Alarmada com tanto assunto, a Ordem dos Humoristas reuniu-se de emergência a fim de estabelecer um critério que guiasse esta comunidade sem ela se perder no seio duma realidade tão prolixa, tão rica.
Desde que Macário Correia deixou de lamber cinzeiros na sua cruzada anti tabágica que a quantidade de situações anedóticas do país não atingia níveis tão preocupantes, se excluirmos a literatura erótica do José Rodrigues dos Santos.
Para começar haveria que distinguir o que eram piadas urgentes e o que podia perfeitamente esperar um diazinho ou dois antes de se espremer. Que piadas seriam para tratamento ambulatório, e assim poder-se-iam arrastar uma semana ou duas, e quais as piadas que exigiriam imediata intervenção com internamento em suplemento ou reportagem criados especificamente para elas. Piadas em que se exigia o total e explícito esmagamento dos visados, ou aquelas em que estes ainda ficavam sem saber se estavam a ser gozados ou não. Enfim, não se tratava bem de estabelecer regras de conduta, mas sim a definição concreta do ‘acto humoristico’. No fundo desenhar aquela fronteira difícil do que compete aos humoristas ou do que compete aos políticos.
O exemplo Manuel Pinho era um dos paradigmas para a classe: a ele bastar-lhe-ia existir e abrir boca uma vez por semana, os profissionais do humor fariam tudo o resto praticamente em piloto automático.
Outros dos paradigmas era o ‘Benfiquismo’ em geral. Por exemplo, na realidade ter alimentado na realidade esperanças de que o campeonato na realidade era uma hipótese com um treinador que na realidade era Fernando Santos na realidade parece algo irreal e apenas ao alcance de humoristas de grande capacidade de sofrimento, na realidade um sub grupo muito pouco valorizado.
As situações vividas no CDS pareciam já mais previsíveis desde que o modelo do taxi tinha sido abandonado. Aqui o humorista apenas deveria apenas ir mantendo – como se diz na gíria económica – a fonte de rendimento, nunca procurando esgotar o tema, já que este tinha alimentado muitas boquinhas de humoristas em momentos de menor exuberância da Manuela Moura Guedes e do António Perez Metello.
Um desafio que se colocava agora a toda a comunidade era como substituir Saramago, que tinha entrado claramente em fase de menor produção, tanto mais que Lobo Antunes, desde não fosse entrevistado pelo Rodrigues Guedes de Carvalho, cada vez apresentava menos condições para a passagem de testemunho. Foi então decidido voltar a acompanhar com particular atenção a carreira de Inês Pedrosa e Lídia Jorge, duas promessas algo adiadas.
Mas era no triângulo “cherne-picareta falante-engenheiro civil” onde se iria decidir todo o futuro do sector. O alarme gerado pela piada genérica (tipo ‘falam-falam’ ou ‘é que é já a seguir’) tinha deixado algumas franjas nervosas e haveria então que regulamentar bem a utilização dessa riqueza nacional recente que são a inteligência e espírito patriótico de Durão barroso, o pragmatismo de Guterres e a imaculada folha de serviços académicos de Sócrates. Todos se lembram de como Cid já tinha esgotado o filão de Ramalho Eanes & Manelinha, de como se perdeu um Braga de Macedo sem honra nem glória no meio dum oásis, ou um Carrilho no meio duma Bárbara, enfim, todos reconheceram que estava chegado o momento de salvaguardarmos o nosso verdadeiro património humorístico: ‘os primeiros ministros’.
Em síntese, foi aprovado por unanimidade que um primeiro-ministro tem de garantir pelo menos uma borla humorística nova por mês; poderá, no entanto, ficar dispensado um mês, se fornecer um escândalo fiscal com o IVA do canalizador, e a dispensa poderá ir até três meses se se tratar dum escândalo sexual com a filha do próprio canalizador. Em casos extremos a dispensa de tema para piadas novas pode ir até seis meses ao se tratar dum escândalo sexual com a filha dum canalizador que não passa factura, e existirem flagrantes fotográficos num hangar em construção sobre estacas desenhadas por um engenheiro civil da universidade independente na bacia hidrográfica da Ota. (mas, claro, desde que este tenha tirado o curso entre os anos 95 e 96, altura em que eram os próprios serviços da universidade que forneciam as pilhas para máquinas de calcular)
A reunião terminou com a assinatura dum protocolo com o Sporting Club de Portugal para este deixar de colocar o Alecsandro na equipa enquanto estiverem em emitir programas humorísticos em qualquer dos canais (entrevistas do Mário crespo incluídas).
Sem comentários:
Enviar um comentário