessidades tem um valor comercial inestimável.

Mercado com hábitos de consumo rotinados e diversificados – Produtos simples como missais, terços, bíblias, imagens, velas, entre muitos outros intimamente relacionados com o exercício passivo ou activo da piedade, são exemplos maduros de utilização corrente mas, para além disso, este mercado demonstra disponibilidade e mobilização para novos produtos (músicas do padre borga, tshirts do César das Neves, e até, apesar de situadas na franja da ‘porcalhice’, uma ou outra lingerie púrpura ou azul celeste). Poucas áreas da vida humana poderão apresentar um espectro tão largo em torno dum foco simultaneamente tão forte.

Uma marca com notoriedade mundial – ‘Fátima’ é incontestavelmente a maior, mais global e perene marca do País, e funciona tanto de forma explícita, (motivando a presença, a visita) como implícita (motivando a curiosidade periférica sobre o fenómeno). A franchização da marca está toda por fazer, e repare-se: uma terraplanagem e uma azinheira não me parecem custos exagerados de instalação.

A posse exclusiva dm recurso absolutamente escasso - O aparecimento de N. Srª em território nacional, para além de ser algo que quase mais ninguém possui, tem a característica curiosa de nunca se esgotar, nem precisar de se investir mais na sua exploração, ou seja, apareceu: está aparecida! Não é preciso furar mais nada, nem picar rocha, nem peneirar, nem inventar algoritmos novos, nem enfiar pastores em aceleradores de partículas.

Boa adaptabilidade da língua no consumo do produto - Vejamos, a título exemplificativo, um sueco pode perfeitamente ouvir uma ladainha recitada no português de Vital Moreira e acompanhá-la com um sorriso próximo daquele que teria se Nossa Senhora in persona lhe estivesse a cantar uma música dos Abba aos ouvidos. O bichanar em português tem a força clássica duma língua morta e a frescura moderna dum rapper do Bronx. Por exemplo, um terço rezado por aquela moça Inês Meneses da Radar venderia, sem espinhas, bastante mais do que o último disco dos Animal Collective ou dos Vetiver.

A religião é a dimensão humana que melhor se adapta às novas tecnologias – Desde o homem biónico até à beata que apenas lava o cabelo na Páscoa, todos olham para Deus como algo que ora está entranhado no corpo, ora vagueia mais ou menos diafanamente entre as catacumbas da imaginação e estratosfera da virtualidade. A transcendência é o sujeito cibernético por excelência.

Poucas deseconomias sociais – Tirando um ou outro clérigo deslumbrado com os prazeres da alcatra macia, o exercício do negócio do religioso não apresenta significativos desequilíbrios na historicamente delicada relação de trabalho. A hora extra pode ser entendida como penitência, a precaridade pode ser assimilada como entrega nas mãos de Deus, e o trabalho infantil (sem prejuízo da ressalva inicial) pode ser encarado, com ternura, como catequese. Inclusivamente, por exemplo, as contas dum terço, enfiadas uma a uma, depois do jantar, por uma criança que já fez os trabalhos de casa, serão com toda a certeza valorizados suplementarmente. O processo de aquisição do pechisbeque religioso é gerido tanto pelo hipófise como pelo cagaço do inferno.

Julgo que é suficiente. Está todo o trabalho por fazer. O produto religioso está pulverizado por agentes pouco especializados, com horizontes fechados, gerido entre a carolice e o mero aproveitamento de oportunidades confinadas e limitadas. Há claramente espaço para o aparecimento, com sucesso, duma Leya das via-sacras, do missal e do escapulário. Há que dar uma nova e mais estruturada oportunidade às parábolas do reino.

4 comentários:

maria disse...

"Está todo o trabalho por fazer"

Acha mesmo? ouviu falar dos milhares de terços CR? e nem falemos do resto...

beijos :)

aj disse...

Claro! Tudinho por fazer :)

Aliás, esse exemplo só demonstra o amadorismo:

1. se se quisesse aproveitar o cruzamento de marcas com os terços ronaldo nunca deveria ser com milhares mas sim com milhões! teria de ser um terço global e nunca desperdiçá-lo numa michuruquice local.

2. e se repararmos a marca é CR7, ou seja, o nº 7 adequar-se-ia com mto mais propriedade a outros produtos q não o terço. Poderíamos ter uma série de tshirts dedicadas aos pecados capitais, por exemplo. Há q saber estudar o produto. Isto não pode estar na mão de amadores. :)

beijos!

maria disse...

já cá não está quem falou. de clusters percebe o meu caro senhor. eu cá, desde que me tentaram subornar com uma pano de cozinha com uma nossa senhora bordada, que guardo religiosamemnte no fundo de uma qualquer gaveta...vi logo que não tinha alma para o negócio.

aj disse...

minha cara senhora, uma 'paninho bordado para guardar religiosamente' parace-me um belíssimo produto. Um clássico-moderno mesmo.