J. Rodrigues dos Santos mas em versão tipo-ler-os-clássicos

O tal de Nabokov em ‘Ada ou ardor: uma crónica de família’ (1969):

«Três mulheres egípcias, mantendo-se submissamente de perfil (longo olho de ébano, encantador nariz arrebitado, juba negra entrançada, vestido de faraó cor de mel, magros braços ambarinos, pulseiras negras, brinco de ouro do feitio da rosca, bisseccionado por uma dobra da juba, faixa de cabelo à pele vermelha e peitilho ornamental), (...) prepararam-me mediante aquilo a que o sedento Eric chamava «delicadas manipulações de certos nervos cuja localização e cujo poder só são conhecidos por alguns antigos sexologistas» acompanhadas pela não menos delicada aplicação de certos unguentos mencionados, não muito especificamente, no pornolore da Orientalia de Eric, prepararam-me, dizia, para receber uma virgenzinha assustada, descendente dum rei irlandês, como fora revelado a Eric no seu último sonho em EX, Suiça, por um mestre-de-cerimónias mais funerárias que fornicatórias.
Os preparativos prosseguiram em ritmos tão prolongados e tão insuportavelmente deliciosos que Eric, morrendo no sono, e Van, palpitando de vida impura num divã rococó, (...) não podiam imaginar como as três jovens damas, que subitamente se libertaram das vestes (famoso artifício onirótico), conseguiam prolongar um prelúdio que mantinha uma pessoa durante tanto tempo à beira da dissolução. Eu jazia supino e sentia-me com o dobro do tamanho que jamais tivera (...), quando, finalmente, seis suaves mãos tentaram instalar la gosse, a trémula Adada, no terrível instrumento. Uma compaixão idiota, sentimento que raramente experimento, murchou-me o desejo e ordenei que a levassem para um banquete de pêssego e natas. (...) Depois de demorado exame e de muito gabar de ancas e pescoços, escolhi uma Gretchen dourada, uma pálida andaluza e uma beldade negra de Nova Orleães. As servas caíram-lhes em cima que nem leopardos e, depois de as afinarem com zelo e uma fúria não desprovidos de matizes lésbicos, entregaram-me as três melancólicas graças. (...) Só uma das raparigas me acertou em cheio na alma, mas passei-as às três à fieira, teimosa e lentamente, «mudando de montada a meia travessia» (...), antes de terminar todas as vezes no abraço da ardente ardiluza, a qual disse, quando nos separámos, após um último espasmo (embora a tagarelice não erótica fosse contra o regulamento) que o seu pai construíra a piscina da propriedade do primo de Demon Veen. ». (pg 185, das Ed Europa América, 1977)

Mas, no fundo, percebe-se porque é que os brasileiros gostam deste gajo;
Esse mesmo que escreve, por exemplo, na tal assinalada pag. 158 das ‘Littératures II’ que « le manque de goût de Dostoievski, son commerce monotone avec des êtres souffrant de complexes préfreudiens, sa façon de se complaire dans les mésaventures tragiques de la dignité humaine, voila qui est difficile à admirer». Podias só te ter dedicado a depilar borboletas, filho.
G. Steiner dizia (qualquer coisa como, dado que não tenho o texto por perto) que há um novo eros depois de Dante, novas relações humanas depois de Shakespeare, e novas guerras depois de Tolstoi. Eu acrescentaria, e há uma nova conversa de chacha depois de Nabokov.

Mais vale dois.toievskis a pôr-nos a alma na mão do que n’bacokovs a borboletarem-nos os sentidos no ar.

texto que nada tem a ver com Alexandre Soares Silva, blogueiro brasileiro, que não faço a mais pequena ideia quem seja, e que ontem, aparentemente, terá estado na casa Pessoa (casa estimada e onde eu já estive) a falar do Nabokov, entre outros.

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