Tudo aponta para que nos tornemos num novo matriarcado.
Aguardo com serenidade e até com alguma entusiasmada esperança essa chegada ao
poder das mulheres. Cada mulher transporta consigo a sabedoria milenar que
proporcionam os actos de menstruar, engravidar, parir e amamentar. São os
mamíferos por excelência e chegarão ao poder por direito próprio. Podemos dizer
que milénios foram necessários para que se fizesse justiça. O tempo das
mulheres quase parece mais um tempo geológico do que biológico. E aplica-se,
confirmando-se, a analogia: são inflexíveis como pedra.
A questão que se colocará então agora já não terá a ver com
o papel das mulheres mas outrossim com o papel dos homens.
O homem passará progressivamente a ser o grande
desconhecido. Parte com estigmas de vária ordem: eterna criança, amadurecimento
retardado, manipulável por desígnios de baixa dignidade, facilmente corruptível,
agarrado aos pequenos poderes que tenha mais à mão, propenso à infantil
violência, totalmente vulnerável a ternuras de ocasião, entre eteceteras
vários. Vai demorar milénios até recuperar.
Acossado pela subalternidade, acossado pelas dialécticas de
género, acossado pela ameaça do desconhecido e pela falta ou dispersaõ das
famosas referências, o homem irá forçosamente colocar o seu destino na mão dos
Câncios que forem mais expeditos e convincentes.
Eu tenho um plano para os homens.
Ao contrário do que aponta o senso comum o homem tem um
talento especial para ser desprezado. É uma vitimização especial, atenção, não
confundir com espécimes mais vulgares, nem com a qualidade estritamente
feminina que é dominar pela fragilidade. O homem consegue posicionar-se naquele
lugar de aparência instável que é o vazio. Vendo que lhe foram assacadas as
maldições da espécie o homem irá recolher à caverna e voltar a observar as
sombras no quentinho.
No cantinho dos desprezados – as mulheres vão fazê-lo com o requinte
das grandes vingadoras e não terão piedade – o homem não precisa de recuperar a
confiança pois nunca a perdeu, mas pela primeira vez vai ter consciência que há
uma guerra de sexos antes de todas as outras guerras. Ou seja, vai fazer o que
já bem podia ter feito se não tivesse cego pelo poder: reconhecer a existência
do inimigo.
Ponto da situação: desprezado, num canto, e a observar os
movimentos das sombras do inimigo fêmeo. Afinal a mulher é apenas um homem que
decidiu aprimorar alguns talentos em detrimento de outros. Um darwinismo antes
de Darwin que se operou numa dobra do genesis que ainda ninguém tinha acedido. Einstein
tinha estado ocupado com o casamento do tempo com o espaço e esquecera-se do
que se passava no bordel da criação.
O plano deve seguir. A mulher vai achar que não vai cometer
os erros do homem e fingirá que tudo é apenas um desprezo estético. Vai tratar
o homem como se fosse roupa de estação e elevar a condescendência a máximos olímpicos.
E o homem vai deixar correr.
O momento chave será sempre o do excesso de confiança. A
mulher vencera a sua batalha quando finalmente desistiu de apostar no famoso ‘fazer
das fraquezas força’ depois de ter posto todas as fichas nesse cavalo durante
séculos e decidido ir à luta com as mesmas armas do homem: domínio do
conhecimento, domínio do relacionamento, domínio do preço.
O passo seguinte será sair do cantinho seguro dos
desprezados. A fresta abrir-se-á no momento em que a mulher se cansar de
mandar. A corrente de ar ficará de feição quando a mulher não souber como pedir
ajuda. Irá desaprender esse grande talento. Voltarão em força as pequenas
debilidades: ler mapas, desenroscar frascos, interpretar a beleza dum fora de
jogo, perder-se nos pormenores. A mulher irá cair nas ratoeiras que, na sua
ansia de poder, se esqueceu de recolher e destruir. Ficará ciumenta como nunca
tinha sido, ficará novamente refém do seu corpo, falará demais, desistirá e
entregará novamente o mundo aos desprezados.
Desta vez nem será preciso um novo dilúvio. Noé ficou dispensado do novo resgate. O homem
retomará os comandos com todas as suas qualidades intactas.