Revelações da córnea
«O meu deus é apenas a transcendência que vislumbro a espaços nos olhos dos meus filhos» leio no controversa maresia. Primeiro achei aquele tipo de frase de belo efeito para consumo de agnóstico entre dois scones, depois senti ali uma bonita lamechice literária de mãe, depois vi um lugar comum sacudindo a desmetafisiquizada incomodidade de não acreditar em Deus, depois fiquei lixado e invejoso por não sentir transcendência nenhuma quando vejo os olhos dos meus filhos, depois ainda pedi ao sacana do meu filho mais novo para parar de piscar os olhos, e antes de ir ao que interessa ainda pensei que Deus se manifesta de muita maneira mas privilegia as dissimuladas porque infelizmente gastou a verba para milagres pirotécnicos há uns anos atrás.
É muito difícil encontrar Deus se apenas o procuramos na bondade das coisas ou das pessoas, como quem procura Neptuno no recheio duma santola, e é por isso que ainda dou algum crédito à filosofia, à teologia e à metafísica que lá se vão equilibrando, fugindo e relativizando alguma poeira ou vinagre ou sentimentalite que a realidade vai cozinhando. Não se sabe no que o Altíssimo pensava quando achou que, e como, se tinha de revelar; certamente fez um balanço sobre o ‘livre arbítrio’ e sobre a ‘predestinação’, calculou que intelectualmente nunca conseguiremos fugir totalmente da dependência de nenhuma delas, e arriscou naquele filmaço de enviar o seu Filho antes da geração de Hollywood, CNN e Microsoft, deixando tantas variáveis em aberto quantas as equações por resolver.
Acreditar em Deus, no Deus expresso na Cristandade, é um equilíbrio entre o coração, a razão e a revelação. Dizer «o meu deus é apenas» mostra essencialmente uma gritante menorização da nossa condição – não consciente, claro – uma condição que para ver mais além (uma tal de transcendência) só o conseguiria a espaços por exemplo através dos olhos dos filhos. Mas até encontro bastantes méritos neste mitigado método: aposto que se olharmos para os olhos dos nossos filhos, depois se olharmos para os nossos próprios olhos (um espelhito de cabeleireiro serve) e finalmente se acabarmos por olhar para os olhos duma velhita doente a rezar (ver o Ricardo a beijar a medalhinha é opcional), Deus há-de acabar por aparecer nem que seja aos ziguezagues envolto numa neblinada, controversa e fresca maresia, mesmo que não venha caminhando pelas águas chupando alegremente uns percebes.
Mas chego aqui e a verdadeira conclusão que alcanço é que acredito em Deus principalmente porque a minha mãe me disse para acreditar, certamente olhando-me com aquele mesmo olhar com que a VdM olha para os seus filhos.
«O meu deus é apenas a transcendência que vislumbro a espaços nos olhos dos meus filhos» leio no controversa maresia. Primeiro achei aquele tipo de frase de belo efeito para consumo de agnóstico entre dois scones, depois senti ali uma bonita lamechice literária de mãe, depois vi um lugar comum sacudindo a desmetafisiquizada incomodidade de não acreditar em Deus, depois fiquei lixado e invejoso por não sentir transcendência nenhuma quando vejo os olhos dos meus filhos, depois ainda pedi ao sacana do meu filho mais novo para parar de piscar os olhos, e antes de ir ao que interessa ainda pensei que Deus se manifesta de muita maneira mas privilegia as dissimuladas porque infelizmente gastou a verba para milagres pirotécnicos há uns anos atrás.
É muito difícil encontrar Deus se apenas o procuramos na bondade das coisas ou das pessoas, como quem procura Neptuno no recheio duma santola, e é por isso que ainda dou algum crédito à filosofia, à teologia e à metafísica que lá se vão equilibrando, fugindo e relativizando alguma poeira ou vinagre ou sentimentalite que a realidade vai cozinhando. Não se sabe no que o Altíssimo pensava quando achou que, e como, se tinha de revelar; certamente fez um balanço sobre o ‘livre arbítrio’ e sobre a ‘predestinação’, calculou que intelectualmente nunca conseguiremos fugir totalmente da dependência de nenhuma delas, e arriscou naquele filmaço de enviar o seu Filho antes da geração de Hollywood, CNN e Microsoft, deixando tantas variáveis em aberto quantas as equações por resolver.
Acreditar em Deus, no Deus expresso na Cristandade, é um equilíbrio entre o coração, a razão e a revelação. Dizer «o meu deus é apenas» mostra essencialmente uma gritante menorização da nossa condição – não consciente, claro – uma condição que para ver mais além (uma tal de transcendência) só o conseguiria a espaços por exemplo através dos olhos dos filhos. Mas até encontro bastantes méritos neste mitigado método: aposto que se olharmos para os olhos dos nossos filhos, depois se olharmos para os nossos próprios olhos (um espelhito de cabeleireiro serve) e finalmente se acabarmos por olhar para os olhos duma velhita doente a rezar (ver o Ricardo a beijar a medalhinha é opcional), Deus há-de acabar por aparecer nem que seja aos ziguezagues envolto numa neblinada, controversa e fresca maresia, mesmo que não venha caminhando pelas águas chupando alegremente uns percebes.
Mas chego aqui e a verdadeira conclusão que alcanço é que acredito em Deus principalmente porque a minha mãe me disse para acreditar, certamente olhando-me com aquele mesmo olhar com que a VdM olha para os seus filhos.
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