My M.’Mena Mónica (condensed) side of the soul
Naquele ano apenas me faltou aparecer um anjo e ir às putas. L.Freud tinha sido nomeado para a short list do Turner e eu lia duma forma diferente pela primeira vez aquele familiar dele mais conhecido, coincidência ou não passei a ter sonhos mais descontrolados e imprecisos, pus Dostoievski numa prateleira, por um triz Anna K. não foi para a enfardadeira e agarrei-me à pele. Alguma sabedoria tinha-me ensinado que desenfreado era a pior forma de galopar, e isso fez-me rodear fossos que luziam como espelhos de água, mas não deixava de lutar entre uma vertigem de mustang e um entardecer de cavalo de cortesia. Afligia as hostes com uma pose de playboy a rezar o terço já me chegaram a recapitular. Pela primeira vez a frieza duma mão certamente mal afagada afastou-me duma fornicação desejada e também saíram as primeiras lágrimas depois duma canção certamente também ouvida vezes demais. Mas Deus esteve sempre por perto, está na Sua natureza aliás (deve ser uma ‘divindade de proximidade’ como diria agora o poeta-candidato ) e os melhores pecados são aqueles que afinal não eram; a moral começou a eliptizar-se (é arrepiantemente parecido com eclipsar-se, porra) numa defesa matemática, num desencruzilhadamento cartesiano. Olhava para os filósofos gregos com desdém, tinham-me fodido várias idas à praia, iria trocá-los por existencialistas foi a minha primeira ideia de vingança, mas nenhuma miúda me quis acompanhar nessa viagem, nessa altura os cremes não seriam tão bons certamente, preferiam bons jantares, o pior que pode acontecer a um homem é ter dinheiro para jantar todos os dias nos restaurantes da moda, acreditem, se bem que o primeiro beijo que me acasalou foi à saída dum deles, já na altura os versos do papel da factura também rimavam, mas tive de me deixar rápido desse estrofeamento, o inconsciente não era parvo e preferia viver Lacana e hibernadamente, porque nem o muro de Berlim ainda tinha caído, nem a Andie MacDowell me tinha dado a maior nega da minha vida (mas ela também não deve ter ficado bem da cena porque depois foi fazer ‘sexo, mentiras e video’)
Estava-se naquele ano, pois, e Madonna não tardaria muito a ir vender Pepsi Cola ‘Like a Prayer’; a minha vida sonhou por momentos poder ser vivida entre «colhendo doce fruito» (1) ou a «cuidar das rosas» (2), mas realmente se adivinhasse ter-me-ia era preparado para fazer parar um tanque em Tiananmen em vez de montar operações de privatizações de bancos até às tantas da noite, o que nem me deixava ler a Anais N. em condições quanto mais voltar ao cirílico; nunca mais leria ‘Um herói do nosso tempo’ no original. Chateava-me fazer gajos ricos que não conheciam Lermontov, mas tinha sido treinado para isso e tinha-se esfumado a minha oportunidade sonhada de montar um negócio clandestino de bíblias em S.Petersburgo; ao meu lado iam-se casando, repletos duma prenupcialidade de lista, davam à costa as primeiras mulheres enciumadas das amizades dos seus agora maridos, a realidade mostrava-se uma forte possibilidade para tema dum best-seller-light, mas a ironia e o pessimismo ainda não se apresentavam como o lubrificante certo para a grande foda dos dias e falava-se da experiência e da novidade como duas manas afrodisíacas de forte compatibilidade.
João Paulo II estava prestes a receber Gorbatchov, a grande eslavia iria ser libertada muito antes das mulheres se poderem consagrar e eu recomeçava a fornicar, esquecendo mestres e apenas confiando no vento para me afastar das concubinas e das virgens profissionais. Lia apenas os ‘Actos dos Apóstolos’ porque geriam mais serenamente a função da metáfora, mas começava a sentir alguma saudade de gozar com o Chesterton, o Tolkien e os poetas parnasianos, e como não se podia levar Pavese para a neve, nem ser visto a ler Beckett num monte alentejano, começava o turismo industrial falhando algumas missas de domingo, mas acabando por só encontrar infidelidades conjugais em gajos a descair para o gordo e que não faziam a mais pequena ideia de quem era Kundera. Felizmente conservei aquele distanciamento da política muito balzaquiano que pouco mais encontrava nela do que um objecto literário ao mesmo nível da perfumaria; só que nessa altura eu também bastava cheirar uma zurrapa qualquer do paço rabane no perímetro de duas coxas que mudava de idealista para pragmático em segundos, que o Deus dos teólogos me perdoe; não perdoou totalmente, acho; mas poupou-me a Kierkegaard à base de miúdas arejadas e com bom ciclo menstrual. Não liguem, eu sempre fui muito dado a achar coisas, noutro dia até via ossos onde estavam sapatos de salto alto.
A melhor sensação do mundo é sermos ingénuos depois de julgar já ter sabido tudo.
E a vida não passa duma mnemónica.
