Luisa Maria, nome de código @luisimia80,
era uma mulher-com-ideias tentando impor-se no já sobrepovoado mundo do
cronismo meta-jornalístico e buscava um reconhecimento que lhe permitisse
chegar ao olimpo do poder dizer-o-que-quisesse pois todos lhe reconheceriam
sempre muita-graça-e-estilo. Ora a frescura embalada chegou primeiro ao
jornalismo do que às saladas e ela tinha de treinar, no duro mas aparentando
leveza, no confronto do seu sucesso com o da concorrência. Contava com uma
coisa boa, neste meio onde agora habitava em time-sharing os concorrentes
tinham o inusitado hábito de se coçarem uns aos outros, o que tornava muito
curiosa a confrontação; tirando alguns bichos-do-mato no geral eram quase todos
peluches vestidos de cabedal. A televisão também andava compradora de boquinhas
de chumbo & lã e com apenas uma ideia fresca decoravam-se logo meia dúzia
de saladeiras de porcelana de Opina.
Mas neste novo mundo havia agora um
bónus onde todos os cronistas & afins podiam expor as pernocas para testar
os passos do baile e tornarem-se caras mais conhecidas: o Cabaret da Tuita
tinha todas as noites números especiais para comentadores em ascensão.
Chegava-se lá e, em bar aberto durante umas horas, ia-se lançado um foguetório interactivo
apalpando a audiência e aproveitando para observar o volume da braguilha cerebral
dos clientes habituais. Como se diz no economês moderno, era um indicador
avançado de popularidade.
Só que Luisa Maria, que no
Cabaret da Tuita se transformava na @luisimia80 e vestia um avatar de
franja-e-biblioteca, começou a escrever de arrastadeira. Quando morria gente
que ela não conhecia e recebiam prémios artistas que lhe eram alheios, ela
apenas podia aliviar-se numas palavras de circunstância, fazendo um semi
cancan-de-graça e citando outros amigos que também por lá andavam a mostrar as
partes baixas do pensamento, em fishing for retuiters, uma espécie de table
dance muito em voga no Cabaret.
E enquanto lá ia ela soprando
o seu menu de banalidinas, de mesa em mesa, servindo groselha como se fosse
Bacardi e anunciando que vendia bibelots de palavreado noutras bancas de
vaidades, a idade avançava e o metabolismo das hormonas ia pondo pastilhas
novas nos travões.
Luisa Maria tinha deixado que a @luisimia80
lhe esvaziasse a alma e lhe secasse o corpo. Com as costas aplainadas de tanto
amiguismo, depois de fazer tantos wordjobs à clientela, já estava incapaz de
ouvir uma crítica, já só sabia despachar um rotineiro não-gostas-não-leias, e
deixava o stock de esperteza esvair-se no belo efeito, vendendo textos
coloridos como se fossem auroras boreais. Entrara pelo lado do círculo virtuoso, passara
para o círculo vicioso e agora aterrava no círculo belicoso: fora do vazio da polémica
só havia a polémica do vazio.
Foi então que conheceu frei
Esteves. E Frei Esteves fez-lhe ver a luz. Mostrou-lhe a estrela das origens,
deu-lhe um bloco de rascunhos, um papel e um novo testamento. Disse-lhe que só devia
ler aquilo que lhe envergonhasse dizer que lia, disse-lhe que só podia comentar
aquilo a que ninguém ligava, só podia elogiar aqueles que todos desconheciam,
tinha de passar despercebida, tinha de se limpar das teias do reconhecimento.
Escrever num jornal de paróquia, fazer letras para canções de missa, bordar
orações em aventais para vender em quermesses de Natal.
Poderia continuar no Cabaret da
Tuita, sim, mas agora mudaria o nome-de-guerra para @herd_broken , tinha de
cortar as amarras com o rebanho, doravante iria tuitar apenas ao serviço do bem,
virada para o seu interior, para as discretas forças do sublime, e nem
o luto de Celine Dion a poderia desviar. Como prémio de consolação manteria a
franja, pois mesmo no reino da simplicidade o estilo não deve morrer