Será sempre um dilema nunca resolvido pelo homem. A lógica
aparentemente teria rebentado com as dúvidas, mas a vida e os seus apêndices mais
ou menos científicos vieram corromper essa segurança de primeira instância na
relação entre o todo e as partes.
A realidade é fértil de exemplos prosaicos: uma pessoa pode sentir-se
satisfeita consigo própria de forma global mas depois não encontrar nenhuma
parte que se aproveite, mas esta ocorrência, repare-se, não impede também a
simétrica, ou seja, alguém sentir-se razoavelmente contente/descontente em
várias parcelas do seu ser mas, no conjunto, achar-se o mais pequeno grão de
areia/ última coca-cola do deserto.
Olhemos agora para um contexto argumentativo. Alguém pode
estar placidamente concordante com um conjunto de argumentos enquanto colocados
isoladamente, mas depois o conjunto ser-lhe um absurdo gritante (as falácias
funcionam muito nesta base). No entanto, achar arrepiante cada um dos argumentos
isolados e depois apaixonar-se pelo conjunto também é bastante vulgar. Este
exemplo é um clássico da retórica e … da beleza.
Aliás, convenhamos, beleza e discurso são realidades muito
semelhantes. É impossível ficar indiferente a uma beleza argumentativa e,
arrisco, ela provoca geralmente, tal como a beleza física, reacções nos dois
extremos: ou nos apaixonamos ou nos irritamos de morte com tanta argumentação
ou com tanta beleza.
Em geral, e vamos ao que interessa, a pessoa normal não sabe
argumentar. Foge com frequência para o conforto dos seus preconceitos,
aninha-se nas miudezas curriculares de belo efeito e, não raro, escarafuncha
nas partes perdendo completamente a noção do conjunto, ou ataca o conjunto
esquecendo-se autisticamente das partes que o definem. Argumentar é para a
psique humana quase sempre sinónimo de mero auto-consolo, uma espécie de
wonderbra da consciência tranquila.
Cada vez acredito mais na marretada na cabeça como fonte de
conhecimento.