Homo Congressistus

O dicionário não ilustrado volta às lides políticas com o alto patrocínio da sardinha portuguesa. (Com as entradas 1281 a 1288, dando mais um contributo para o espiolhar sociológico da nossa grei)

Pobres de espírito – Mistura de contornos bíblico-rabelaisianos, e que define o espécime do homem da polis que gosta de pensar com a sua cabeça, desde que esta não destoe muito da dos que estão ao seu lado.

Pragmáticos – Designação que acolhe nas mais diversas teorias com a designação de ‘oportunistas’, mas que no fundo caracteriza filosoficamente o tipo de pessoas que prefere a certeza dum lugar à incerteza duma ideia.

Desocupados – Abrange o género de pessoas que tanto podiam estar ali como na feira da Malveira a apalpar melancias. É talvez o grupo sociologicamente mais válido e coerente, e com maior potencial de concentração onírica.

Encalhados – O congresso parece-me um lugar fadado para o engate. E com características que se encaixam tanto no género tímido como no género marialva. Reparemos por um lado na enorme facilidade na escolha de temas sofisticados para desbravar conversas com potencial de intimidade (ex. o penteado voluptuoso de Mª de Belém, a enigmática virilidade de Maria de Lurdes, ou os lábios idilicamente carnudos de António Costa), e por outro lado na imensidão de momentos de pausas simbólicas para as fulminantes trocas de olhares (por exemplo, um suspiro de Almeida Santos, um raciocínio rápido de Jaime Gama, ou mesmo uma descarga neuronal de António José Seguro). E já nem falo de apagões.

Sacristães – Incapazes de viver longe de quem oficia as cerimónias, mas certos de que a migalha é a antecâmara do papo-seco, este tipo realiza nos congressos um dos seus momentos de glória, onde se faz sentir exuberantemente que sem alguidar de plástico não há lava-pés.

Curriculumeiros – Trata-se do vulgar representante do grupo dos ‘esteves’. Eles estiveram lá é a sua máxima vitae. Naquele Março de 2009, no apagão, foram eles que arranjaram o primeiro petromax para que o líder pudesse ligar para a mãe a avisar que afinal ia jantar. O seu currículo é uma lista de peregrinações a momentos de culto, e muitos ainda guardam a primeira pastilha elástica que Soares mascou quando Ramalho Eanes lhe renovou democraticamente a goela e a bilis.

Carentes – A necessidade de qualquer tipo de companhia é uma marca d’água das sociedades modernas. Não se trata aqui nem de engate, nem de solidariedade ideológica, é apenas a simples e discreta companhia. Alguém que olhe para nós com um sorriso que não seja piedade cristã, ou simples cortesia, não, é aquela coisa de estar na mesma sala do Jorge Lacão ou do Narciso Miranda, e ninguém nos mandar uma piada por issso, e até nos acenarem com a cabeça em sinal de comunitária satisfação, e inclusivamente um ou outro aperto de mão cúmplice sem cheirar ostensivamente a coiratos.

Puros – O que nem Abraão, nem Malthus, nem Darwin podiam adivinhar é que Adão tinha duas costelas parideiras e que, enquanto era cometido o pecado original, uma outra moça, que estava noutra zona a apanhar ameixas para fazer compota, se manteve fora da grande queda primodial e deu origem a uma genealogia de homens puros e bons, mas que, por força duma gama de espermatozoides mais escrupulosos e cuidadosos, nunca se reproduziram excessivamente. Estes homens e mulheres simples apenas sentem o seu destino de zelar pelo bem comum, e embrenham-se por toda a sociedade, incluindo congressos e feiras de enchidos do pingo doce, como pequenas luzes de esperança e amor, procurando apenas disseminar uma mensagem de confiança em lideres a quem um dia um anjo apareceu num sonho.

4 comentários:

Anónimo disse...

O mínimo que se pediria é que as ardinhas fossem em azeite, dado o contexto... Ou em picante, para dar sabor.

C.

aj disse...

em picante 'ardinham' muito...

Anónimo disse...

Uma rodelinha de laranja depois e a boquinha fica como nova.

C.

aj disse...

bem... desde q não fique a beber pela palhinha... :)