(1) esta frase pode ler-se em ‘educação sentimental’
(2) esta frase pode ler-se em ‘jardim de luz’
Naquele ano apenas me faltou aparecer um anjo e ir às putas. L.Freud tinha sido nomeado para a short list do Turner e eu lia duma forma diferente pela primeira vez aquele familiar dele mais conhecido, coincidência ou não passei a ter sonhos mais descontrolados e imprecisos, pus Dostoievski numa prateleira, por um triz Anna K. não foi para a enfardadeira e agarrei-me à pele. Alguma sabedoria tinha-me ensinado que desenfreado era a pior forma de galopar, e isso fez-me rodear fossos que luziam como espelhos de água, mas não deixava de lutar entre uma vertigem de mustang e um entardecer de cavalo de cortesia. Afligia as hostes com uma pose de playboy a rezar o terço já me chegaram a recapitular. Pela primeira vez a frieza duma mão certamente mal afagada afastou-me duma fornicação desejada e também saíram as primeiras lágrimas depois duma canção certamente também ouvida vezes demais. Mas Deus esteve sempre por perto, está na Sua natureza aliás (deve ser uma ‘divindade de proximidade’ como diria agora o poeta-candidato ) e os melhores pecados são aqueles que afinal não eram; a moral começou a eliptizar-se (é arrepiantemente parecido com eclipsar-se, porra) numa defesa matemática, num desencruzilhadamento cartesiano. Olhava para os filósofos gregos com desdém, tinham-me fodido várias idas à praia, iria trocá-los por existencialistas foi a minha primeira ideia de vingança, mas nenhuma miúda me quis acompanhar nessa viagem, nessa altura os cremes não seriam tão bons certamente, preferiam bons jantares, o pior que pode acontecer a um homem é ter dinheiro para jantar todos os dias nos restaurantes da moda, acreditem, se bem que o primeiro beijo que me acasalou foi à saída dum deles, já na altura os versos do papel da factura também rimavam, mas tive de me deixar rápido desse estrofeamento, o inconsciente não era parvo e preferia viver Lacana e hibernadamente, porque nem o muro de Berlim ainda tinha caído, nem a Andie MacDowell me tinha dado a maior nega da minha vida (mas ela também não deve ter ficado bem da cena porque depois foi fazer ‘sexo, mentiras e video’)
Estava-se naquele ano, pois, e Madonna não tardaria muito a ir vender Pepsi Cola ‘Like a Prayer’; a minha vida sonhou por momentos poder ser vivida entre «colhendo doce fruito» (1) ou a «cuidar das rosas» (2), mas realmente se adivinhasse ter-me-ia era preparado para fazer parar um tanque em Tiananmen em vez de montar operações de privatizações de bancos até às tantas da noite, o que nem me deixava ler a Anais N. em condições quanto mais voltar ao cirílico; nunca mais leria ‘Um herói do nosso tempo’ no original. Chateava-me fazer gajos ricos que não conheciam Lermontov, mas tinha sido treinado para isso e tinha-se esfumado a minha oportunidade sonhada de montar um negócio clandestino de bíblias em S.Petersburgo; ao meu lado iam-se casando, repletos duma prenupcialidade de lista, davam à costa as primeiras mulheres enciumadas das amizades dos seus agora maridos, a realidade mostrava-se uma forte possibilidade para tema dum best-seller-light, mas a ironia e o pessimismo ainda não se apresentavam como o lubrificante certo para a grande foda dos dias e falava-se da experiência e da novidade como duas manas afrodisíacas de forte compatibilidade.
João Paulo II estava prestes a receber Gorbatchov, a grande eslavia iria ser libertada muito antes das mulheres se poderem consagrar e eu recomeçava a fornicar, esquecendo mestres e apenas confiando no vento para me afastar das concubinas e das virgens profissionais. Lia apenas os ‘Actos dos Apóstolos’ porque geriam mais serenamente a função da metáfora, mas começava a sentir alguma saudade de gozar com o Chesterton, o Tolkien e os poetas parnasianos, e como não se podia levar Pavese para a neve, nem ser visto a ler Beckett num monte alentejano, começava o turismo industrial falhando algumas missas de domingo, mas acabando por só encontrar infidelidades conjugais em gajos a descair para o gordo e que não faziam a mais pequena ideia de quem era Kundera. Felizmente conservei aquele distanciamento da política muito balzaquiano que pouco mais encontrava nela do que um objecto literário ao mesmo nível da perfumaria; só que nessa altura eu também bastava cheirar uma zurrapa qualquer do paço rabane no perímetro de duas coxas que mudava de idealista para pragmático em segundos, que o Deus dos teólogos me perdoe; não perdoou totalmente, acho; mas poupou-me a Kierkegaard à base de miúdas arejadas e com bom ciclo menstrual. Não liguem, eu sempre fui muito dado a achar coisas, noutro dia até via ossos onde estavam sapatos de salto alto.
A melhor sensação do mundo é sermos ingénuos depois de julgar já ter sabido tudo.
E a vida não passa duma mnemónica.
(1) esta frase pode ler-se em ‘educação sentimental’
(2) esta frase pode ler-se em ‘jardim de luz’
(e como é óbvio o conteúdo do suprapostado não tem rigorosamente nada a ver com qualquer dos blogs citados nem com qualquer outro por citar)
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