Cecille era uma electrona bem posta que trabalhava em microondas numa loja em Genéve. Habituada a viver em ambientes muito magnéticos não havia partícula masculina capaz de lhe exercer uma atracção irresistível, pelo que se mantinha fresca que nem uma electrólise acabadinha de fazer. Mas num daqueles fins de tarde agradáveis à beira do lago, depois de ter comido um gelado com uma amiga que era especialista em torradeiras Phillips – daquelas em que as fatias de pão ficam entaladas na merda dos arames – não lhe saía da cabeça o protão Jacques Philippe que tinha conhecido havia umas semanas no aniversário da sua colega Ófelia, uma electrona portuguesa que trabalhava em aspiradores, pois, dizia-se, tinha elevada capacidade se sucção. Jacques Philippe, que descendia duma linhagem real dado que o seu trisavô tinha estado no próprio Big Bang a combater ao lado do mítico Boson de Higgs, acabara o estágio para pintelho de cronómetros na loja do seu primo Patek, e chegou a acalentar o grande sonho de poder acelerar no novo circuito de LHC, tendo inclusive chegado a conseguir o patrocínio duma casa de ponteiras laser. Infelizmente fora preterido em favor de Louis de Chamounix, um protão ao qual tinha sido diagnosticada hiperactividade desde pequenino e que até já tinha feito o treino em altitude no carril dum funicular dos Alpes. Louis andara meio perdido na vida, e como era muito acelerado dedicara-se inclusive ao roubo de esticão, tendo sido descobertos os seus dotes por um contabilista do CERN alertado pelo grito histérico duma velha electrona alsaciana de férias em Genéve: «agarra que é hadrão!».
Cecille hesitava agora entre a distinção e pedigree de Jacques e a original fogosidade de Louis, cumprindo o clássico dilema feminino: segurança ou aventura; ou seja, no caso: uma vida estável nas suaves e previsíveis ondas electromagnéticas, ou uma vida de ansiedade e emoção sempre a ver se o seu amor se transformava em fogo de artifício iluminando quanticamente a humanidade, ou se escaqueirava todo numa curva mais apertada do magnético acelerador.
Estava Cecille absorta nestes pensamentos quando lhe aparece a sua amiga Ofélia, chorosa: tinha sido alvo de assédio por um buraco negro em expansão. Temerosa, agora, via bandos de quarks por todo o lado a tentarem violá-la. Mas Cecille, enquanto a consolava e a ajudava a recompor-se, nem acredita naquilo que os seus olhos focam: Jacques Philippe passeia-se calma e alegremente com uma Neutrona vistosa e loira, que parecia saída duma sessão de oxigenação de partículas – moda muito em voga desde que Stephen Hawking fez o seu primeiro artigo ilustrado sobre cosmologia inflacionária para a revista Elle. -«Filho duma grandessíssima Protona! E dizia ele que me seria para sempre fiel que nem um protão suíço» desabafou Cecille, espumando radiação. E foi assim que, ao saber-se e sentir-se enganada, Cecille fez uma plástica à base de fermionas, e se tornou na primeira electrona a acelerar nas pistas de Genéve, arrastando a cauda a uma legião de hadrões speedados, tendo ficado conhecida na história da física nuclear como a Bozona de Lemán.
1 comentário:
Afinal havia outra! E eu pràqui a pensar em pão de forma...
C.
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