(...) Quando Cláudia
descobriu que os homens não lhe inspiravam as químicas para as quais a natureza
supostamente a deveria ter programado assumiu que teria de viver como uma
rocha. Ser mulher-rocha implica muita atitude por parte duma mulher,
designadamente expor-se a bivalves de ocasião que por vezes não sabem decifrar
a frigidez como um estado precário e a interpretam como uma táctica sofisticada
de engate. Foi deste jogo de desenganos que se alimentou a vida adulta de
Cláudia, uma verdadeira sucessão de enjoos que eram lidos como insidiosas e
ambulantes perversões. Não fora Raul Picoito ter detectado as suas
potencialidades para o exercício da espionagem criativa e Cláudia hoje faria de
ilustração para manuais de psiquiatria sexofílica. A primeira missão que lhe
foi confiada destinou-se a colocar um chip na braguilha de Suleiman Bashar, um
quadro superior do BCE que era responsável pelas politicas de harmonização
fiscal na tributação do silicone mamário. O sucesso foi tal que Portugal se
tornou o paraíso mundial do enlargement
tit graças a uma inesperada e inovadora isenção total de impostos atribuída
a uma profissão de desgaste lento conhecida como os calibradores-de-mama. Tudo
parecia correr bem a Cláudia quando, nada o fazendo prever, apareceu morta no
parque de estacionamento da clínica 'Conchas de Anjo' em Alverca. A investigação
criminal que se iniciou acabou por revelar que Cláudia era traficante dum bug
informático conhecido como volfranete,
(designação inspirada no famoso volfrâmio que alimentou espiões e guerras
secretas em Portugal durante a 2ª guerra) que era introduzido nos sistemas
através dos ecrãs tácteis. Cláudia tinha conhecido o inventor duma substância
que, misturada no verniz das unhas, ao entrar em contacto com os ecrãs deixava
os sistemas operativos completamente reféns dos seus caprichos. A mistura entre
a frigidez e o toque de ecrã tornou-se explosiva e uma rival acabou por lhe enfiar
um ipad nas trombas durante uma escaramuça em Odivelas motivada por ciúmes:
Cláudia seduzia os homens com uma facilidade aterradora e sacava-lhes as
passwords num abrir e fechar de soutien. Com uma password e um volfranete ela até punha um powerpoint a
desembarcar nas coxas da Normandia. «És tão frígida como uma porta usb, mas
tiveste mais hdmis que barriga» dizia o bilhete que se encontrava no seu casaco
quando faleceu.
excerto do primeiro capítulo
de Lula Frígida , romance escrito pelo Inspector Álvaro Simões, e publicado
pela editora Mosca Morta.