em versão comunhão dos santos; walking aos bochechos around [1][2][3][4][5][6][7][8]and [9]
«Nenhum de nós vive para si mesmo, e nenhum de nós morre para si mesmo»
S.Paulo, Carta aos Romanos 14, 7
[1] A ideia do “corpo místico de Cristo”, apesar dos seus “contornos beatos”, tem um quê de especial. Tem uma "força metafórica" como toda a palavra revelada e lembra-me até que Deus é a única palavra que se manteve metáfora - e repare-se que Jesus nada escreveu, nem mandou escrever. E é por isso que Deus ( na sua concepção cristã – a até mais precisamente católica) será sempre a fusão entre o "Logos" joanino, o Parabolador dos sinópticos, o Paráclito, e aquela Coisinha que nos mexe na alma e que às vezes até deixa que lhe chamemos comichão; entre outras coisas.
[2] A ideia de que «só nós estamos no mundo; Deus não se aproxima desta atmosfera» ( in Aviz ) é instrumentalmente boa para servir o essencial - e louvável - conceito de separação entre a cidade de deus e a cidade dos homens, que Deus desejou ao nos ter criado livres, mesmo que nós não percebamos o alcance disso – e não percebemos mesmo; no entanto, essa expressão encerra uma ‘mentirita’: é que Deus é precisamente a nossa atmosfera; podermos pensar que Deus está fora do mundo é uma limitação da nossa condição, mas é ao mesmo tempo uma hipótese que Deus nos dá de não sufocarmos com a sua presença. Entrelaçante.
[3] A divindade, tal como o “tudo-liga-com-tudo” são realidades ora demasiado pesadas ora demasiado atraentes; Deus aparentemente deixou-nos também o caminho “armadilhado” entre uma 'salvação' intrinsecamente individual e uma 'salvação' intrinsecamente comunicante (é pena a imagem do rebanho estar anatematizada neste cantinho porque agora dava-me jeito; se calhar ainda terei de me agarrar à videira) e como não bastasse, na ratoeira o queijo era da ilha; dos amores.
[4] Verificar que precisamos uns dos outros é – e sempre foi - uma forte facada para as teorias da auto-suficiência ( quer ontológica quer ‘apenas’ sentimental); O meu sonho metafísico também era ser uma espécie de jardim suspenso da Babilónia, que para desenjoar de vez em quando me transformava em Taj Mahal, e nos dias piores me julgava mesquita Azul, mas no ‘acordar do ser’ confirmo-me sempre numa vida de videira. Que também precisa de respirar antes de ser usado; como algum ‘sumo da uva’.
[5] Sermos usados é uma inevitabilidade desta condição comunicativa. Somos todos seres por onde os outros passam e somos todos seres de passagem: todos seres vaginais; Fecharmos as pernas aos outros será apenas uma ilusão de pudor. Abri-las pode ser uma ilusão de poder. Deus quis-nos fodidos e bem fodidos. Alguns são bem pagos.
[6] Nem sempre a proximidade com Deus é uma experiência teológico-intelectual, nem sempre é uma experiência místico-sentimental, muitas vezes é quase uma experiência social: Deus ‘pensou-nos’, ‘concebeu-nos’, quis-nos essencialmente influenciáveis. Nós gostamos de nos ver seres artesanais, mas somos muito mais industriais, somos seres de repetição e replicação. A nossa imprevisibilidade é da ordem do estatístico, só que isto soa horrível assim escrito. É melhor não pensar nisso.
[7] Os conceitos de unidade consubstancial que a teologia distribui quase panfletariamente, poderiam deixar Deus à beira duma hecatombe de metáforas culinárias, no entanto bem vistas as coisas trata-se de dar à ‘ligação’ uma dignidade filosófica e mostrar que ela existe para além da fibra óptica ou das ondas a babarem-se na frequência. Só que às vezes eu gostava mesmo era que o cuspo de Deus se fizesse lama e me lavasse os olhos, para poder ir tomar banho prá piscina de Siloé e voltar topando tudo; e como se nada se tivesse passado. Caraças. Infelizmente esta palavra não existe em aramaico.
[8] No evangelho de S.João (14) a “despedida de Jesus” inicia-se com um claro «não se perturbe o vosso coração» e é seguido mais à frente dum quase entusiasmante «não se atemorize», que estão associados ao “poder” que decorreria de acreditar n’Ele, como «o caminho, a verdade e a vida» (num estilo quase exclusivista que hoje atrapalharia os ecumenismos mais bacocos, se levado à secura da letra). O amor a Deus não é um sentimento muito simplificável ou redutível, como não o é o amor entre os homens (até pelas suas ligações ao conhecimento/reconhecimento), mas em qualquer dos casos apresentam-se-me ambos como a única forma de nos “afastarmos” decentemente de nós mesmos, que é por sua vez a inesperada fórmula de sucesso (e de prova dos nove) para nos voltarmos a encontrar verdadeira e serenamente quanto baste, fazendo jus à Sua ( Pai e Filho) frase/promessa «nele faremos morada», reveladora em definitivo da nossa intrínseca, mas tão mal vista, hospitalidade ontológica. Mas que Deus me esconda de mim próprio é às vezes o meu desejo secreto; e se Ele ‘falhar’, que avance o Consolador se faz favor.
[9] Não é por podermos acreditar em Deus, no Céu, no Infinito, que deixamos de ser mamíferos, ali todos agarradinhos ao nosso meio natural, mas só o fenómeno religioso produz o arcaísmo e a ambivalência (mais ou menos mitológica) capazes de aliviar a nossa condição da sua frágil noção de tempo. É nesse ligar que está o ganho, mas também é no separar que se prepara a força da união. Deus também gostará de nos ver de mãos nos bolsos e a assobiar para o lado. Desde que no fim pisquemos o olho, claro. A criação é um universo de engate.
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